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Atrofia cósmica
Força que acelera a expansão do Universo é a mesma que enfraquece aglomerados de galáxias
DENNIS OVERBYE
DO "NEW YORK TIMES"
A mesma força misteriosa que acelera a
expansão do Universo também está
atrofiando o crescimento de objetos em seu interior, afirmam astrônomos.
Depois de ganhar volume rapidamente nos primeiros 10 bilhões de anos do tempo cósmico, os aglomerados galácticos
-enxames em forma de nuvem
que formam os maiores conglomerados de matéria no Universo, apresentaram crescimento lento, ou nulo, nos últimos cinco bilhões de anos, como se fossem adolescentes rebeldes que subitamente se recusaram a se alimentar.
"Esse resultado pode ser explicado como um caso de desenvolvimento interrompido
do Universo", disse Alexey Vikhlinin, chefe da equipe que
usou o telescópio espacial de
raios-X Chandra, da Nasa, para
pesar aglomerados galácticos
em regiões distantes. O grupo
divulgou os resultados na última terça-feira em dois estudos
aceitos para publicação na revista "Astrophysical Journal".
Essa atrofia, diz Vikhlinin,
representa "a assinatura inconfundível" de uma força antigravitacional que os astrônomos chamam de energia escura. Ela foi descoberta há dez
anos com a análise de supernovas, explosões de estrelas capazes de revelar a que distância
suas galáxias estão. Astrônomos mapearam, então, a expansão do Universo e constataram o inesperado. Ao invés de
frear devido à gravidade cósmica o ritmo de expansão do cosmo está aumentando, com as
galáxias se afastando umas das
outras aceleradamente.
Os resultados de Vikhlinin se
enquadram à observação de supernovas. Os aglomerados se
agrupam pela gravidade, de
acordo com a teoria cosmológica, começando como pequenas
rugas em meio ao caldo fervilhante deixado pelo Big Bang.
Aos longo dos milênios, atraem
o material circundante. A energia escura supostamente trabalha contra a gravidade e tenta
propelir de volta a matéria que
está sendo atraída a um ponto.
Engano acertado
Somados a observações anteriores, diz Vikhlinin, seus resultados reforçam -mas não confirmam- a suspeita de que a
energia escura é uma estranha
antigravidade conhecida como
constante cosmológica, postulada por Albert Einstein e posteriormente abandonada por
ele como "um engano", quase
um século atrás. Caso isso seja
verdade, o Universo está condenado a se esgarçar, um dia, e
todas as galáxias exceto as vizinhas mais próximas da Via Láctea sumirão de vista.
Outros astrônomos receberam o trabalho como uma nova
via de investigação quanto ao
que está acontecendo e o que
pode acontecer no cosmos.
"Até o momento, apenas uma
técnica, a das supernovas, havia
detectado a energia escura sem
incluir outras observações",
disse Michael Turner, da Universidade de Chicago.
O fato de que dois métodos
diferentes detectarem a energia escura é um triunfo para a
teoria geral da relatividade de
Einstein, que explica a gravidade. "Esse foi um teste no qual a
relatividade geral poderia ter
fracassado", disse William Forman, da Universidade Harvard.
Explicações sobre a energia
escura que envolvem modificações da gravidade einsteiniana
podem estar condenadas, como
resultado. Adam Riess, da Universidade Johns Hopkins, diz
que "se isso fosse uma caça à raposa, e a energia escura fosse a
raposa, creio que o resultado
representaria que mais uma rota de fuga está fechada."
Visão de raios-X
Os aglomerados galácticos,
que podem conter milhares de
galáxias individuais, são laboratórios perfeitos para o estudo
da gravidade e de sua inimiga, a
energia escura, em grande escala. Também são fáceis de encontrar. Estão repletos de gás
quente que emite raios-X.
Vikhlinin e seus colegas usaram o Chandra para observar
86 aglomerados galácticos. Um
primeiro grupo consistia de um
conjunto de 37 aglomerados a
cerca de cinco bilhões de anos-luz de distância, e o segundo de
49 outros a cerca de meio bilhão de anos-luz ou mais próximos. Suas massas, determinadas pela extensão das imagens
de raios-X e seus espectros, variavam do equivalente a 100 trilhões de vezes a massa do Sol
terrestre a quintilhões de sóis.
Comparando seus dados a
modelos de evolução cósmica,
Vikhlinin constatou que os
aglomerados mais maciços representam só 20% do número
que deveria existir, hoje, em
um Universo no qual não houvesse energia escura. Os aglomerados, diz, "continuam crescendo, mas muito devagar".
Einstein especulou que o espaço vazio estava imbuído de
uma energia antigravitacional,
a constante cosmológica, que
explicaria por que o Universo
se manteria estático em vez de
implodir em sua própria gravidade. Só depois é que o astrônomo Edwin Hubble descobriu
que o Universo não é estático, e
estava se expandindo.
A mecânica quântica moderna sugere que o espaço vazio
deve mesmo estar imbuído
dessa estranha energia, mas a
possibilidade de que a energia
escura seja na verdade a constante cosmológica de Einstein
gerou um caos filosófico.
De acordo com os cálculos, a
constante cosmológica deveria
ser 1.060 vezes maior do que os
astrônomos mediram; num
Universo assim, estrelas, planetas e pessoas não existiriam.
A única saída, argumentam alguns físicos e cosmólogos, seria
presumir que o nosso Universo
é apenas um de até 10.500 universos paralelos, nos quais as
leis da física incidentalmente
favorecem nossa existência.
Mas muitos outros estudiosos
discordam amargamente dessa
hipótese.
Os novos resultados sobre
aglomerados, combinados a
medições de supernovas, oferecem as mais precisas medidas
já feitas sobre a energia escura,
diz Vikhlinin. Sua força difere
em apenas 5% da prevista pela
constante cosmológica.
Mas ainda há espaço para outras teorias, e astrônomos se
preocupam com a possibilidade de que as medidas jamais sejam precisas o bastante para
provar ou negar a constante.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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