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Herança da avó

Aprenda a fazer o bolinho de chuva de Benê Ricardo, banqueteira de 79 anos que perpetua a receita aprendida em vilarejo no sul de Minas Gerais

MARÍLIA MIRAGAIA
DE SÃO PAULO

Dias frios ou nublados, há muito, deixaram de ser pretexto para fazer o bolinho de chuva. Hoje em dia, a receita é preparada sem cerimônia a qualquer hora.

Mas o quitute, recém-saído da panela, tem inegável vocação para aplacar as baixas temperaturas do inverno.

Os bolinhos devem ter textura sequinha, açucarada, com leve sabor de canela. Precisam ser fritos aos poucos, em óleo quente, o fogo não muito alto, para que não fiquem cru por dentro.

Para a banqueteira Benê Ricardo, 79, o segredo da guloseima é a massa, que deve ter consistência firme o suficiente para ser "pingada" com a colher na panela.

"É tão fácil que quase não tem receita", responde Benê, quando lhe perguntam se pode ceder sua fórmula para preparar o quitute.

Trata-se de uma receita com história própria, que já era feita há quase 70 anos por sua avó (que ela chama de madrinha Eugênia), no distrito de São José do Mato Dentro, no município de Ouro Fino, em Minas Gerais.

Naquela época, a avó de Benê cozinhava no fogão a lenha e, em vez de óleo, usava banha de porco para frituras.

Na falta de farinha de trigo, ingrediente então inconstante, a massa era preparada com farinha de araruta (espécie de tubérculo), feita pela própria família.

Era coberto com açúcar mascavo pilado, para ficar fininho, e recebia canela em pau ralada na hora.

TIA NASTÁCIA

Muitas crianças escreviam cartas a Monteiro Lobato com pedidos relacionados à sua obra -dentre eles, o modo de preparo do bolinho de chuva da Tia Nastácia era uma constante, diz Marcia Camargos, autora de "À Mesa com Monteiro Lobato" (ed. Senac, 112 págs.; R$ 55, em média).

A receita, que constava no caderno de Purezinha, mulher do escritor, não era apenas querida dos leitores, mas também de Lobato.

Registros de nascimento do bolinho de chuva, entretanto, são imprecisos: ele sobreviveu sendo repetido por gerações de cozinheiras que o preparavam para as suas famílias.

Surgiu, provavelmente, entre o fim do século 19 e começo do século 20. "É fruto de um encontro de diversas influências, dos doces conventuais portugueses aos costumes caipiras", afirma o professor de história da gastronomia Sandro Dias, do Senac.

Mas tudo, afinal, pode ter começado como uma maneira de compensar crianças que, longe do quintal, buscavam conforto enquanto chovia.

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