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Nobel premia técnicas para reprogramar as células

Britânico e japonês vão dividir o prêmio de medicina de R$ 2,4 milhões

Estudos de 1962 e 2006 abrem caminho para reverter célula adulta a estado de embrião e podem trazer curas

Kyodo/Reuters
Os ganhadores do Nobel, Yamanaka e Gurdon, em 2008
Os ganhadores do Nobel, Yamanaka e Gurdon, em 2008

DO EDITOR DE “CIÊNCIA+SAÚDE”

O Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina de 2012, anunciado ontem, homenageia os 50 anos de uma das buscas mais fascinantes da biologia: a tentativa de criar uma "máquina do tempo" para os seres vivos.

Separados por cinco décadas, o britânico John Gurdon, 79, e o japonês Shinya Yamanaka, 50, deram passos fundamentais na busca por transformar células adultas, com "profissão" definida no organismo, em equivalentes das células embrionárias, com potencial quase ilimitado para virar componentes de ossos, músculos, rins e cérebro, por exemplo.

Infectar células adultas com essa "síndrome de Peter Pan" ainda não produziu curas milagrosas, mas traz a esperança de que, no futuro, seja possível produzir tecidos para transplante sem o risco da rejeição. Os primeiros testes da ideia em pacientes humanos estão a caminho, disse Yamanaka ontem.

E as células reprogramadas já têm se mostrado plataformas interessantes para simular doenças com precisão ou testar novos remédios.

Por tudo isso, o britânico e o japonês vão dividir o prêmio de 8 milhões de coroas suecas, ou R$ 2,4 milhões

DOLLY? QUE DOLLY?

Em certo sentido, a grande perdedora do prêmio deste ano é a ovelha Dolly -sem falar no britânico Ian Wilmut, o seu criador.

Isso porque o comitê do Nobel decidiu premiar outros clones, menos midiáticos mas nem por isso menos importantes: as rãs da espécie Xenopus laevis com as quais Gurdon trabalhou, levando a uma publicação seminal do cientista em 1962.

Trabalhando na Universidade de Oxford, Gurdon transferiu o núcleo das células do intestino de girinos da espécie para óvulos dos quais ele tinha extirpado previamente os núcleos com a ajuda de radiação ultravioleta.

O resultado: girinos novinhos em folha, que se desenvolveram a partir do DNA das células intestinais -sinal de que elas ainda tinham o potencial de gerar um indivíduo inteiro e não estavam necessariamente presas ao seu destino de células adultas.

Em essência, é o que os criadores de Dolly fizeram depois. "Eu queria saber o que se passa na cabeça do Ian Wilmut depois disso", brinca Stevens Rehen, especialista em células-tronco da UFRJ.

"A verdade é que o avanço da Dolly foi incremental, com o trabalho do Gurdon o dogma já estava quebrado", diz Alysson Muotri, pesquisador brasileiro da Universidade da Califórnia em San Diego.

Nascido no ano em que Gurdon publicou o trabalho com batráquios, Yamanaka foi o responsável por criar a receita que transforma células adultas em equivalentes das embrionárias sem precisar do processo de clonagem.

"Ele tinha acesso aos dados do banco japonês de células-tronco embrionárias e chegou a uma lista de 24 genes que pareciam estar ligados à pluripotência [a capacidade de dar origem a qualquer célula]", conta Muotri.

Aí, inseriu os genes em células da pele de cobaias e depois foi diminuindo a lista, até achar quatro essenciais para o processo. "É o que chamo de trabalho de japonês", brinca o brasileiro. Graças a essa paciência, o resto é história.

(REINALDO JOSÉ LOPES)

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