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Estudos põem em xeque noção de livre-arbítrio
HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
A pesquisa de Huettel é
mais uma a pôr em xeque a
noção de livre-arbítrio. A
pergunta fundamental é: somos livres para agir como
queremos? As implicações
da resposta nada têm de trivial. Se nossas ações são determinadas, seja por interações físico-biológicas, seja
por um Deus, como responsabilizar alguém por seus
atos? A justiça é possível?
Num experimento seminal dos anos 80, Benjamin
Libet, da Universidade da
Califórnia, plugou seus alunos a aparelhos de eletroencefalograma e demonstrou
que a atividade cerebral que
possibilita movimentos voluntários tem início cerca de
300 milissegundos antes da
decisão consciente de mexer
um braço ou uma perna.
A partir daí, neurocientistas de diversas linhagens desenvolveram testes semelhantes, corroborando os resultados de Libet. Michael
Platt e Paul Glimcher, da
Universidade de Nova York,
mostraram que algo parecido ocorre até com macacos.
Hoje a neurociência é mais
ou menos unânime em afirmar que o livre-arbítrio é
uma ilusão, a exemplo da
consciência, a qual, embora
não passe de um efeito colateral de vários sistemas cerebrais ligados em rede, nos leva genuinamente a crer na
balela cartesiana de que um
"minieu" incorpóreo (uma
alma) está no comando.
O livre-arbítrio seria, sob a
visão de certos filósofos e
neurocientistas, algo como
um tique nervoso ou a necessidade que o viciado tem de
conseguir droga -processos
a meio caminho entre o involuntário e o voluntário.
Boa notícia para advogados, que podem regozijar-se
com a perspectiva de novas e
mais extravagantes estratégias de defesa. Se nada pode
ser qualificado como inapelavelmente voluntário, é a
própria noção de crime doloso que cai por terra.
Isso significa que não há
justiça possível? Talvez não.
Alguns viciados superam sua
compulsão. Se, por um lado,
o farmacodependente quer a
droga (desejo de 1º grau); por
outro, ele sabe que o vício lhe
faz mal e planeja livrar-se dele (desejo de 2º grau).
O livre-arbítrio pode assim
ser descrito como um poder
de veto dos desejos de 2º
grau sobre os de 1º.
Tentando resgatar a noção
de responsabilidade, o filósofo Daniel Dennett propõe
uma versão mitigada de livre-arbítrio: nós temos o poder de veto e o poder de veto
sobre o veto, além de noções
de causalidade que nos permitem projetar o futuro e
calcular consequências.
Talvez não baste para salvar uma noção de justiça absoluta, mas serve para que a
sociedade siga funcionando.
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