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BIOLOGIA
Estudo da UFRJ constrói "mapa proteômico" do vibrião da doença, que pode elucidar o surgimento das epidemias
Proteínas ajudam país a desvendar cólera
MARCUS VINICIUS MARINHO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O Brasil acaba de dar um passo
importante no combate ao vibrião da cólera. Por meio da análise das proteínas existentes nessa
bactéria, cientistas da UFRJ dizem
ser possível aumentar o grau de
entendimento sobre o assunto e
entender, por exemplo, como e
por que surgem no mundo as epidemias da doença, que afeta cerca
de 150 mil pessoas por ano.
Um rascunho do proteoma
-espécie de "genoma" onde, em
vez de genes, as proteínas é que
são estudadas- da bactéria Vibrio cholerae, o agente da cólera,
foi feito pela equipe de Ana Maria
Abrantes Coelho, do Instituto de
Biologia da universidade fluminense. Sua equipe identificou 94
proteínas vitais para o organismo
-regulam os ciclos energéticos
da célula e o transporte de produtos para dentro da mesma, entre
outros.
Embora o vibrião tenha cerca de
3.800 proteínas no total, esse é o
maior estudo proteômico já feito
sobre o vibrião. A pesquisa foi relatada na reunião anual da Sociedade Brasileira de Bioquímica e
Biologia Molecular, que acabou
ontem em Caxambu (MG), e publicada na edição de maio da revista Proteomics (www.wiley-vch.de/publish/en/journals/
alphabeticIndex/2120/).
"A pesquisa das proteínas é vital
para entender como funciona o
organismo e como ele causa uma
doença no homem", diz Ana Maria Coelho, 54, à Folha. A biofísica
identificou as proteínas construindo um "mapa" bidimensional das proteínas do vibrião: ao
colocá-las em um gel e estimular a
passagem de corrente elétrica, ela
espalhou as proteínas na superfície segundo duas propriedades,
pH (grau de acidez) e tamanho,
facilitando a caracterização.
A linhagem da bactéria da cólera utilizada, chamada de "El Tor",
foi responsável pela última grande epidemia da doença, que assolou o mundo a partir da década de
60 e o Brasil entre 1991 e 1995.
Desde a última epidemia no
país, diz a pesquisadora, seu grupo tenta elucidar o funcionamento da doença -mais comumente
contraída através da ingestão de
água ou comida contaminada- e
o mecanismo de surgimento das
epidemias, que se espalham rapidamente. O "mapa proteômico"
seria uma das maneiras de fazê-lo.
"A epidemia parece surgir do
nada. Ninguém sabe exatamente
por que ela de repente aparece e se
espalha. Pra ser sincera, a gente
não sabe nem dizer como a epidemia acabou no Brasil em 1995.
Provavelmente o mar deixou de
ser propício para a bactéria naquele momento específico", diz.
Segundo a pesquisadora, o trabalho de identificação das proteínas foi simplificado, já que o genoma do Vibrio cholerae já havia
sido seqüenciado. "Ficou bem
mais fácil. A proteína já é jogada
direto no banco de dados. Em outros casos dá bem mais trabalho."
A solução dos problemas da cólera, no entanto, não é a única
aplicação do estudo do grupo da
biofísica sobre o vibrião. Segundo
a pesquisadora, pode haver interesse na área da biotecnologia.
"Essas bactérias produzem quitina, um biopolímero com ótimo
potencial para uso industrial",
diz. O conhecimento do funcionamento das proteínas, diz, pode
facilitar a manipulação comercial
desses microorganismos.
O projeto da equipe faz parte do
chamado Programa Proteoma do
Rio de Janeiro, que envolve seis
laboratórios de pesquisa em universidades fluminenses e é patrocinado pela Faperj (Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado do
Rio de Janeiro).
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