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São Paulo, quinta-feira, 20 de março de 2003

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AMBIENTE

Floresta ressecada pelo fogo no passado se torna mais suscetível à queima; fumaça impede avaliação dos danos

Incêndio em Roraima pode superar 1998

Nonoto Souza/Folha da Boa Vista-14.mar.2003
Bombeiro trabalha no combate ao fogo em Roxinho, um dos piores focos em Roraima, que sofre os maiores incêndios desde 1998


DA AGÊNCIA FOLHA

A velocidade com que os focos de incêndio se alastram atualmente por Roraima é consequência direta das queimadas anteriores sofridas pela floresta, que deixaram material orgânico no solo qualificado como "gasolina pura" pelos pesquisadores.
"O resultado dos incêndios de 1998, que ocorreram nos mesmos lugares de agora e que mataram milhares de árvores, é um combustível poderoso para os atuais focos de fogo. É um ciclo vicioso que vai destruindo cada vez mais a floresta", disse Philip Martin Fearnside, pesquisador do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) e um dos responsáveis pelo relatório do impacto dos incêndios de 1998.
O problema é agravado pela falta de planejamento antecipado de aceiros -valas que atuam como barreiras para evitar que o fogo se alastre-, pela umidade do ar muito baixa -cerca de 35%- e pelo combate tardio aos focos.
Como agricultores usam a queima para o manejo do solo sem muita técnica de controle, o fogo pode atingir restos de árvores e outros produtos vegetais, fora da área que se pretendia queimar, deixados por grandes incêndios do passado, como em 1998 (ano em que a estação seca amazônica foi agravada por um El Niño, aquecimento incomum das águas do oceano Pacífico que causa chuvas no Sul e seca no Nordeste).
Segundo especialistas do Inpa, não há condições técnicas para fazer avaliação da proporção da devastação já causada pelas chamas, neste ano, devido à densa nuvem de fumaça que cobre a região dos incêndios. Mas a linha de fogo está além dos cerca de 400 quilômetros atingidos em 1998, quando cerca de 11 mil km2 foram destruídos, o que poderia representar prejuízos maiores agora do que há quatro anos.
"Por um motivo que ainda não sabemos qual é, a nuvem não se dissipa nem segue para a direção do vento. A única certeza que temos é que a frente de fogo chegou a regiões além das atingidas em 1998. Chegou, inclusive, à floresta densa da reserva ianomâmi, o que é muito preocupante", disse Reinaldo Imbrozio Barbosa, do Inpa-RR, outro responsável pelo relatório de 1998.
"O impacto do El Niño existe e contribui para a existência do fogo, mas não dá para culpar o fenômeno por tudo, como é a tendência. Há componentes humanos importantes, como o processo de ocupação de terra sem planejamento adequado, as queimadas desenfreadas e a falta de ações preventivas", afirmou Fearnside.
Mesmo chovendo em Roraima nos próximos dias, o que é esperado, a floresta ainda sofrerá por vários anos os efeitos do fogo.
Segundo Fearnside, "o prejuízo continua mesmo depois de o fogo ser debelado, com a continuidade da morte das árvores, sobretudo das maiores, que ficaram enfraquecidas. As clareiras abertas pelas chamas aumentam a quantidade de luz dentro das matas e mexem com todo o ciclo de vida das plantas". (JAIRO MARQUES)


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