São Paulo, terça-feira, 30 de abril de 2002

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ZOOLOGIA

Tentilhões pesquisados pelo pai da seleção natural se modificaram em apenas 30 anos, relatam cientistas dos EUA

Estudo flagra evolução em ave de Darwin

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um estudo de trinta anos de alguns dos pássaros mais famosos da biologia revelou que a evolução é algo imprevisível. A pesquisa, feito com os clássicos tentilhões de Darwin das ilhas Galápagos, pôde flagrar a seleção natural agindo em duas espécies de ave.
O naturalista britânico Charles Darwin (1809-1882) desenvolveu uma teoria da evolução biológica cujo "motor" é o fenômeno chamado "seleção natural" -isto é, o processo pelo qual os organismos mais adaptados ao seu ambiente tendem a sobreviver e deixar descendentes, transmitindo as suas características genéticas.
Darwin, na sua viagem de circunavegação a bordo do veleiro HMS Beagle, passou pelas ilhas Galápagos, pertencentes ao Equador, durante seis semanas em 1835. Entre os animais que coletou e depois descreveu estavam os tentilhões, que têm uma grande variação em tamanho, forma do bico e hábitos alimentares.
Entre esses pássaros existem os que têm bicos que lembram alicates, capazes de esmagar as sementes mais duras. Outros comem insetos, outros são vegetarianos e um deles, o "tentilhão vampiro", dá bicadas para chupar o sangue de aves marinhas.
O casal Peter Grant e Rosemary Grant, da Universidade de Princeton, EUA, começou em 1973 a estudar a população de duas espécies de uma pequena ilha, a Daphne Maior. Eles contaram as populações e mediram certos traços do tentilhão terrestre de bico médio (Geospiza fortis) e do tentilhão dos cactos (Geospiza scandens). Os traços básicos eram tamanho do corpo e tamanho e forma do bico. Esses pássaros pesam, em média, 20 gramas.
Eles notaram uma forte correlação dessas medidas com eventos naturais pelos quais a ilha passou. Ao fazer o estudo de longo prazo, foi possível medir o impacto nos tentilhões de momentos de seca intensa ou de chuvas torrenciais -como a provocada pelo fenômeno climático El Niño em 1983.
No caso do G. fortis, por exemplo, notou-se que o tamanho médio do bico aumentava nos anos de seca, quando apenas sementes maiores e duras estavam disponíveis. Em tempos mais úmidos, bicos menores eram mais comuns.
Desde o começo do estudo em 1973 até o ano passado, as médias de tamanho do corpo e formato do bico das duas espécies eram "marcadamente diferentes", escreveram os autores em artigo na última edição da revista "Science" (www.sciencemag.org).
Houve uma diminuição, depois um aumento abrupto, e depois uma queda mais lenta das medidas de tamanho e bico do tentilhão terrestre de bico médio.
"Se nós tivéssemos parado a amostragem depois de dez anos, nossas conclusões seriam diferentes", dizem os dois. Naquele momento, a única diferença notável seria o tamanho do bico da ave.
Ao persistir em pesquisar por quase 30 anos, eles puderam testemunhar um evento de seleção natural que afetava também a forma do bico no G. fortis.
As Galápagos são um "laboratório" ideal para pesquisar a evolução. Como estão distantes do continente, o isolamento permitiu a evolução de espécies próprias.



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