São Paulo, sexta-feira, 25 de julho de 2003 |
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AMBIENTE Análise genética mostra que impacto da caça foi pelo menos 10 vezes maior do que mostram registros históricos Situação de baleias é crítica, revela DNA
CLAUDIO ANGELO EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA A caça comercial de baleias, iniciada no século 19 e só interrompida em 1986, causou um impacto muito maior sobre as populações do animal do que o imaginado. Um estudo publicado hoje mostra que, no caso de duas espécies do Atlântico Norte, havia de 6 a 20 vezes mais baleias no período que antecedeu a matança do que agora. Uma delas teve sua população reduzida em dramáticos 96%. A nova análise, feita com base em genética por uma dupla de pesquisadores da Universidade Harvard, nos EUA, promete tornar ainda mais quentes as discussões sobre a reabertura da caça à baleia, que vem sendo exigida por países como a Noruega e o Japão. Ela mostra que os registros históricos das populações existentes antes da caça, nos quais os especialistas têm se fiado para estimar a recuperação dos estoques, estão possivelmente errados: havia pelo menos dez vezes mais baleias no mar do que o total contabilizado. Isso significa que as espécies ainda estão longe de se recuperar, mesmo após 17 anos de moratória à caça. "Provavelmente vai levar décadas até que essas populações voltem aos níveis de antes da caça", disse à Folha o biólogo Joe Roman, que assina o estudo juntamente com seu orientador de doutorado, Stephen Palumbi, na edição de hoje da revista "Science" (www.sciencemag.org). A quantidade de baleias existente antes da caça sempre foi um dado controverso. A Comissão Internacional da Baleia, órgão encarregado de disciplinar a caça no mundo, tem usado como base para suas estimativas as únicas informações disponíveis, que são os registros históricos. Feitos pelos próprios baleeiros, esses registros muitas vezes eram subestimados de propósito ou não levavam em conta as baleias que eram mortas mas não podiam ser embarcadas. Por esses registros, a população de baleias jubarte no Atlântico Norte -onde a caça comercial teve início, no século 19- ficava em torno de 20 mil indivíduos. A de baleias fin, outra grande espécie, variava entre 30 mil e 50 mil. A conta do DNA Usando variações na sequência de DNA obtido de baleias fin, jubarte e minke nos EUA, Roman e Palumbi puderam calcular a diversidade genética das espécies. Sabendo o quão variados são os genes, é possível estimar o número de cruzamentos necessários para produzir tal diversidade -e o tamanho da população. "Ficamos surpresos com a alta diversidade", disse Roman. "Eu achava que o tamanho das populações fosse ficar perto das estimativas tradicionais." Para as baleias fin e jubarte, o cálculo de população com base na diversidade genética assustou os cientistas: antes da caça, a primeira espécie tinha provavelmente 360 mil indivíduos só no Atlântico Norte, tendo sido reduzida a cerca de 15% da população original. A segunda, 240 mil indivíduos -a caça eliminou até 96% do estoque do animal. No mundo inteiro, as jubartes poderiam ser mais de 1 milhão antes da caça. A CIB fala em 100 mil. Para as minkes, que por serem pequenas não eram alvo preferencial dos primeiros caçadores, a estimativa ficou mais próxima do número atual: 256 mil indivíduos antes da caça, contra 149 mil hoje. Reavaliação Os cientistas americanos admitem que o estudo ainda tem problemas. Em primeiro lugar, não foi considerado o fluxo gênico entre baleias do Atlântico Norte e do Atlântico Sul. Depois, é preciso estender a avaliação a outras espécies e outras regiões do planeta. Mesmo assim, afirma Roman, "nós precisamos reavaliar o tamanho das populações históricas de baleia". "À luz de nossos achados, as populações de baleias fin e jubarte estão longe de poderem ser capturadas", diz a dupla. Para as minkes, no entanto, o estudo traz indicações de que os estoques estão próximos da chamada capacidade de suporte populacional, ou o número de baleias necessário para uma população se manter e crescer. A CIB considera que a caça deve ser suspensa quando um estoque estiver abaixo de 54% da capacidade. Como a diferença entre a população atual e a histórica é de apenas 56% nessa espécie, o estudo pode ser uma boa nova para os caçadores. "O Japão vai usar isso como argumento para pedir a reabertura da caça", disse a bióloga Karina Groch, do Projeto Baleia Franca. Sobre isso, Roman muda de assunto: "Decisões científicas sobre as baleias minke devem se basear em outros dados." Próximo Texto: Novo a pesquisa já recebe contestação Índice |
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