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FÍSICA
Experimento feito nos EUA para verificar novas dimensões só detecta medidas compatíveis com modelos tradicionais
Teoria das supercordas tropeça em teste
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
As teorias mais extravagantes e
promissoras da física moderna
sugerem que o tecido do espaço-tempo possuiria, além das três dimensões espaciais tradicionais,
outras seis, invisíveis à luz da vivência humana. Pela primeira vez
um experimento atingiu o nível
de detecção necessário para
apontar alterações causadas pela
presença sutil dessas dimensões
extras -e nada foi encontrado.
O resultado elimina vários dos
modelos atualmente considerados promissores para a chamada
teoria das supercordas -mas
não todos. A idéia é conciliar os
dois grandes pilares da física (a
teoria da relatividade, que explica
a gravidade, e a mecânica quântica, que explica as outras interações possíveis entre partículas)
num cenário em que cordas vibrando num Universo de dez dimensões seriam responsáveis por
tudo que se observa. A idéia parece esquisita, mas ao menos é capaz de sugerir um caminho para
reunir a gravidade e as outras forças num único pacote teórico.
Sempre à procura de um sentido de unidade no mundo, os físicos não se satisfazem com a discrepante força gravitacional, que
é muito mais fraca que as demais. Isso motivou
alguns deles a especularem que a
força gravitacional na verdade tenha potência similar às de suas irmãs "quânticas", mas parecesse
mais fraca por ser diluída ao longo do caminho de propagação.
Além da quarta dimensão
Essa diluição aconteceria justamente nas dimensões que ninguém vê. Elas estariam enroladas
e extremamente encolhidas na
"tapeçaria" aparentemente plana
de cada uma das bem conhecidas
três dimensões estendidas.
Medindo a força da gravidade
entre dois corpos a uma distância
suficientemente pequena um do
outro -caso as dimensões enroladas estivessem mesmo lá-, seria possível observar um aumento
da força gravitacional com relação ao que seria previsto pela fórmula tradicional, elaborada por
Isaac Newton no século 17.
Alguns dos modelos da teoria
das supercordas apontavam que
efeitos de amplificação da gravidade deveriam ser detectáveis em
corpos separados por 100 micrômetros (0,1 milímetro). Na tentativa de verificar essa hipótese, Joshua Long e seus colegas da Universidade do Colorado em Boulder (EUA) desenvolveram um experimento que mediu a força gravitacional entre dois objetos feitos
de tungstênio separados por míseros 108 micrômetros.
O resultado, publicado hoje na
revista científica britânica "Nature" (www.nature.com), mais
uma vez vingou um matemático e
físico tricentenário: "Até agora,
Newton está mantendo seu terreno", escreveu Charles David Hoyle, físico da Universidade de Trento (Itália) convidado pela publicação para comentar o estudo.
Com isso ele quis dizer que as
forças observadas foram exatamente as mesmas que Newton teria previsto se usasse sua célebre
fórmula, que multiplica as massas
dos objetos por uma constante
gravitacional e divide o resultado
pelo quadrado da distância entre
eles, para analisar o experimento.
Evolução da gravidade
O conceito mais aceito hoje da
gravitação vem da teoria da relatividade de Albert Einstein (que
descreve a força gravitacional como a curvatura de uma quarta dimensão invisível, também responsável pelo que os humanos
entendem pelo conceito de tempo). Mas quando se trata de fazer
contas, Newton e sua fórmula resolvem bem a questão -toda a
matemática do estudo foi feita
com a velha formulação newtoniana, sem prejuízos.
"A fórmula de Newton é na verdade uma parte da teoria de Einstein. Basicamente, Newton descobriu uma peça do quebra-cabeça
que Einstein conseguiu montar",
explica Hoyle. "Para a maioria das
condições normais, a equação de
Einstein pode ser reduzida à de
Newton, e a fórmula de Newton é
muito mais fácil de interpretar."
O resultado leva os teóricos das
cordas para o canto do ringue. "A
janela onde essas dimensões adicionais poderiam aparecer está ficando cada vez menor", diz Mário Novello, um físico relativista
do CBPF (Centro Brasileiro de
Pesquisas Físicas) que não é particularmente entusiasmado com as
teorias das supercordas.
"Pelo meu ponto de vista, o resultado é ótimo, porque está acabando com as cordas", afirma.
Mas aparentemente ainda é possível aos cordistas escapar do nocaute. "Se eu fosse um defensor
das cordas, eu diria que o resultado é bom, porque está selecionando os bons modelos e descartando aqueles que não funcionam."
Promessa diminuta
De tudo que sobrou, ainda há
muito para alimentar os físicos.
As supercordas e as dez dimensões continuam sendo uma hipótese promissora, e vários modelos
ainda estarão imunes à refutação
experimental por, pelo menos,
muitos anos.
Algumas das formulações só
apresentariam desvios perceptíveis das teorias tradicionais no
chamado comprimento de
Planck, um valor absurdamente
pequeno. Se alguém quiser saber
qual, é da ordem de 10-32 mm.
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