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Grupo vê ambientes escondidos na terra firme da Amazônia
Ferramenta computacional calcula tamanho de chavascais e das campinaranas, duas zonas com grande oferta de água
Novos ecossistemas têm fauna e flora próprias, diz cientista do Inpa; passo seguinte é aplicar método em todas as regiões do país
EDUARDO GERAQUE
DO ENVIADO ESPECIAL A MANAUS
Qualquer um que tenha caminhado no mato na Amazônia
já desconfiava que o ambiente
chamado de terra firme (aquele
que nunca é inundado) é muito
heterogêneo. Mas a revelação
feita por um modelo matemático desenvolvido no Brasil e
apresentado em uma conferência internacional sobre a Amazônia nesta semana faz emergir
o tamanho dessa diferença.
"Nós descobrimos a existência de quatro ambientes dentro
da chamada terra firme", afirma Antônio Nobre, do Inpa
(Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). A ferramenta, baseada "em muita física básica", segundo o ecólogo, permitiu calcular que 58,5% da
chamada terra firme é um baixio que tem acesso fácil à água
em todas as épocas do ano.
"São áreas de chavascais e de
transição", diz Nobre. "Não que
essas áreas tenham lâminas
d'água, mas elas são úmidas.
Quando você anda pelo chavascal ele faz "choc", "choc"..." Na
área de transição, também chamada de campinarana, há predomínio de areia e "o lençol
freático é bastante raso", afirma o pesquisador.
O novo modelo, que partiu do
conceito físico dos vasos comunicantes, analisou até agora
uma área de 18 mil quilômetros
quadrados ao redor do rio Negro, no Estado do Amazonas.
"A ferramenta está pronta para
ser usada em toda a Amazônia.
Esse será o próximo passo do
estudo", diz Nobre.
Hoje, estima-se que 17% da
Amazônia seja preenchida por
áreas inundáveis e 83% por
áreas de terra firme. Com os
novos dados, esse último grupo
ganha quatro subdivisões.
Dentro dos baixios, a modelagem feita no âmbito do LBA
(Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da
Amazônia) e do Geoma (Rede
Temática de Pesquisa em Modelagem Ambiental da Amazônia), que usou imagens feitas
pelo ônibus espacial Endeavour, identificou duas classes.
Os chavascais, que ocupam
uma área de 25,6% da terra firme, e uma área de transição
(ecótono), que representa
32,9% do total das áreas estudadas que não são inundáveis.
Na região onde o lençol freático é mais profundo e a água
nunca chega, há 11,1% de encostas e 30,4% de platôs.
Florestas diferentes
"A aplicação disso é muito
importante. Na verdade, estamos falando de lugares diferentes, assim como Nova York difere de Bancoc", diz Nobre. De
acordo com o pesquisador, o ciclo de carbono e dos demais nutrientes serão bem distintos em
cada novo ambiente. "Os tipos
de árvore e a fauna associada a
eles também vão mudar."
Com esse novo mapa de drenagem e topografia nas mãos,
os biólogos e ecólogos poderão
direcionar melhor suas expedições e até ajudar a conservar
muito mais a biodiversidade
amazônica, segundo Nobre.
"A vida é a grande responsável pela regulação do planeta
Terra. Por que os nossos vizinhos [no Sistema Solar] são
muito quentes ou frios?"
Mirando a lei
A ferramenta desenvolvida
por Nobre e outros pesquisadores pode também até fazer mudar a legislação ambiental.
"As áreas com água são áreas
de proteção permanente. Agora, nós mostramos que elas podem estar muito mais longe de
um corpo do água do que se
pensava antes. Talvez seja preciso ajustar a lei", disse Nobre,
que espera usar a ferramenta
em outras áreas do país.
Hoje, a legislação diz que a
mata ciliar -aquela que existe
nas margens dos cursos d'água- deve ser preservada por
algumas dezenas de metros da
margem. "Mas será que isso é
suficiente para preservar todo
o ecossistema aquático?"
-pergunta Nobre. Afinal, nem
sempre a lei é muito considerada. Um outro estudo apresentado em Manaus, por exemplo,
mostrou que uma área de mil
hectares em Roraima perdeu
80% de sua mata ciliar.
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