São Paulo, domingo, 20 de janeiro de 2008

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Brasil quer virar líder em enterro de gás carbônico

Técnica que injeta CO2 em excesso no subsolo pode frear mudança do clima

Petrobras inicia neste ano testes na Bahia e na bacia de Campos; processo é eficiente em seqüestrar gás, mas custo é um problema

EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

É quase como jogar sujeira para debaixo do tapete. Como o Brasil tem lugar de sobra em seu subsolo para enterrar gás carbônico -2 trilhões de toneladas, segundo uma estimativa-, por que não dar uma mão para amenizar o aquecimento global? Neste ano, a Petrobras começa a seqüestrar carbono e depositá-lo em áreas já usadas para a extração de petróleo.
Há duas décadas, pelo menos, as empresas de petróleo injetam gás carbônico (CO2) em alguns de seus poços porque isso ajuda a retirar o restinho de combustível do subsolo.
Como o CO2 produzido pela queima desse mesmo petróleo virou um problemão ambiental, a prática ganhou uma nova função. Segundo o IPCC, o painel do clima das Nações Unidas, será preciso sumir com 25 bilhões de toneladas de CO2 por ano até 2050. E o enterro de carbono pode ajudar: segundo o IPCC, a tecnologia tem o potencial de eliminar pelo menos 21% disso nesse período.
O plano das empresas de petróleo tem várias fases. O carbono que seria emitido para a atmosfera nas refinarias é capturado por uma chaminé. O gás então é injetado no subsolo, onde ele ficará guardado por milhões de anos -segundo os técnicos.
"O Brasil, sozinho, tem capacidade para estocar o equivalente ao que o planeta emite em 80 anos", afirma João Marcelo Ketzer, coordenador do Cepac (Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de Carbono) da PUC do Rio Grande do Sul. É dele a estimativa sobre a capacidade de armazenamento do país.
As áreas usadas para a extração de carvão mineral ou os aqüíferos salinos (cuja água é imprestável para o consumo) também podem servir como regiões de estoque. No mundo hoje, segundo Ketzer, existe potencial de estocar 1 trilhão de toneladas de CO2 em reservatórios de petróleo, 10 trilhões em aqüíferos e 40 bilhões em minas de carvão.
Porém, a logística da captura em uma refinaria ou em uma usina não é trivial. Uma das dúvidas é a segurança. O CO2 pode vazar no transporte, matando asfixiadas pessoas em volta. (Isso aconteceu em 1986, quando 1.700 camaronenses morreram após um depósito natural do gás vazar de um vulcão.) Ou, o menos provável, o vazamento do próprio reservatório -causando um problema ambiental.
"Qualquer processo pode ser feito de forma perigosa", afirma Robert Socolow, físico e especialista em técnicas de estocagem de carbono, da Universidade de Princeton (EUA).
"O custo da tecnologia é um dos problemas que ainda precisam ser resolvidos", diz Paulo Cunha, do Cenpes (Centro de Pesquisa da Petrobras). O transporte do carbono de uma refinaria no continente para o reservatório -muitas vezes no mar, a centenas ou milhares de quilômetros de distância- pode exigir a construção de dutos, como os usados para o transporte do gás natural.
No Brasil serão feitas, no segundo semestre, injeções em larga escala de carbono em terra, na Bahia, e sob o mar, na bacia de Campos. A Petrobras, afirma Cunha, espera chegar a 2014 com um armazenamento de CO2 da ordem de 10 milhões de toneladas por ano.
Se a meta for atingida, será um dos maiores projetos de seqüestro geológico do mundo. Hoje, em grande escala, existem apenas três.
O pioneiro funciona na Noruega, e é feito, sob o mar, pela petrolífera local Statoil. No Canadá, em Weyburn, na terra firme, é feito o estoque de carbono capturado nos EUA pela canadense EnCana. O último fica na Argélia e está associado com o gás natural. Cada um seqüestra até 2 milhões de toneladas de CO2 por ano.


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