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Gás-estufa altera pressão do ar, afirma estudo
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
George W. Bush pode até continuar negando, mas cada vez fica
mais claro que a ação humana está pondo o clima global de pernas
para o ar. Uma nova e preocupante peça nesse quebra-cabeças revela que até a pressão atmosférica
está sendo alterada pelos gases-estufa que a humanidade emite.
O alerta vem de dados climáticos e simulações de computador
referentes ao Atlântico Norte e à
Antártida. O padrão observado
por cientistas britânicos e canadenses em ambos revela que o
efeito do CO2 (gás carbônico) e de
outros gases ligados ao aumento
do efeito estufa não altera só a
temperatura, mas também a pressão da superfície do planeta.
O efeito dessa mudança vai
muito além de fazer um copo d'água mais ou menos difícil de evaporar (quanto maior a pressão do
ar, mais calor é necessário para isso). A pressão alterada influi pesadamente sobre o fluxo dos ventos
e os padrões da chuva.
"Esses dados dão ainda mais razão ao argumento de que os seres
humanos estão tendo um efeito
considerável no clima", disse à
Folha o físico britânico Nathan
Gillett, 27, da Universidade de
Victoria, no Canadá.
O trabalho de Gillett e seus colaboradores, que sai hoje na revista
"Nature" (www.nature.com),
também correlacionou as mudanças na pressão com o padrão
climático mutante do hemisfério
Norte. Para a equipe, mudanças
dramáticas como o aumento de
até 60% na chuva sobre a Escócia
durante o inverno, assim como
uma queda correspondente na
precipitação na Espanha, podem
ser atribuídas à alteração.
"Os dados empíricos que mostravam a mudança de pressão
eram conhecidos há bastante
tempo", afirma Paulo Artaxo, do
Instituto de Física da USP. "Faltava atribuir isso a uma causa -e
por isso esse trabalho é importante", diz o pesquisador. Gillett usou
dados de estações meteorológicas
recolhidos entre os anos de 1948 e
1998, assim como o auxílio de nada menos de quatro simulações
de computador.
A análise revelou uma diminuição da pressão no Ártico, na Antártida e no Pacífico Norte, enquanto o sul da Europa e o norte
da África sofriam a tendência
contrária. "Ainda não entendemos bem como os gases-estufa
causam isso", afirma Gillett.
"Esses gases influenciam mais
diretamente a temperatura da atmosfera, e imaginamos que isso,
por sua vez, se reflita na circulação dos ventos e na pressão", pondera o físico britânico. "A principal evidência ligando os gases-estufa às tendências que nós observamos é que um padrão semelhante se reproduz nos modelos
climáticos que incluem um aumento desses gases", afirma.
Carlos Nobre, do Inpe (Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais),
concorda: "Não tem jeito, é impossível mexer na temperatura e
não alterar a pressão ao mesmo
tempo. Explicar exatamente como isso acontece é que é difícil".
É por isso que as conclusões,
embora pareçam sólidas, ainda
precisam de confirmação, diz Artaxo. "Esses modelos sempre são
imperfeitos", afirma.
Seja como for, as alterações nessas variáveis parecem responder
pelo aumento da umidade no inverno do norte da Europa e da
América do Norte, enquanto o sul
do continente europeu fica cada
vez mais seco no inverno. "Ainda
é difícil saber o efeito disso na
América do Sul", diz Gillett.
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