|
Texto Anterior | Índice
+ Marcelo Leite
Desmatamento em queda
Ritmo de destruição da Amazônia caiu quase à metade no governo Lula, que principiara com
um recorde tenebroso
|
Jornalistas não deveriam fazer
previsões, mas as fazem o tempo
todo. Raramente se dão ao trabalho de prestar contas quando erram.
Quando o fazem não é decerto com a
ênfase e o destaque conferidos às poucas previsões que acertam.
Pois bem: esta coluna errou há duas
semanas, sob o título "Desmatamento
à vista", ao predizer que a destruição
da floresta amazônica tendia a aumentar com o crescimento da economia e do agronegócio neste ano.
Cinco dias depois de publicado o
texto, o Ministério do Meio Ambiente
(MMA) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgaram a
taxa confirmada de desmatamento no
período 2005-2006 e a estimativa para 2006-2007. Pelo terceiro ano seguido, a taxa caiu.
Essa diferença entre taxa confirmada e estimativa decorre do uso de dois
sistemas de monitoramento por satélite. Um é o Deter, criado para fornecer informação rápida, "em tempo
real", para o Ibama e outros órgãos fiscalizarem e autuarem desmates ilegais logo depois de ocorridos.
Usam imagens orbitais de menor resolução
espacial (menos nítidas) e maior resolução temporal (mais freqüentes).
De início, MMA e Inpe recusavam
usar o Deter para estimar taxas de
desmatamento, preferindo ater-se ao
outro sistema, o Prodes. Com menos
imagens e mais detalhes, este programa fornece desde 1988 as cifras oficiais do desmatamento da Amazônia
brasileira. Mais trabalhoso, implica alguma defasagem na divulgação dos resultados (que saem meses depois de
encerrado o período de derrubada).
A resistência logo desapareceu,
quando o desmatamento começou a
cair e o Deter permitiu dar a notícia
mais cedo. Desde então, o governo federal passou a divulgar em agosto um
par de informações: a taxa confirmada
do período anterior (agosto a julho),
segundo o Prodes, e a estimativa para
o ano corrente, gerada pelo Deter.
De agosto de 2005 a julho de 2006, a
taxa de desmatamento ficou em
14.039 km2, 25% a menos que os
18.793 km2 verificados nos 12 meses
anteriores. Em 2003/2004, havia sido
de 27.429 km2, a segunda maior da
história, atrás só do recorde de 29.059
km2 de 1994/1995 -sempre segundo o
sistema Prodes.
Noves fora, a taxa de desmatamento
caiu quase à metade no governo Lula,
que principiara com um recorde tenebroso. Agora, com a estimativa do Deter de meros 9.600 km2 em 2006/
2007, a tendência de queda caminha
para uma confirmação robusta. É certo que há margem de erro de 10% e
que essa cifra animadora só será confirmada pelo Prodes daqui a um ano.
Mesmo assim, é excelente notícia.
A novidade é boa, acima de tudo, para a gestão de Marina Silva no MMA.
Mostra que suas iniciativas estão dando fruto, ao menos na Amazônia, independentemente da perversa dinâmica socioeconômica que ali em geral
se observa. Em outras palavras: com a
pecuária, a silvicultura (madeira, quase sempre ilegalmente extraída) e a
soja em alta ou em baixa, o desmatamento continua caindo.
Isso significa que as medidas do
MMA -da criação de unidades de
conservação às ações contra corrupção no Ibama e à efetivação do Serviço
Florestal Brasileiro- parecem estar
dando certo. Otimismo demais, no entanto, pode matar o cidadão (assim
como a esperteza).
O agronegócio continua a crescer e
a se expandir. Os grileiros, madeireiros ilegais e corruptos tampouco sumiram da face da terra amazônica.
Não é o caso de relaxar.
MARCELO LEITE é autor de "Promessas do Genoma" (Editora da Unesp, 2007) e de "Clones Demais" e "O Resgate das Cobaias", da série de ficção infanto-juvenil Ciência em
Dia (Editora Ática, 2007). Blog: Ciência em Dia (www.cienciaemdia.zip.net). E-mail: cienciaemdia@uol.com.br
Texto Anterior: + Marcelo Gleiser: Enxergando mentiras Índice
|