São Paulo, sexta-feira, 28 de abril de 2000


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MEDICINA
Tratamento francês combate doença hereditária sem ajuda de outras drogas; resultado precisa ser confirmado
Terapia genética tem primeiro êxito

ISABEL GERHARDT
da Reportagem Local

Pela primeira vez, um método chamado terapia genética reverteu os efeitos de uma doença hereditária sem a ajuda de outras drogas. Pesquisadores franceses corrigiram um gene do corpo humano e assim trataram um distúrbio no sistema de defesa.
No estudo, publicado na revista "Science", dos EUA, dois bebês que sofriam de uma doença chamada imunodeficiência combinada grave ligada ao cromossomo X (SCID-X1, na sigla em inglês) foram tratados com sucesso.
Mas ainda é cedo para dizer que a doença foi totalmente curada. Apesar de os autores afirmarem no estudo que a terapia corrigiu a doença, Jennifer Puck, dos Institutos Nacionais de Saúde, dos EUA, disse que é preciso observar se os resultados são duradouros.
Pacientes que sofrem de SCID são obrigados a viver em ambientes completamente isolados (como o personagem de John Travolta no filme "O Rapaz da Bolha de Plástico"), pois o sistema de defesa (imunológico) é incapaz de proteger o corpo de infecções.
Mutações em diferentes tipos de genes podem resultar em SCID. No caso dos bebês da pesquisa, a SCID impedia que eles fossem capazes de produzir os glóbulos brancos, células do sistema imunológico que previnem infecções.
O tratamento que existe para essa doença é o transplante de medula óssea, que torna o corpo hábil a produzir os glóbulos brancos. No entanto, nem sempre os resultados são positivos e, por isso, os cientistas esperam fazer da terapia genética uma alternativa.
O primeiro teste de terapia genética para tratar uma menina que sofria de uma forma de SCID aconteceu há quase dez anos. Nesse caso, a paciente teve o gene correto inserido em glóbulos brancos "maduros" e continuou a receber um preparado que continha a proteína que era defeituosa no seu organismo.

Proteína sinalizadora
No novo estudo, os cientistas retiraram dos bebês células-tronco da medula óssea. Essas células, que ainda não se especializaram, são capazes de dar origem a outras células do corpo. Elas foram, então, incubadas com um vírus inofensivo, que continha o gene que produzia corretamente a proteína defeituosa (veja quadro).
Essa proteína funciona como um sinal para que as células do sistema de defesa se desenvolvam, cresçam e se espalhem pelo corpo, destruindo os invasores.
Depois de três dias infectando as células com o vírus, os cientistas transplantaram as células de volta nos bebês.
Novas células contendo a versão correta do gene foram identificadas no corpo 15 dias após o transplante. E os bebês foram capazes de responder às vacinas contra tétano, difteria e poliomielite, produzindo anticorpos.
Já se passaram dez meses desde o transplante, e os bebês estão em casa, saudáveis, sem receber nenhum tratamento adicional.
O autor do estudo, Alain Fischer, do Hospital Necker de Paris, disse que o sucesso do tratamento pode estar mais relacionado ao tipo de doença do que à técnica em si. Isso porque as células que têm a cópia correta do gene se multiplicam mais rapidamente que as que têm o gene defeituoso. Assim, mesmo que inicialmente o número de células transformadas seja baixo, o tratamento funciona.
Segundo disse à Folha Inder Verma, do laboratório de genética do Instituto Salk, nos EUA, outras doenças do sistema imunológico poderão receber o mesmo tratamento com sucesso.
O grupo francês já anunciou que está testando a terapia em um terceiro paciente.


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