São Paulo, sexta-feira, 23 de março de 2001

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BIOTECNOLOGIA

Planta foi transformada com gene do Japão capaz de conferir resistência contra bactéria do cancro cítrico

Paraná desenvolve laranja transgênica

ISABEL GERHARDT
DA REPORTAGEM LOCAL

A pesquisa de combate ao cancro cítrico, uma das principais doenças que atacam os pomares de laranja no país, avançou com o anúncio feito ontem, no Paraná, da obtenção da primeira laranja transgênica nacional.
A laranja-pêra, principal variedade de laranja usada na produção de suco, foi transformada com um gene retirado de uma espécie de mosca-varejeira, a Sarcophaga peregrina. O gene contém a "receita" de uma pequena proteína, um peptídeo chamado sarcotoxina, com ação bactericida. A substância é especialmente eficiente contra a bactéria Xanthomonas citrii, agente causador do cancro cítrico.
Segundo Luiz Gonzaga Esteves Vieira, do Iapar (Instituto Agronômico do Paraná), um dos principais autores da pesquisa, um dos méritos do estudo foi a eficiência na transformação de plantas. "Conseguimos de 15% a 18%", disse Vieira à Folha por telefone. Normalmente esse tipo de experimento só é bem-sucedido em 0,1% a 1% dos casos.
O outro diferencial do trabalho do Iapar é o tipo de tecido de laranja utilizado para produzir a planta transgênica, que os cientistas chamam de maduro. Ou seja, já capaz de originar plantas aptas para a produção de frutos, por intermédio de enxertos.

Interação com o Japão
O gene da sarcotoxina foi cedido ao Iapar por meio de um acordo com o Instituto Nacional de Recursos Agrobiológicos do Japão. O gene está ligado a uma pequena sequência de DNA com o código de um peptídeo-sinal, encarregado de guiar a sarcotoxina para o espaço intercelular.
Antes de atacar a parede celular da planta, é nesse espaço entre as células que as bactérias ficam alojadas. Uma vez que a sarcotoxina esteja presente no local, a eficiência de combate às bactérias seria muito maior, crêem os cientistas.
O gene da sarcotoxina e o trecho do peptídeo-sinal estão sob a influência de uma outra sequência de DNA, chamada de promotor constitutivo. Isso significa que o gene será ativado em todos os tecidos da planta, inclusive nos frutos, que serão transformados em suco. Segundo Vieira, testes de laboratório com células de mamíferos não revelaram efeitos tóxicos .
"De qualquer forma, esse peptídeo é facilmente degradável pela ação de proteases (proteínas que destroem outras proteínas) presentes nas células", diz o cientista.
As plantas do Iapar já estão em casa de vegetação. A equipe de Vieira irá testá-las agora para saber o grau de resistência à bactéria do cancro cítrico. "Em seis meses deveremos ter essa resposta", diz.
O pesquisador afirma que todos os experimentos vêm sendo conduzidos dentro das normas de biossegurança estabelecidas pela CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança). Ou seja, eles seguem as normas legais sobre os efeitos da introdução do gene nas plantas e os relacionados com a segurança alimentar e ambiental, objeto de toda a polêmica sobre os transgênicos.
Quando indagado quanto à possibilidade de interação com o projeto genoma da Xanthomonas citrii, conduzido pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), Vieira afirma que os resultados conseguidos pelo grupo do Paraná poderão facilitar a aplicação prática dos dados obtidos em São Paulo.


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