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PERISCÓPIO
Por que o organismo não rejeita o feto
JOSÉ REIS
especial para a Folha
Pelas proteínas paternas que
encerra, o feto deveria ser rejeitado pelo organismo materno
como corpo estranho ou enxerto. Assim não acontece e nesse
fato o útero desempenha papel
fundamental. Nele, tudo se acha
favoravelmente disposto para
impedir a rejeição do feto.
Durante a gravidez, os glóbulos brancos que, nesse período,
se acumulam junto à placenta
tornam-se menos ativos diante
da interleucina 2, à qual deveriam prontamente reagir noutras oportunidades. Por isso,
deixam passar sem ataque os
antígenos paternos do trofoblasto que envolve o feto.
Além disso, o trofoblasto produz uma substância que estimula o desenvolvimento, no útero,
de um tipo especial de linfócito
que secreta uma substância que,
bloqueando a interleucina 2,
breca a ação das células de defesa contra proteínas estranhas.
Por que haveria de existir material paterno no trofoblasto? O
reconhecimento, pela mãe, da
presença do material estranho
estimula a produção de anticorpos que aprestam as defesas do
feto, inclusive a produção de
inibidor de interleucina 2. Existe, pois, uma provocação inicial,
um dispositivo de alarma que
desperta um começo de resposta imune. Mas tudo isso ocorre
em benefício do ulterior desenvolvimento dos processos de
defesa do feto.
Esse fato é confirmado pelas
observações de P.M. Johnson,
de Liverpool, no Reino Unido.
Ele calcula que 1 em 300 mulheres casadas sofra de abortamento espontâneo de natureza imunológica.
Sem a proteção ativa que
aquela reação inicial desencadeia, o feto fica à mercê exclusiva das forças que agem para rejeitá-lo. Nas mulheres que sofrem de abortamento espontâneo imunológico, o sinal de
alarma deixaria de funcionar
pela grande semelhança genética entre os cônjuges, o que está
para ser demonstrado.
No St. Mary's Hospital de
Londres, procura-se solução
menos drástica que a sugerida
por Johnson. Ali se realizaram
experiências para tentar manipular o sistema imunológico
das mulheres, de maneira que
estas aceitassem o feto.
Os pesquisadores procuraram
promover, com material paterno, a reação inicial por uma espécie de vacinação feita com
glóbulos brancos do pai em mulheres que abortavam sem causa
discernível.
Das 22 mulheres vacinadas, 17
engravidaram normalmente, ao
passo que somente 10 o conseguiram no grupo das mulheres
abortadoras que, em vez da vacina, recebiam injeção de seus
próprios glóbulos. Em vez de
glóbulos brancos, também se
pode recorrer, como vacina, ao
material da placenta de gravidezes normais. Há em andamento
um estudo internacional para
descobrir se, de fato, esse tipo de
vacinação controla o abortamento espontâneo.
Essas experiências humanas
foram inspiradas em cruzamentos interespecíficos de animais,
nos quais a imunização materna
assegurou a sobrevivência do feto que normalmente seria rejeitado.
Tais experiências foram realizadas em Cambridge, Reino
Unido, e Ithaca, Estados Unidos. Nelas, implantaram-se fetos de jumento em seis éguas
tratadas pela vacinação com
glóbulos brancos do jumento.
Em três das éguas conseguiram-se crias vivas, ao passo que, sem
vacinação, ocorreram 90% de
abortamentos.
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