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Estudo revela repelente de camundongo
Proteína presente em secreções de predadores do bicho, isolada por pesquisador da Unicamp e americanos, é inodora
Molécula identificada em
gatos e ratos, que comem o
roedor menor, é parecida
com sinalizador químico
que a presa também usa
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Pode ser o primeiro passo para a aposentadoria das ratoeiras e do chumbinho: substâncias cujo odor é capaz de encher
de medo os corações dos camundongos, identificadas por
um brasileiro da Unicamp e
dois colegas nos EUA.
Previsivelmente, os gatos
têm alguma coisa a ver com isso. Uma das proteínas isoladas
por Fabio Papes e seus companheiros americanos vem do organismo do felino, enquanto a
outra é de outro inimigo natural dos camundongos: o rato.
"Sim, os ratos são predadores
dos camundongos", esclarece
Papes, 34. Não confunda as espécies: os ratos, bem maiores e
mais agressivos, às vezes são
chamados de "ratazanas" no
Brasil. Farejar o xixi do roedor
maior é suficiente para fazer os
camundongos tremerem.
Foi da urina dos ratos, aliás,
que veio a "proteína do medo"
(no caso dos gatos, ela foi isolada da saliva). A descoberta é a
capa da última edição do periódico científico "Cell", um dos
mais importantes no mundo.
Além das possíveis implicações práticas -a criação do tal
repelente de roedor, por exemplo-, o estudo revela uma forma intrigante de "espionagem"
química da presa contra o predador. Ela tira partido de um
sistema que parecia estar restrito à comunicação dentro da
sua espécie algoz.
Esse sistema envolve os chamados feromônios, mensageiros químicos captados por um
órgão especial nas narinas de
muitas espécies de animais.
(Segundo Papes, ainda não está
claro se a versão humana desse
órgão serve para alguma coisa.)
"É comum chamarmos os feromônios de odores, mas não é
possível entrar na cabeça do bicho e saber se ele percebe aquilo da mesma maneira que um
cheiro qualquer", explica o pesquisador da Unicamp.
O certo, de qualquer modo, é
que eles ajudam os animais a
saber quando uma fêmea está
pronta para a reprodução ou
quando um rival quer briga, entre outras coisas importantes.
Desligado
A hipótese dos pesquisadores
era que o órgão vomeronasal, o
captador de feromônios, também detectasse moléculas parecidas em predadores. De fato,
bichos geneticamente modificados para que o órgão não funcionasse perdiam o medo inato
dos predadores naturais.
Em um dos experimentos,
um rato anestesiado foi colocado perto do camundongo modificado, e ele chegou a se aconchegar no bicho maior para
dormir. ("É porque fazia frio",
disse Lisa Stowers, pesquisadora do Instituto Scripps e coautora do estudo na "Cell".)
Intrigados, os cientistas começaram a separar as moléculas da urina e saliva. Conforme
fracionavam as secreções, iam
testando-as nos bichos vivos e
também diretamente nas células nervosas do órgão vomeronasal. Em ambos os casos, chegaram a uma proteína semelhante ao feromônio produzido
pelos camundongos em situações de agressividade. A semelhança se deve à origem evolutiva comum dos três bichos.
"É claro que isso pode ter
aplicações tecnológicas. Trabalhar com proteínas talvez não
fosse o ideal, porque elas podem ser comidas, mas você pode desenvolver outras moléculas que tenham ação similar",
afirma o pesquisador.
Aliás, tal repelente não teria
nada em comum com o cheiro
de xixi de gato. "A proteína é totalmente inodora", diz ele.
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