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CÉLULAS-TRONCO
Governo libera R$ 11 mi para estudos, mas, de 41 projetos, nenhum aproveitou possibilidades de nova lei
Verba não atinge pesquisas com embrião
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Foram anunciadas ontem as
primeiras verbas para a pesquisa
com células-tronco no Brasil depois da aprovação da Lei de Biossegurança, que permitiu a utilização de embriões nesse tipo de estudo graças à longa pressão de
cientistas e pacientes. Contudo,
dos 41 projetos de pesquisa contemplados, apenas três lidam com
células-tronco embrionárias e nenhum com linhagens celulares
obtidas no Brasil.
O anúncio contraria a expectativa gerada pelo edital para pesquisas na área, que foi lançado pelo
CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) em abril deste ano, um
mês após a votação favorável à lei
no Congresso. Na época, foram
obtidos recursos da ordem de R$
11 milhões, divididos igualmente
entre o Ministério da Saúde e o
MCT (Ministério da Ciência e
Tecnologia, ao qual o CNPq está
subordinado).
As células-tronco são capazes
de uma versatilidade fisiológica
impressionante, podendo assumir a função dos mais variados tecidos do organismo, dos neurônios do cérebro aos músculos do
coração. Até a aprovação da Lei
de Biossegurança, os cientistas
brasileiros só tinham permissão
para trabalhar diretamente com
as células-tronco adultas, que
vêm principalmente da medula
óssea e do cordão umbilical.
Elas mostraram o que parece ser
uma surpreendente maleabilidade e foram testadas com sucesso
num pequeno número de pacientes, melhorando quadros de males cardíacos, derrame cerebral,
esclerose múltipla e tetraplegia.
Mas o consenso entre os pesquisadores é que as embrionárias representam uma promessa terapêutica muito maior, por comprovadamente conseguirem assumir as características de qualquer célula. Daí a pressão para
permitir seu uso, embora ainda
não se saiba como controlar seu
funcionamento.
"Fiquei decepcionada, já que
nos sentimos incentivados pela
aprovação da lei", disse Lygia da
Veiga Pereira, do Instituto de Biociências da USP. "Mas o comitê
foi formado por cientistas, meus
pares, e eles devem ter tido seus
critérios para fazer essa seleção."
Ela é uma das principais especialistas brasileiras em células-tronco embrionárias e havia submetido uma proposta para derivar linhagens brasileiras delas. Essencialmente imortais, as linhagens
são ferramenta básica para entender como uma célula-tronco assume funções definidas.
Segundo Luiz Fernando Lima
Reis, do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, que integrou o comitê responsável pela
seleção dos trabalhos, o critério
foi puramente científico. "Como
você pode ver, nós seguimos fielmente o edital, que não era dedicado apenas às células embrionárias, mas à terapia celular em geral", explica ele. "Das 106 propostas que recebemos, a maioria já se
referia às células-tronco adultas, o
que talvez tenha criado esse aparente viés na escolha." Segundo a
assessoria de imprensa do MCT, a
idéia é que os "usuários finais"
dos estudos sejam os pacientes.
Entre os poucos trabalhos com
células-tronco embrionárias está
o de Antonio Carlos Campos de
Carvalho, da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro). "Vamos usar uma linhagem já derivada ["emprestada" pelo americano
Douglas Melton, da Universidade
Harvard] para entender os mecanismos que as transformam em
neurônios ou células do coração.
Queremos tornar o processo mais
eficiente", diz Carvalho.
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