São Paulo, quarta-feira, 20 de março de 2002

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ARQUEOLOGIA

Equipe britânico-peruana acredita ter encontrado o último refúgio daquele povo após a conquista espanhola

Expedição descobre cidade inca perdida

Associated Press/National Geographic
Arqueólogo observa torre funerária no alto da montanha onde estão as ruínas recém-descobertas


DA REDAÇÃO

Uma equipe de exploradores peruanos e britânicos anunciou anteontem a descoberta de ruínas daquele que pode ter sido o último refúgio dos incas após a conquista espanhola, em 1532.
No alto de uma montanha na região de Vilcabamba, sudeste do país, eles encontraram um complexo de edifícios, muros, andenes (terraços usados para cultivo) e túmulos, nos quais havia diversos artefatos incaicos.
Os pesquisadores, liderados pelo fotógrafo britânico Peter Frost e pelo arqueólogo peruano Alfredo Valencia, da Universidade San Antonio Abad, em Cuzco, acreditam estar diante da cidade que teria sido o palco da resistência inca à conquista, que durou 36 anos.
Se a hipótese for confirmada, o achado será a ruína incaica mais importante já descoberta desde 1911, quando o americano Hiram Bingham encontrou a cidadela perdida de Machu Picchu. Mas alguns arqueólogos têm dúvidas quanto ao fato.
"Há várias cidades incas na região e nenhuma delas até agora mostrou ser o último baluarte dos incas", disse à Folha o arqueólogo americano Richard Burger.
Burger fala com conhecimento de causa. Especialista em arqueologia inca, ele é curador de antropologia do Museu Peabody, da Universidade Yale, à qual Hiram Bingham pertencia.
"Ainda não examinei as evidências [do novo achado", mas não há razão para afirmar com segurança que se trata de um refúgio, tampouco para descartar a descoberta", afirmou.
A "nova" cidade inca está no alto de uma montanha conhecida como Cerro Victoria, na região de Vilcabamba, a 35 quilômetros de Machu Picchu. Ali, a cerca de 3.000 metros de altitude, o grupo de Frost localizou mais de cem edifícios circulares.
Apesar de não ser conhecido pelos arqueólogos, menos ainda pelos de fora do Peru, o local nunca esteve exatamente "perdido" para a população local. Ele tem até um nome em quíchua -Corihuayrachina (pronuncia-se "corirruáiratchina")- e quando a expedição chegou ao local, em junho do ano passado, encontrou famílias indígenas morando ali.

Vilcabamba, a velha
A região de Vilcabamba, encravada numa zona de transição entre os Andes e a Amazônia, é conhecida pela densidade de sítios incaicos e possivelmente guarda, de fato, os vestígios da mítica Vilcabamba, a última capital inca.
Foi para aquela região que um grupo de nobres do império, liderado por Manco Inca, fugiu em 1536 depois que Cuzco foi tomada pelas tropas de Francisco Pizarro. As ruínas de Vilcabamba, abandonadas depois que o grupo de Manco Inca foi derrotado pelos espanhóis em 1572, têm sido o santo graal da arqueologia peruana. Foi buscando-as que Bingham topou com Machu Picchu.
Há vários sítios sendo escavados na região -um deles batizado de Vilcabamba la Vieja- que podem revelar vestígios dos últimos nobres do império inca.
A descoberta de Frost e Valencia soma-se a essa rede de cidades perdidas. Mas pode ser importante pelo fato de terem sido descobertos, em Cerro Victoria, artefatos de cerâmica de dois períodos distintos: por volta do ano 1200, época da ascensão do império, e da sua fase final, no século 16.
"Se for verdade, isso sacode as teorias sobre a expansão dos incas, porque não se achava que eles estivessem na região havia tanto tempo", disse Frost à revista "National Geographic", que patrocinou as escavações.
Para o britânico, os incas teriam escolhido Cerro Victoria pela vista das montanhas (sagradas para as nações andinas) e pelas jazidas de prata da região.
Burger acha que uma montanha de 3.000 metros não seria um lugar muito provável para alguém se esconder numa guerra. "Os incas fugiram para regiões mais baixas, na selva, impenetráveis para os espanhóis", afirmou. "Todos os sítios achados até hoje com evidências de contato hispânico estão em áreas assim", afirmou.



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