São Paulo, segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

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Telescópio vê surgimento de estrela supermagnética

Sonda espacial que enxerga raios-X flagra transformação inédita na astronomia

Astro de campo magnético 100 bilhões de vezes mais forte que o do Sol nasce a partir de estrela "queimada" com rotação hiper-rápida

Gregg Dinderman/Sky & Telescope
Ilustração mostra como seria um magnetar observado de perto


DA REPORTAGEM LOCAL

Um grupo de astrônomos americanos anunciou na semana passada ter conseguido observar um fenômeno totalmente inesperado pela física. Enquanto monitoravam uma estrela de nêutrons -estrela "queimada", que explodiu após queimar todo seu combustível nuclear- cientistas a flagraram se transformando em um "magnetar", o tipo de objeto cósmico com o campo magnético mais forte que se conhece.
"Estamos vendo um tipo de estrela de nêutron literalmente se transformar em outro, bem na frente dos nossos olhos", diz o astrofísico Fotis Gavriil, do Centro Goddard da Nasa (agência espacial americana), de Greenbelt (EUA), em comunicado à imprensa. Gavriil e colegas relataram sua descoberta na última sexta-feira, em estudo no site revista "Science" (www.sciencexpress.org).
A estrela de nêutrons que o grupo do cientista estava observando com o RXTE (telescópio espacial Rossi, detector de raios X) era do tipo "pulsar", que gira extremamente rápido. A transformação era inesperada pelos cientistas porque pulsares e magnetares são tipos de estrelas de nêutrons com comportamentos bem diferentes.
Um pulsar tem esse nome porque emite pulsos de ondas de rádio. É como observar um farol giratório em uma ilha distante; cada vez que o feixe de luz passa por nossos olhos, vemos sua torre acender e apagar. Um pulsar, porém, tem uma taxa de giro muito mais rápida -dando dezenas ou centenas de voltas por segundo- e emite ondas de rádio em vez de luz.
Já um magnetar é uma estrela de nêutrons bem diferente, que não possui rotação tão rápida nem emite ondas de rádio no mesmo padrão observado pelos pulsares. Sua característica mais distinta é a abundante emissão de raios X e raios gama -tipos de radiação extremamente energética-, propelidos por um campo magnético incrivelmente forte. Enquanto uma estrela como o Sol tem um campo magnético de cerca de 0,001 tesla (unidade de medida para magnetismo), o campo de um magnetar possui algo da ordem de 1 bilhão de teslas.
A descoberta de Gavriil foi importante porque os cientistas não sabiam muito bem como um magnetar surge.
"Magnetares são, na verdade, objetos muito raros", explica a astrofísica Victoria Kaspi, da Universidade McGill, de Montreal (Canadá), que também participou do estudo. "A existência deles só ficou estabelecida nos últimos dez anos, e nós conhecemos apenas um punhado deles em toda a galáxia."
Enquanto o número de pulsares catalogados está na casa dos 1.800, o número de magnetares não passa de 12. Segundo Kaspi, a observação do RXTE que identificou uma fonte de raios X em um pulsar fornece o primeiro indício de que há uma relação estreita entre magnetares e pulsares.

Evolução estelar
"Essa fonte pode estar evoluindo para se tornar um magnetar, ou pode estar apenas exibindo propriedades similares às de um magnetar", diz a astrofísica. "Só que ainda não sabemos. Estamos muito ansiosos para descobrir."
A estrela de nêutrons na qual o RXTE detectou o estranho comportamento, a 20 mil anos luz da Terra, ainda não foi batizada. É identificada pelo código "PSR J1846" e fica no meio dos restos de uma supernova -explosão estelar- registrada com o código Kes 75. O que os cientistas acharam estranho é que seu campo magnético era baixo demais para que ela estivesse se transformando num magnetar.
Kaspi afirma que será importante a partir de agora acompanhar com zelo o comportamento desta e de outras estrelas de nêutrons para ter certeza se os magnetares nascem a partir dos pulsares ou se apenas apresentam comportamento hipermagnético de vez em quando. "O campo magnético de PSR J1846 pode ser muito mais forte do que apontou a medição, sugerindo que muitas estrelas de nêutrons jovens classificadas como pulsares possam ser magnetares disfarçados", diz.


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