São Paulo, quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

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ONU quer fragmentar debate sobre clima

Acordo para corte de emissões precisa ser discutido em partes e com número menor de nações, diz chefe da convenção

"Não há como ter todos os países em todas as reuniões todas as vezes", afirmou Yvo de Boer, que reagiu a críticas sobre negociações

Gero Breloer/ Associated Press
Ativista monta boneco de neve em Berlim, ontem, antes de protesto por corte de emissão de CO2

LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

O chefe da convenção do clima da ONU, Yvo de Boer, admitiu ontem que as negociações sobre o tema terão de seguir "em partes", com um número restrito de países tomando decisões sobre determinados tópicos e submetendo-as depois aos demais para aprovação.
Passado um mês do fim da conferência sobre o clima em Copenhague, a UNFCCC parece carecer de rumo e confiança.
De Boer disse em transmissão pela internet desde Bonn (Alemanha) que o resultado do evento foi "frustrante" ao produzir uma mera declaração política em vez de um acordo com peso legal. Ele passou boa parte do tempo respondendo a repórteres que questionavam se a convenção era o melhor fórum para criar uma política global contra a mudança climática.
O fato de o documento final ter sido costurado a portas fechadas por China, Brasil, Índia, África do Sul e EUA disseminou desconfiança. De Boer afirmou que nas próximas etapas será preciso manter a transparência para que os demais não se sintam traídos.
Mas foi realista. "Este é o processo de negociação mais complicado do mundo, e não há como ter todos os países em todas as reuniões todas as vezes. É preciso quebrar o processo em partes", defendeu.
Segundo De Boer, porém, as negociações devem prosseguir nos mesmos dois trilhos que existiam antes da conferência na Dinamarca, o KP -para nações que assinaram o Protocolo de Kyoto para reduzir as emissões de gases-estufa- e o LCA, que soma um grupo mais amplo de países em desenvolvimento inicialmente fora do processo, além dos EUA.

"Acordão"
As avaliações sobre o que foi obtido em dezembro, um "acordão" que nem sequer foi adotado pela conferência das partes e no qual as metas para conter o problema foram deixadas em branco, diferem dos dois lados do Atlântico.
Enquanto a avaliação geral nos EUA (maior poluidor do planeta e o país desenvolvido que mais reluta em se comprometer com cortes) é a de que o documento é um avanço, na Europa ele é majoritariamente visto como retrocesso.
Ontem, a chanceler alemã, Angela Merkel, voltou a dizer que os resultados foram "frustrantes" e que "só compromissos legalmente vinculantes" levam ao progresso. "Mas tem de ser da parte de todos", espetou.
De Boer também deu a entender que o prazo de 31 de janeiro para que países coloquem suas metas no documento é frouxo. "Era o prazo que eu precisava para concluir meu relatório. Não significa que países sem um plano claro ainda não possam aderir depois."
No próximo domingo, representantes de países do "Basic" (Brasil, África do Sul, Índia e China), devem retomar num encontro em Nova Déli as negociações sobre se o grupo adotará posição conjunta.
A soma das dissonâncias em Copenhague com a fadiga produzida pelo evento também multiplicou as dúvidas sobre a adequação e o real poder da Convenção do Clima da ONU.
De Boer disse ser possível que outro fórum seja criado, mas afirmou que se trataria de algo contraproducente. "Nós recebemos inventários sobre o que os países emitem, temos um banco de dados, ajudamos os governos a planejarem...", listou. "Inventar outra coisa parece trabalhoso demais." Segundo ele, além disso, "nenhum [país] manifestou vontade de tirar o debate da ONU".

"Embrulho legal"
De Boer tratou de moderar a esperança de um acordo com peso legal para a próxima conferência, em dezembro, no México. Afirmou que os países devem chegar a propostas mais concretas, mas "darão a elas o embrulho legal que quiserem".
Para o chefe da convenção do clima, Copenhague criou um "instrumento político de acompanhamento das intenções" de cada governo e manteve o debate em curso (embora esteja agora fora do foco da mídia). Avançou também, a seu ver, ao delegar negociações aos chefes de Estado. "São os únicos que poderão fazer alguma coisa."


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