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Célula-tronco "ética" simula doença neurológica mortal
Grupo nos EUA também usou essas células para testar drogas contra a moléstia
Pacientes portadores da
enfermidade, que em geral
morrem antes dos 30 anos,
tiveram células da pele
induzidas a virar neurônios
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
A promessa mais palpável
das células-tronco começa a
sair do papel. Pesquisadores
nos EUA conseguiram usar
versões reprogramadas dessas
células para simular, em laboratório, uma moléstia devastadora do sistema nervoso. De
quebra, usaram isso para testar
remédios contra ela.
O ponto crucial é que as células foram obtidas de crianças e
adolescentes com a doença. Por
isso, são geneticamente idênticas aos neurônios dos doentes e
permitem estudar o problema
com grande precisão.
Lorenz Studer e seus colegas
do Instituto Sloan-Kettering,
em Nova York, relatam os resultados em artigo na revista
científica "Nature" desta semana. A moléstia estudada é a disautonomia familiar, que atinge famílias de origem judaica.
Por causa de uma troca numa
"letra" química de DNA, os portadores sofrem degeneração
dos neurônios sensoriais (tendo problemas na percepção da
dor ou no paladar) e autônomos (que controlam a respiração e a digestão). Poucos chegam aos 30 anos de idade.
É muito difícil estudar a evolução da doença, conta Studer.
"As pessoas tentavam fazer isso
com camundongos, mas os bichos morriam cedo demais."
Contudo, a história seria outra se fosse possível enxergar a
progressão do sistema nervoso
dos próprios doentes. Entra a
cena a reprogramação celular.
Adicionando certos genes a
uma célula da pele, por exemplo, dá para fazer com que ela
"pense" ser uma célula-tronco
embrionária -capaz, portanto,
de assumir o papel de qualquer
tecido do corpo. Ela se transforma numa célula iPS, conhecida como célula-tronco "ética", porque não envolve destruição de embrião.
Usando outras substâncias, é
possível transformar essa célula em num neurônio (veja quadro). Tal neurônio terá a mesma carga genética do paciente
e, espera-se, vai se comportar
de forma muito parecida com
os neurônios naturais.
E é o que os dados obtidos indicam. O estudo verificou que
os neurônios assim produzidos
não conseguem assumir sua
função correta no sistema nervoso, o que explicaria os sintomas dos pacientes.
Stevens Rehen, biólogo da
UFRJ, aponta outro detalhe.
"Eles mostraram que os neurônios obtidos também têm dificuldade de migrar de um lugar para outro", conta. Isso impediria que as células assumissem sua posição correta.
Rehen também ressalta o fato de que os pesquisadores usaram as células para testar drogas contra a doença. Um exemplo é a cinetina, um hormônio
vegetal que se mostrou capaz
de impedir a produção da proteína doente codificada pelo gene alterado dos pacientes.
"Para testar medicamentos, a
resposta desse tipo de modelo
será bem melhor do que o que
vemos em camundongos nocauteados", diz Studer.
Alguns especialistas apontam até que esse será o principal e talvez o único uso biomédico das células-tronco no futuro próximo, porque ainda é
difícil controlar a especialização delas. Transplantá-las em
pessoas ainda envolve incertezas, como o risco de tumores.
"Creio que há certo grau de
verdade nessa visão", diz Studer. "Em doenças como o mal
de Alzheimer, na qual há danos
extensos em várias áreas do cérebro, esse tipo de transplante
seria mesmo inútil."
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