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POLÍTICA CIENTÍFICA
Dólar alto e crescimento das despesas fazem diretoria elevar exigências para aprovação de projetos
Fapesp vai restringir verba para pesquisa
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
O tempo de expansão acelerada
da comunidade científica paulista
acabou. Apanhada pela alta do
dólar após grandes investimentos
ao longo dos últimos anos, a Fapesp (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo)
chegou ao limite orçamentário e
vai começar a restringir o financiamento à pesquisa.
"Não vai mais poder ser praticada a mesma política expansionista dos últimos dez anos", disse à
Folha o diretor científico da Fapesp, José Fernando Perez.
Segundo Perez, o nível de exigência na aprovação de financiamento a projetos vai subir. "Nós
estávamos atendendo 100% da
demanda qualificada. No momento, você vai ter de trabalhar
com uma demanda que eu chamo
de especialmente qualificada."
Ele também admite a redução
no escopo de alguns projetos, como o proteoma (o estudo das interações entre as proteínas de um
organismo), e a importação de
equipamentos para uso compartilhado. "Vai haver uma nova racionalidade, que é necessária
quando você chega a uma situação que não podia prever."
Perez, que é físico, compara a situação da Fapesp com a de agências financiadoras dos Estados
Unidos, como os NIH (Institutos
Nacionais de Saúde) e a NSF
(Fundação Nacional de Ciência).
"Essas agências atendem a 30%
da demanda qualificada", afirma.
Desde o ano passado, o órgão
tem adotado restrições à concessão de bolsas, especialmente de
mestrado. Para ser aprovado, um
pedido precisa de parecer "enfaticamente favorável" do assessor
contratado para analisá-lo.
Setores da comunidade estão
preocupados. Cinco pesquisadores ouvidos pela Folha, que não
quiseram ter seus nomes citados,
dizem temer pela manutenção da
qualidade científica das pesquisas
financiadas pela Fapesp. Um deles, da USP, questiona quais serão
os critérios de seleção de projetos.
Perez assegura que toda a demanda de excelência vai continuar sendo atendida. Mas o pesquisador, que não quis ser identificado, disse que teve negada pela
Fapesp verba que, até agora, vinha sendo aprovada, num projeto
reconhecido como sendo se excelência. Ele diz que todas as suas
recusas foram burocráticas.
Importações suspensas
As medidas restritivas foram catalisadas pela desvalorização do
real, que se acentuou no começo
do semestre. Em setembro, a Fapesp divulgou uma circular na
qual, em virtude da crise no câmbio, anunciava a suspensão de todas as importações de bens e serviços -como compra de equipamentos, reagentes para experimentos e livros. Essas importações correspondem a um terço
dos gastos da fundação.
Os pesquisadores reagiram, e a
fundação decidiu analisar caso a
caso os pedidos de importação.
Uma das reações foi uma carta assinada por 370 cientistas pedindo
à Fapesp que flexibilizasse a decisão. Insumos essenciais para experimentos, como reagentes perecíveis sem os quais experimentos já em andamento seriam perdidos, terão compra autorizada.
Mesmo assim, a crise das importações disparou um descontentamento crescente de setores
da comunidade com a diretoria
da fundação. Aponta-se falta de
transparência nas decisões da Fapesp e um alijamento da diretoria
em relação à comunidade.
Os pesquisadores ouvidos pela
Folha queixam-se de que a Fapesp tenha ficado impessoal com
o gigantismo. Reclamam também
que não há controle da comunidade sobre as políticas da fundação, a ponto de se cogitar a criação
de uma ouvidoria.
"O Conselho Superior tem
membros permanentes, o que eu
acho um erro", disse o geneticista
Crodowaldo Pavan, do ICB (Instituto de Ciências Biomédicas) da
USP, ex-presidente da Fapesp.
Perez, que está a caminho do
quarto mandado consecutivo como diretor científico, diz que as
críticas são "pontuais". O diálogo
com a comunidade, segundo ele,
é feito por meio de reuniões com
líderes de projetos e pela presença
semanal de 70 cientistas -os chamados coordenadores de área-
na diretoria científica.
"Acho que alijar não é um bom
termo. Quando eu cheguei aqui,
em 1993, tínhamos 4.500 processos por ano. Hoje temos 15 mil. Isso não permite mais tratamento
personalizado", afirma o diretor
científico. Sobre a ouvidoria, ele
prefere não se manifestar: "Isso é
um assunto que diz respeito ao
Conselho [Superior]".
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