São Paulo, quinta-feira, 20 de maio de 2004

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BIOLOGIA

Pesquisas desvendam rejeição de pólen indesejado em vegetais com flor

Ciência revela seleção sexual em plantas

MARCUS VINICIUS MARINHO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Sua movimentação é, obviamente, limitada, bem como suas capacidades sensoriais. Sua reprodução depende essencialmente do vento e dos insetos. É bem verdade que as angiospermas -as plantas com flores- não têm muita oportunidade de escolher seus "parceiros sexuais". Mas elas têm, sim, um mecanismo para selecionar pólen de melhor qualidade. O processo é agora revelado em dois estudos.
A autoincompatibilidade (AI) é conhecida como a rejeição sexual do mundo das plantas. Nesse processo biológico, que existe em cerca de metade das angiospermas do mundo -grupo que, por sua vez, representa 90% das espécies vegetais-, a planta não aceita para reprodução o pólen com o qual ela compartilhe semelhanças genéticas. A AI seria, em outras palavras, um mecanismo antiincesto que assegura a diversificação dos genes do vegetal.
Quando a AI acontece, o pólen (que contém as células reprodutivas masculinas) considerado incompatível até chega ao pistilo da flor (parte do órgão feminino), mas tem o seu desenvolvimento interrompido por um sinal da planta. Muitas dúvidas ainda existem na comunidade científica sobre como esse sinal ocorre e quais os genes que a controlam.
"Sabemos relativamente pouco sobre tudo isso. Uma das coisas que sabemos é que há diversos mecanismos de AI no mundo das angiospermas", diz a inglesa Vernonica Franklin-Tong, da Universidade de Birmingham. O grupo da bióloga é responsável por um dos dois estudos publicados hoje na revista científica "Nature" (www.nature.com) sobre a caracterização de mecanismos de AI.
Nesse caso, a cientista revelou que o mecanismo bioquímico da autoincompatibilidade em flores de papoula é a apoptose -um tipo de autodestruição celular amplamente conhecido. "A planta reage ao pólen indesejado como se ele fosse um organismo causador de doenças", diz. "Com essa descoberta, creio que no futuro poderemos controlar esse fenômeno da AI e utilizá-lo com viés biotecnológico", diz Franklin-Tong, 43, que por si só é um exemplo de diversidade genética: apesar de inglesa, é filha de mãe holandesa e pai sino-jamaicano.
Muito mais próximo de poder controlar a AI e assim, segundo diz, aumentar a produtividade de milho e soja transgênicos está o grupo de Teh-Hui Kao, na Universidade da Pensilvânia. O pesquisador taiwanês, radicado nos EUA, descobriu um gene responsável pela autoincompatibilidade em três variedades de pólen de petúnia e diz poder "desligar" a propriedade ou reativá-la nas plantas que a tenham perdido.
Plantas como milho e soja já perderam bastante da capacidade de autoincompatibilidade e freqüentemente se polinizam, o que as torna menos produtivas. Para Kao, 53, a descoberta pode reverter a situação. "Mas há muito a fazer antes de estendermos essas descobertas para outras plantas."


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