São Paulo, sexta-feira, 15 de fevereiro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Reunião científica nos EUA pede maior defesa do ambiente global

MARCELO LEITE
ENVIADO ESPECIAL A BOSTON

No mesmo dia em que o presidente George W. Bush reiterou sua fé na tecnologia e no capital americanos para combater a mudança climática, o presidente da maior organização de cientistas dos Estados Unidos disse que é preciso mais: responsabilidade internacional.
O mau augúrio foi lançado em Boston, na abertura da Reunião Anual da AAAS (Associação Americana para o Avanço da Ciência, na abreviação em inglês), por Peter Raven, pesquisador do Jardim Botânico de Missouri. O título de seu discurso inaugural pareceu escolhido a dedo para contrapor-se à fala de Bush: "Ciência, Sustentabilidade e o Futuro Humano".
Mesmo sem falar do Protocolo de Kyoto, Raven colocou-se do lado dos que exigem maior envolvimento dos EUA em questões globais, como a mudança climática. Enquanto Bush diz que rejeita Kyoto porque seu cumprimento afetaria violentamente a economia nacional e tiraria empregos de milhões de americanos, o presidente da AAAS defende que seu país assuma a responsabilidade por controlar 25% da renda mundial e gerar 25% a 30% da poluição do planeta, embora tenha apenas 4,5% da população.
"É digno de nota que os Estados Unidos, a nação mais rica que já existiu na face da Terra, sejam o menor doador de ajuda internacional ao desenvolvimento, em termos per capita, entre os países desenvolvidos", afirmou Raven.
Referindo-se também ao terrorismo e não só a questões ambientais, disse mais adiante no discurso: "Se os Estados Unidos puderem tornar-se mais internacionais, se nós todos pudermos aprender para tomar as condições do mundo tal como elas realmente são (...), poderemos começar a pensar sobre os contornos do tipo de mundo que queremos construir para o futuro".

Crítica aos céticos
A referência às condições reais do mundo tinha endereço certo -os chamados "céticos" de desastres ambientais como a mudança climática global e a destruição da biodiversidade. Esses críticos das previsões muitas vezes catastróficas de ambientalistas têm sido úteis para adeptos da desregulamentação, como Bush. A mensagem desses cérebros de resultados é uma só: não se deve prejudicar a economia por causa de previsões ainda incertas.
O ideólogo da hora é Bjorn Lomborg, que lançou no ano passado um livro provocador, "O Ambientalista Cético". Raven se refere a ele e seus companheiros de jornada como "falsos profetas e charlatães", além de "pseudocientistas".
Leia: "É desagradável, mas não surpreendente, que se levantem falsos profetas e charlatães para, negligenciando o contexto científico que deve embasar todas as decisões sábias, pretender anunciar "boas novas" sobre o ambiente -eles basicamente fazem fama dizendo às pessoas aquilo que elas querem ouvir".
A reunião da AAAS, que prossegue até terça-feira, é o mais popular evento de ciência do país. São esperados 5.000 participantes e mais de mil jornalistas para seis dias de conferências e simpósios com as estrelas do país que mais produz pesquisa no mundo. O tema geral do congresso é "Ciência num Mundo Interconectado". Os grandes destaques da conferência este ano são as palestras nas áreas de genômica e nanotecnologia, as duas únicas a ter dois dias agendados na programação.



Texto Anterior: Democratas, especialistas e ONGs rejeitam proposta de presidente
Próximo Texto: Panorâmica - Política científica: Brasileiros e alemães iniciam cooperação
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.