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Ciência em Dia
Os 21 de Alcântara
Marcelo Leite
editor de Ciência
O Brasil é um país esquisito, cuja história oficial cultua legiões de heróis
duvidosos e costuma negligenciar a memória de outros mais merecedores do
qualificativo. Uma das razões para essa
distorção é o descaso com fatos do presente e do passado recente, como está
ocorrendo na investigação da morte de
21 técnicos civis no acidente com o foguete VLS-1, incendiado em 22 de agosto
de 2003 em Alcântara, no Maranhão.
Nesses quase cinco meses, houve nada
menos do que cinco prorrogações de
prazo para a conclusão dos trabalhos de
investigação de uma comissão controlada pela Aeronáutica. O último a ser
anunciado, 15 de fevereiro, ninguém sabe se será de fato cumprido. Afinal, ninguém deu mesmo muita importância
aos adiamentos anteriores.
Nenhuma sessão pública da comissão
de investigação foi realizada, apesar das
promessas iniciais de transparência. Os
pesquisadores indicados por sociedades
científicas, num aparente esforço para
"desmilitarizar" a investigação, ainda
não mostraram a que vieram. Cabe repetir seus nomes para refrescar a memória
de pares porventura incomodados com
tanto segredo e razões de Estado: Carlos
Henrique de Brito Cruz, da Unicamp,
Fernando Cosme Rizzo Assunção, da
PUC-RJ, e Paulo Murilo Castro de Oliveira, da UFRJ.
A página de internet da Aeronáutica
dedicada ao VLS (www.fab.mil.br/vls),
por exemplo, até a quarta-feira aparecia
em branco. Nem mesmo o link para um
"livro de condolências" estava ativo. Sobre o foguete acidentado no Maranhão, a
página inicial da Agência Espacial Brasileira (www.aeb.gov.br) na Web traz somente um link para "mensagens de
apoio". Sobre o acidente, zero. Nada.
Nem no texto sobre foguetes lançadores
de satélites (www.aeb.gov.br/foglancadores.htm), que só menciona os lançamentos de 1997 e 1999, sem mencionar 2
de 3 fracassos. O sítio indicado pela AEB
para o Centro de Lançamento de Alcântara (www.cla.aer.mil.br) também se
encontrava fora do ar.
Frustração semelhante abateria o internauta que buscasse informação sobre
o acidente ou sua investigação na página
do Instituto de Aeronáutica e Espaço
(www.iae.cta.br), responsável pela construção do Veículo Lançador de Satélites.
Só para comparação, cabe dizer que
continuará no ar, até o próximo dia 1º, sítio da junta de investigação do acidente
com o ônibus espacial Columbia (www.caib.us), que matou setes astronautas
em 1º de fevereiro de 2003. Qualquer um
pode baixar o relatório final divulgado
em 28 de outubro, nove meses depois da
tragédia, em que foi indicada uma série
de falhas da Nasa. Houve inúmeras sessões públicas e relatórios parciais. O nome dos sete mortos está agora em solo
marciano, em placa afixada ao jipe Spirit.
Para que não caiam no esquecimento,
repetem-se aqui os nomes dos 21 mortos
em Alcântara: Amintas Rocha Brito, Antonio Sérgio Cezarini, Carlos Alberto Pedrini, César Augusto Costalonga Varejão, Daniel Faria Gonçalves, Eliseu Reinaldo Moraes Vieira, Gil César Baptista
Marques, Gines Ananias Garcia, Jonas
Barbosa Filho, José Aparecido Pinheiro,
José Eduardo de Almeida, José Eduardo
Pereira, José Pedro Claro Peres da Silva,
Luís Primon de Araújo, Mário César de
Freitas Levy, Massanobu Shimabukuro,
Maurício Biella de Souza Valle, Roberto
Tadashi Seguchi, Rodolfo Donizetti de
Oliveira, Sidney Aparecido de Moraes e
Walter Pereira Júnior.
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
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