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AMBIENTE
Para especialistas, projeto de R$ 2 mi da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca pode estimular pesca predatória
Governo quer vender peixes em extinção
TIAGO ORNAGHI
JAIRO MARQUES
DA AGÊNCIA FOLHA
O governo federal, por meio da
Seap (Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca), está lançando
uma campanha para estimular a
exportação de peixes nativos, alguns deles ameaçados de extinção, para os mercados europeu e
norte-americano. O projeto tem
orçamento de R$ 2 milhões e, de
acordo com especialistas, pode
estimular a pesca predatória.
Com ele, o governo espera gerar
3.500 empregos e incrementar as
exportações em US$ 50 milhões
até o final de 2005.
O ministro José Fritsch visitou
países da Europa onde promoveu
sessões de degustação de peixes,
entre eles alguns listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) como ameaçados de extinção. A Seap não considera que os peixes, que devem
ser exportados, estejam sob
ameaça, uma vez que podem ser
criados em laboratório.
Entre os peixes, estão o pirarucu, que chega a 3 m e pesa mais de
150 kg, o tambaqui e o pacu. "Para
o pirarucu não existe uma tecnologia totalmente dominada [para
criação em cativeiro]", diz Laerte
Batista de Oliveira Alves, coordenador do Cepta (Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros Continentais) do Ibama.
O mesmo é expresso pelo professor Francisco Manoel de Souza
Braga, do Instituto de Biociência
da Unesp de Rio Claro.
"Temos tecnologia para desenvolver pacu e tambaqui em cativeiro. Mas desconheço uma piscicultura que domine a técnica de
produção para o pirarucu. Para
conseguir a criação em cativeiro,
o peixe sairia a preço de ouro,
mais caro que caviar. A extração
dele é realmente na natureza. Estimular isso é muito delicado."
ONGs ligadas à preservação
ambiental e especialistas apontam que, sem uma rígida fiscalização, poderá haver aumento de risco para as espécies.
"O governo precisa tomar muito cuidado com isso [o estímulo à
exportação], ou vai acontecer o
que aconteceu com os jacarés do
Pantanal: para poder comercializar o couro, abriam-se criadouros
de fachada e comercializavam-se,
na verdade, animais que estavam
na natureza", disse Braga, que teme que a fiscalização não seja eficiente. "Hoje, não vejo como os
fiscais dariam conta da demanda.
Falar que criações serão fiscalizadas é uma coisa, botar em prática
é outra bem diferente."
Para Celso Russo, técnico da
Ecoa-Ecologia em Ação, ONG socioambiental, o perigo do projeto
"é estimular a captura das espécies, principalmente o pirarucu".
O consultor André Macedo
Brugger, da Fishtec Consultores
Associados, alertou para a necessidade do controle de origem dos
peixes que serão comercializados.
"Não há problema, desde que
haja rigor na certificação da origem do peixe. Senão isso pode estimular a captura predatória pelos
ribeirinhos, algo desastroso."
Variabilidade genética
Considerar que é possível garantir que uma espécie não corre
risco de extinção porque existem
criações em cativeiro é temerário,
segundo o Ibama. "Algo que não
ocorre na criação em cativeiro é a
variação genética. Uma espécie
cultivada acaba sem ter estudos
de variabilidade genética. Os animais podem ter origem em apenas um produtor", afirma Alves.
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