UOL


São Paulo, quinta-feira, 20 de março de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Gás-estufa altera pressão do ar, afirma estudo

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

George W. Bush pode até continuar negando, mas cada vez fica mais claro que a ação humana está pondo o clima global de pernas para o ar. Uma nova e preocupante peça nesse quebra-cabeças revela que até a pressão atmosférica está sendo alterada pelos gases-estufa que a humanidade emite.
O alerta vem de dados climáticos e simulações de computador referentes ao Atlântico Norte e à Antártida. O padrão observado por cientistas britânicos e canadenses em ambos revela que o efeito do CO2 (gás carbônico) e de outros gases ligados ao aumento do efeito estufa não altera só a temperatura, mas também a pressão da superfície do planeta.
O efeito dessa mudança vai muito além de fazer um copo d'água mais ou menos difícil de evaporar (quanto maior a pressão do ar, mais calor é necessário para isso). A pressão alterada influi pesadamente sobre o fluxo dos ventos e os padrões da chuva.
"Esses dados dão ainda mais razão ao argumento de que os seres humanos estão tendo um efeito considerável no clima", disse à Folha o físico britânico Nathan Gillett, 27, da Universidade de Victoria, no Canadá.
O trabalho de Gillett e seus colaboradores, que sai hoje na revista "Nature" (www.nature.com), também correlacionou as mudanças na pressão com o padrão climático mutante do hemisfério Norte. Para a equipe, mudanças dramáticas como o aumento de até 60% na chuva sobre a Escócia durante o inverno, assim como uma queda correspondente na precipitação na Espanha, podem ser atribuídas à alteração.
"Os dados empíricos que mostravam a mudança de pressão eram conhecidos há bastante tempo", afirma Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP. "Faltava atribuir isso a uma causa -e por isso esse trabalho é importante", diz o pesquisador. Gillett usou dados de estações meteorológicas recolhidos entre os anos de 1948 e 1998, assim como o auxílio de nada menos de quatro simulações de computador.
A análise revelou uma diminuição da pressão no Ártico, na Antártida e no Pacífico Norte, enquanto o sul da Europa e o norte da África sofriam a tendência contrária. "Ainda não entendemos bem como os gases-estufa causam isso", afirma Gillett.
"Esses gases influenciam mais diretamente a temperatura da atmosfera, e imaginamos que isso, por sua vez, se reflita na circulação dos ventos e na pressão", pondera o físico britânico. "A principal evidência ligando os gases-estufa às tendências que nós observamos é que um padrão semelhante se reproduz nos modelos climáticos que incluem um aumento desses gases", afirma.
Carlos Nobre, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), concorda: "Não tem jeito, é impossível mexer na temperatura e não alterar a pressão ao mesmo tempo. Explicar exatamente como isso acontece é que é difícil".
É por isso que as conclusões, embora pareçam sólidas, ainda precisam de confirmação, diz Artaxo. "Esses modelos sempre são imperfeitos", afirma.
Seja como for, as alterações nessas variáveis parecem responder pelo aumento da umidade no inverno do norte da Europa e da América do Norte, enquanto o sul do continente europeu fica cada vez mais seco no inverno. "Ainda é difícil saber o efeito disso na América do Sul", diz Gillett.


Texto Anterior: Ambiente: Incêndio em Roraima pode superar 1998
Próximo Texto: Saúde: Grupo de Hong Kong acusa vírus por pneumonia fatal
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.