São Paulo, terça-feira, 18 de setembro de 2007

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Brasil lança satélite e mira dominar sensoriamento

Inpe planeja estações para fornecer dados do CBERS a países em desenvolvimento

Terceira nave do programa conjunto com a China parte nesta noite; missão é vital para o monitoramento do desmatamento amazônico

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA

Ao mesmo tempo em que prepara para esta noite o lançamento do CBERS-2B, terceiro satélite do programa sino-brasileiro de observação da Terra, o Brasil já planeja uma espécie de ofensiva geopolítica espacial: quer montar seis estações ao redor do mundo para que países da África, do Sudeste Asiático e da América Latina possam receber, de graça, imagens geradas pela nave.
O plano, que já recebeu a chancela do Itamaraty, inclui quatro estações de recepção de dados de satélite para a África, uma na Indonésia ou na Austrália e uma em Roraima, segundo o diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Gilberto Câmara. Hoje só existem quatro estações aptas a receber e processar imagens do CBERS: três na China e uma no Brasil, em Cuiabá.
O custo total da manutenção das novas estações é calculado em R$ 10 milhões por ano -metade do que o país gastou com a viagem do astronauta Marcos Cesar Pontes para a Estação Espacial Internacional, em 2006. Ainda não se sabe de onde sairá o dinheiro.
O retorno esperado é que a tecnologia nacional de sensoriamento remoto se dissemine por esses países, e que empresas brasileiras do setor possam ganhar "maior inserção", nas palavras do coordenador do Programa de Aplicações do CBERS, José Carlos Epiphanio. Também está na mira do Inpe a montagem de um centro internacional de monitoramento de florestas tropicais. Ele utilizaria essas estações como nós de uma rede de observação, e "exportaria" metodologias brasileiras como o Prodes e o Deter, usadas para cálculo e acompanhamento do desmatamento da Amazônia, a outros países com florestas. Aqui, o interesse é político, não econômico.

Da China, na hora H
O CBERS-2B deve decolar à 0h26 desta quarta-feira (hora de Brasília) da base de Taiyuan, ao sul de Pequim, a bordo de um foguete Longa Marcha 4B, de três estágios. O satélite é uma cópia melhorada de seu antecessor, o CBERS-2, e dará ao programa brasileiro de observação da Terra um respiro mais do que necessário.
Isso porque os dois outros satélites da série CBERS (Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres) já estão um morto e o outro, "caolho": o CBERS-1 parou de funcionar em 2003 e o CBERS-2 perdeu suas duas câmeras auxiliares numa pane de bateria em 2005. Esse tipo de espaçonave geralmente tem uma "validade" de dois anos.
Como o Landsat-5, satélite norte-americano cujas imagens o Inpe também usa, pode deixar de funcionar a qualquer momento, o monitoramento do desmatamento na Amazônia está numa situação delicada. "Há uma grande expectativa pela continuidade dos dados do CBERS", disse Epiphanio.
Por outro lado, continuou o pesquisador, "se o CBERS-2B operar até o lançamento do CBERS-3, em 2009, e se o CBERS-2 permanecer vivo por mais um tempo, estaremos numa situação privilegiada".
O CBERS é feito para operar numa resolução considerada alta: cada um de seus pixels (menores pontos na imagem) tem 20 metros por 20 metros. Isso faz com que suas imagens e as do Landsat sejam ideais para o Prodes, programa que calcula a taxa anual de desmatamento.
A desvantagem desse olhar mais apurado é que o tempo que o satélite demora para sobrevoar uma mesma área duas vezes é longo: 26 dias. Isso impede o acompanhamento imediato do desmatamento, algo que precisa ser feito por um satélite mais "míope", o americano Modis (que, aliás, só deve durar até 2009).
Com dois satélites em operação, aumenta o tempo de aquisição de imagens e diminui o intervalo entre os sobrevôos.

Estratégia
O CBERS-2B também tem uma vantagem tecnológica em relação aos seus antecessores que permitirá que mais países utilizem suas imagens: ele leva a bordo um gravador mais potente que os dos outros. "Ele pode imagear outras partes do globo [além da China e do Brasil], como a Europa, e descarregar depois essas imagens nas estações de recepção chinesas ou na brasileira.
Como a política sino-brasileira é fornecer as imagens de graça -as de outros satélites do gênero são pagas-, mesmo quem não tem estações poderá receber dados do CBERS.
Segundo Epiphanio, já há interesse "firme" da Espanha, da Itália e da África do Sul de modificar estações de recepção de dados de satélite para poder "baixar" diretamente as imagens do CBERS. A espanhola cobriria o noroeste da África, e a italiana, o nordeste. A estação planejada em Roraima forneceria dados para a América Central e os países amazônicos.
Mas o CBERS-2B tem ainda outro "cliente" potencial: os EUA, cujo programa de observação da Terra anda em crise. "Eles estão com a corda no pescoço nessa questão do Landsat", diz Epiphanio.


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