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BIOSSEGURANÇA
Desacordo sobre regras para exportação de transgênicos não foi sanado no governo; reunião vai até dia 17
Brasil dividido abre hoje encontro da ONU
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil, anfitrião do 3º Encontro das Partes (MOP-3) do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, continua dividido sobre
que posição assumir durante o
evento das Nações Unidas, que
começa hoje em Curitiba. O país
ainda não sanou sua crise de identidade: é ao mesmo tempo dono
de grande biodiversidade (e, portanto, favorável a regras mais rígidas sobre o comércio de alimentos transgênicos) e grande exportador de grãos (o que o torna interessado, ao menos teoricamente,
em menos burocracia nessa área).
Até o fechamento desta edição,
o governo brasileiro ainda não
havia chegado a um consenso sobre qual posição defender durante o encontro, que vai até o dia 17.
O pomo da discórdia está no artigo 18 do protocolo, que entrou em
vigor em 2003. Hoje, o texto estabelece que os países exportadores
de alimentos devem informar os
importadores caso seus carregamentos "possam conter" organismos geneticamente modificados.
Contêm?
A dúvida é se tal informação deve ser mudada para "contêm",
num grau de certeza que exija o
teste detalhado de cada carregamento. O Ministério do Meio
Ambiente defende a expressão
"contêm", enquanto o da Agricultura é favorável ao simples "podem conter". Os que preferem a
posição mais liberal dizem que a
necessidade de testes exaustivos
aumentaria os custos de produção no Brasil (em especial os da
soja, principal lavoura de exportação do país hoje e com tendência a ser dominada pelos cultivares transgênicos).
Já os países com grande biodiversidade, ao lado dos quais normalmente se coloca o Brasil, dizem preferir a versão mais estrita
da classificação, como forma de
controlar possíveis riscos de troca
de material genético entre os organismos modificados e as espécies nativas de cada país.
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva deve arbitrar a divisão de
opiniões dentro do governo brasileiro, mas, às vésperas do início
do encontro, ainda não havia se
manifestado. "Ainda não fomos
informados sobre a posição do
presidente", disse à Folha João
Paulo Capobianco, secretário de
Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente. "Infelizmente, não se chegou a um entendimento em torno de uma
proposta intermediária."
Para Capobianco, o fato de o
Brasil ser o único grande exportador de grãos que aderiu ao protocolo o coloca numa posição especial nas negociações. "Além do
mais, o que for decidido também
terá implicações para as não-partes [os países que não assinaram o
acordo]. Por isso há tanta pressão
sobre o Brasil", afirma.
Já Gilman Viana, do Departamento de Comércio Exterior da
Confederação Nacional da Agricultura, compara o Protocolo de
Cartagena à sugestão do humorista José Vasconcellos de mudar toda a população do Sul do Brasil
para o Norte e vice-versa: "Não dá
vantagem nenhuma, mas faz um
movimento danado", brinca.
Segundo Viana, o país já comete
um equívoco ao subscrever o protocolo, e estará sendo submisso se
decidir pelo "contém". "O mundo
tem quatro grandes exportadores
de grãos: Brasil, EUA, Canadá e
Argentina. Só o Brasil faz parte do
Protocolo de Cartagena. Então,
nós vamos ser contidos enquanto
nossos concorrentes estarão livres", afirma Viana.
É provável que a divisão se
aprofunde durante a COP-8 (8ª
Conferência das Partes) da Convenção da Biodiversidade da
ONU, que acontece logo depois
da MOP-3 em Curitiba. Em pauta
estarão regras para o uso de recursos da biodiversidade (como
fármacos, por exemplo) que rendam benefícios para os países detentores desses recursos. Mais
uma vez, há divergências sobre
uma posição mais ou menos liberal.
(REINALDO JOSÉ LOPES)
Colaborou Claudio Angelo,
editor de Ciência
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