|
Próximo Texto | Índice
AMBIENTE
Estudo pioneiro do Ipea e do Ipam calcula custo de incêndios acidentais; perda vai de US$ 107 milhões a US$ 5 bilhões
Fogo torra até 9,3% do PIB da Amazônia
MARCELO LEITE
EDITOR DE CIÊNCIA
Para quem precisa de cifras monetárias para se convencer de que
o fogo é um mau negócio para a
Amazônia, ei-las: incêndios acidentais consomem de 0,2% a
9,3% do produto interno bruto
(PIB) da região, ou algo entre US$
107 milhões e US$ 5 bilhões. Esse é
o custo de pastos e cercas destruídas, madeira desperdiçada, CO2
lançado na atmosfera e internações por doenças respiratórias.
Os valores constam do primeiro
estudo a fazer esse tipo de cálculo
para a Amazônia. Seus autores
são do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea, www.
ipea.gov.br) e do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
(Ipam, www.ipam.org.br)
-uma parceria governo federal-ONG impensável há dez anos,
mas que hoje é bem comum.
Pelo Ipea, o estudo foi coordenado pelo economista Ronaldo
Serôa da Motta. Para Serôa, 48, o
enorme intervalo entre as quantidades apuradas é resultado do
grau de incerteza no cálculo.
A incerteza decorre do encadeamento de uma série de pressupostos, variáveis e estimativas. O esquema geral de cálculo parece
simples, à primeira vista: medir o
dano físico e depois associar a ele
um valor monetário. A prática se
parece mais com contar grãos de
areia -e atribuir a cada um determinado valor, sem que pareça
maluquice. Foram mais de dois
anos de trabalho e reuniões no
Ipea e no Ipam.
Para Daniel Nepstad, 44, ecólogo americano que liderou a pesquisa no Ipam, a estranheza provocada pela diferença entre 0,2%
e 9,3% do PIB deve ser entendida
no contexto. Nepstad esclarece
que essa distância decorre também, em grande parte, da variação interanual nas condições da
floresta. Em anos de El Niño
(anormalidade na temperatura
do Pacífico que afeta o clima global e causa secas na Amazônia),
por exemplo, queima-se uma área
muito maior da floresta amazônica, e o intervalo se estreita.
O relatório Ipea/Ipam não considerou queimadas intencionais,
como as usadas para abrir áreas
de floresta para agropecuária, ou
para limpar pastos. Nesses casos,
o fogo é considerado um benefício, por paradoxal que pareça. Só
foi computado como dano econômico o fogo acidental, aquele
que atinge áreas de pastagens e
trechos de floresta que o agricultor não queria queimar (cerca de
45% do total danificado).
Quando isso ocorre, perdem-se
tanto benfeitorias (como cercas)
quanto madeiras nobres na parte
florestada da propriedade. Usaram-se para o cálculo valores como US$ 5 de madeiras comerciais
por hectare de mata (ou 10 mil
m2), o que totaliza US$ 13 milhões
em anos de El Niño, quando o fogo engole em média 26 mil km2 de
florestas (sem contar o incêndio
de Roraima em 1998).
O relatório é pioneiro também
no cálculo dessa área queimada
em 1998. Enquanto todo mundo
estava de olho em Roraima, uma
área bem maior pegou fogo na
floresta de transição do sul do Pará e de Mato Grosso. "Foram centenas de incêndios, e não um megaincêndio, como em Roraima",
disse Nepstad. "Em sobrevôo no
sul do Pará, 37% das florestas tinham cinzas no chão."
Para cercas, foram estimados
US$ 1.400/km. O custo do pasto
queimado acidentalmente foi calculado pelo preço de aluguel de
pastagens, que vai de R$ 37/ha
(TO) a R$ 89/ha (AM).
Incêndios e queimadas da Amazônia também causam 2,5% das
emissões mundiais de CO2, contribuição considerável para o efeito estufa (aquecimento da atmosfera global). Se o Brasil reduzi-las,
poderia tentar vendê-las no mercado internacional de emissões
que está surgindo. O estudo calcula que o preço ficará entre US$
3,50 e US$ 20 por tonelada.
Próximo Texto: Flonas podem ser a solução Índice
|