São Paulo, domingo, 18 de janeiro de 2004

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Ciência em Dia

Os 21 de Alcântara

Marcelo Leite
editor de Ciência

O Brasil é um país esquisito, cuja história oficial cultua legiões de heróis duvidosos e costuma negligenciar a memória de outros mais merecedores do qualificativo. Uma das razões para essa distorção é o descaso com fatos do presente e do passado recente, como está ocorrendo na investigação da morte de 21 técnicos civis no acidente com o foguete VLS-1, incendiado em 22 de agosto de 2003 em Alcântara, no Maranhão.
Nesses quase cinco meses, houve nada menos do que cinco prorrogações de prazo para a conclusão dos trabalhos de investigação de uma comissão controlada pela Aeronáutica. O último a ser anunciado, 15 de fevereiro, ninguém sabe se será de fato cumprido. Afinal, ninguém deu mesmo muita importância aos adiamentos anteriores.
Nenhuma sessão pública da comissão de investigação foi realizada, apesar das promessas iniciais de transparência. Os pesquisadores indicados por sociedades científicas, num aparente esforço para "desmilitarizar" a investigação, ainda não mostraram a que vieram. Cabe repetir seus nomes para refrescar a memória de pares porventura incomodados com tanto segredo e razões de Estado: Carlos Henrique de Brito Cruz, da Unicamp, Fernando Cosme Rizzo Assunção, da PUC-RJ, e Paulo Murilo Castro de Oliveira, da UFRJ.
A página de internet da Aeronáutica dedicada ao VLS (www.fab.mil.br/vls), por exemplo, até a quarta-feira aparecia em branco. Nem mesmo o link para um "livro de condolências" estava ativo. Sobre o foguete acidentado no Maranhão, a página inicial da Agência Espacial Brasileira (www.aeb.gov.br) na Web traz somente um link para "mensagens de apoio". Sobre o acidente, zero. Nada. Nem no texto sobre foguetes lançadores de satélites (www.aeb.gov.br/foglancadores.htm), que só menciona os lançamentos de 1997 e 1999, sem mencionar 2 de 3 fracassos. O sítio indicado pela AEB para o Centro de Lançamento de Alcântara (www.cla.aer.mil.br) também se encontrava fora do ar.
Frustração semelhante abateria o internauta que buscasse informação sobre o acidente ou sua investigação na página do Instituto de Aeronáutica e Espaço (www.iae.cta.br), responsável pela construção do Veículo Lançador de Satélites.
Só para comparação, cabe dizer que continuará no ar, até o próximo dia 1º, sítio da junta de investigação do acidente com o ônibus espacial Columbia (www.caib.us), que matou setes astronautas em 1º de fevereiro de 2003. Qualquer um pode baixar o relatório final divulgado em 28 de outubro, nove meses depois da tragédia, em que foi indicada uma série de falhas da Nasa. Houve inúmeras sessões públicas e relatórios parciais. O nome dos sete mortos está agora em solo marciano, em placa afixada ao jipe Spirit.
Para que não caiam no esquecimento, repetem-se aqui os nomes dos 21 mortos em Alcântara: Amintas Rocha Brito, Antonio Sérgio Cezarini, Carlos Alberto Pedrini, César Augusto Costalonga Varejão, Daniel Faria Gonçalves, Eliseu Reinaldo Moraes Vieira, Gil César Baptista Marques, Gines Ananias Garcia, Jonas Barbosa Filho, José Aparecido Pinheiro, José Eduardo de Almeida, José Eduardo Pereira, José Pedro Claro Peres da Silva, Luís Primon de Araújo, Mário César de Freitas Levy, Massanobu Shimabukuro, Maurício Biella de Souza Valle, Roberto Tadashi Seguchi, Rodolfo Donizetti de Oliveira, Sidney Aparecido de Moraes e Walter Pereira Júnior.

E-mail: cienciaemdia@uol.com.br


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