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Superpantanal dominou Amazônia, afirma estudo
Área alagada dominou um terço da América do Sul até 6 milhões de anos atrás
Conjunto de lagos, rios e
vegetação aberta abrigou
de jacarés filtradores a uma
"capivara" do tamanho de
um boi ou búfalo de hoje
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Se o Pantanal de hoje já impressiona como a maior área de
planície alagável do planeta,
imagine uma região equivalente, só que com tamanho multiplicado por 20, ocupando cerca
de um terço da América do Sul.
Adicione à mistura uma das
faunas mais diversificadas e bizarras que o continente já teve
e será possível ter uma idéia de
como era o lado oeste da Amazônia há uns 9 milhões de anos.
Esse ambiente estranho, onde jacarés se tornaram parecidos com baleias e primas das
capivaras pesavam tanto quanto um búfalo, está sendo redesenhado pelo trabalho do paleontólogo Mario Alberto Cozzuol, da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio
Grande do Sul. Nos próximos
meses, ele e seus colegas devem
publicar no "Journal of South
American Earth Sciences" a
mais abrangente reconstituição desse ecossistema. O trabalho de Cozzuol foi divulgado
pela revista "Pesquisa Fapesp"
(revistapesquisa.fapesp.br),
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
Andes adolescentes
O paleontólogo explica que o
superpantanal nasceu quando
a cordilheira dos Andes tinha
quase terminado sua formação
(faltava um último grande surto de elevação). No oeste da
atual Amazônia brasileira, uma
série de elevações do terreno,
conhecidas como arcos estruturais, cercavam a área do superpantanal, entre elas o chamado arco do Purus.
Tal como acontece hoje, essa
área recebia quantidades colossais de água e sedimentos vindos dos Andes. Mas, ao contrário do cenário atual, formou-se
uma espécie de panela funda,
cercada por elevações de todos
os lados. "Na área onde hoje está a foz do rio Purus, isso impedia que as águas corressem para o leste", explicou Cozzuol à
Folha. Isso quer dizer que simplesmente não havia o Amazonas que conhecemos, já que o
rio não desaguava no Atlântico.
Para onde, então, escapava
tanta água? Segundo o paleontólogo, os rios se espalhavam
em incontáveis meandros, lagos e afluentes temporários, estendendo-se para o norte (onde
hoje haveria a bacia do Orinoco, na Venezuela) e para o sul
(formando rios precursores da
atual bacia do Prata).
"Com tantos sedimentos entrando nessa bacia, os rios não
conseguiam se encaixar, mudando de lugar o tempo todo. E
isso também impedia que a floresta se fixasse", diz ele.
No entanto, as águas e suas
margens proporcionavam fartura de alimento. Que o diga o
Mourasuchus amazonensis,
crocodilo de até 8 m que desenvolveu dentes finos, os quais
lembram os órgãos filtradores
das baleias. Além disso, parece
ter possuído um papo, como os
pelicanos. A implicação dessa
anatomia esquisita é que, em
vez de caçar, como seus primos
de hoje, ele se limitava a nadar
com a bocarra entreaberta,
capturando plâncton (vida
aquática microscópica), pequenos peixes e crustáceos.
"Só um meio aquático muito
rico em nutrientes permitiria
esse estilo de vida", diz Cozzuol. Roedores enormes, do tamanho de um boi, comiam o
pasto do superpantanal, acompanhados de estranhos mamíferos herbívoros, os notoungulados, superficialmente parecidos com hipopótamos e rinocerontes. E havia muitos botos,
primos do atual boto-rosa.
Tanta diversidade de vida sofreu um baque quando novas
mudanças dos Andes e a liberação da corrente do Purus acabou formando a atual bacia do
Amazonas e permitiu que a
mata fechada se espalhasse.
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