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Mosquito da dengue ganha genoma
Grupo internacional decifra DNA do "Aedes aegypti", em feito que revela alvos possíveis contra a doença
Ao longo da evolução, vírus
e inseto aprenderam a
conviver de forma pacífica;
o primeiro deixou marcas
genéticas no segundo
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
Durante a próxima década, a
genética poderá dar uma contribuição importante para o
controle da dengue, doença que
atinge mais de 50 milhões de
pessoas no mundo. O DNA de
seu transmissor, o mosquito
Aedes aegypti, acaba de ser decifrado, em estudo publicado
na revista científica "Science".
"Os caminhos estão abertos.
Agora temos alguns alvos mais
bem definidos" disse à Folha o
médico Sergio Verjovski-Almeida, pesquisador do Instituto de Química da USP. Ele é um
dos autores do artigo, assinado
por dezenas de cientistas do
Brasil e de outros países.
A primeira pista genética
contra o Aedes está ligada à
descoberta da existência de
uma coleção de 64 proteínas
responsáveis pelos mecanismos de transporte celular.
Quando uma droga é aplicada
contra o mosquito, as proteínas
transportadoras salvam o inseto. Elas promovem uma espécie de desintoxicação das células, ao carregarem o veneno para fora delas.
"Entender como isso funciona é importante, por exemplo,
para o desenvolvimento de um
inseticida específico. Poderão
ser feitas drogas eficientes e
que não sejam eliminadas das
células" imagina Verjowski.
O segundo caminho apontado pelo estudo surge a partir de
todo o conjunto de 15.419 genes descoberto agora. Extensão, inclusive, que surpreendeu
bastante os pesquisadores.
"Esse genoma é cinco vezes
maior que o do Anopheles gambiae [inseto que transmite a
malária]", compara o cientista.
Segundo Verjowski, os responsáveis por esse inchaço genômico são os chamados transpósons (segmentos repetitivos
de DNA que ficam saltando entre os genes).
"Esses elementos nada mais
são do que um tipo de vírus. Ou
seja, durante a evolução, a fisiologia do mosquito se adaptou aos diferentes tipos de vírus, que acabaram se acumulando nesse genoma", explica.
Irmãos em armas
Para Verjowski, o genoma revela que o mosquito e o vírus
aprenderam a conviver um
com outro ao longo do tempo.
"Essa é possivelmente uma das
razões para explicar por que os
dois vírus, o da dengue e o da febre amarela [também transmitido pelo A. aegypti], infectem o
mosquito sem matá-lo e sem
serem destruídos". Outro processo que, se bem compreendido, poderá ser útil ao homem.
O mesmo vale para a grande
quantidade de proteínas relacionadas ao sistema olfativo do
mosquito que foram encontradas pelos pesquisadores a partir do seqüenciamento. "Tudo
que estiver envolvido com o
mosquito e a sua relação com o
ambiente é importante".
A montagem do genoma do
mosquito da dengue demorou
mais do que a do da malária,
pela grande presença dos elementos repetitivos. "Vimos
que 45% de todo o genoma é
formado pelo transpósons."
Não é de hoje que Verjovski
olha para o chamado "DNA-lixo", as partes do genoma que
não contêm nenhum significado aparente, em busca de pistas
sobre o funcionamento do organismo. "Se o organismo
mantém isso é porque existe
alguma função. Não é lixo",
afirma o cientista.
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