São Paulo, quinta-feira, 11 de agosto de 2011

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Faca de estimação

Chefs contam a relação afetiva com o utensílio, explicam por que odeiam quando outros cozinheiros mexem no seu jogo e são até parados pela polícia por andar com ela

MARÍLIA MIRAGAIA
PRISCILA PASTRE-ROSSI

DE SÃO PAULO

Ela está para os chefs como a guitarra estava para Jimi Hendrix. A faca é o xodó, a queridinha dos cozinheiros.
E nem pense em cobiçar a do próximo. Mexer com a faca do colega é sinônimo de problema. Simone Bert, chef do peruano Wanchako, em Maceió, que o diga.
"Quase infartei nesta semana. Pegaram a minha faca e ainda quebraram a ponta."
Julio Hiroshi, do Sushi Hiroshi, em Santana, São Paulo, também já passou por dias de fúria por causa disso.
"Um ajudante de cozinha pegou a minha faca de sashimi para desossar um frango", afirma, em tom de revolta.
Tanto ciúme tem razão de ser. Simone explica que, se a faca passa por várias pessoas, ela perde o fio. "Isso acontece porque cada um usa o corte de um jeito", diz.
O estrago no bolso também é grande. Segundo Hiroshi, a faca que ele perdeu com o uso indevido do colega hoje custaria US$ 1.350 (R$ 2.200).
Se uma faca vale tudo isso? "Com uma dessa eu corto 50 kg de sashimi sem perder o corte. Com a de R$ 200, corto 5 kg e já era."
Além do ciúme da faca, outra coisa que os chefs têm em comum são as cicatrizes.
"Tenho uma coleção delas", diz Diego Belda, do Rothko, em São Paulo.
"Já me cortei até tirando faca de sashimi da caixa", diz. "Na cozinha, cheguei a ir ao hospital dar uns pontinhos e voltar correndo trabalhar."
Daniela França Pinto, do Lola Bistrot e do Marcelino, ambos na Vila Madalena, também se lembra dos momentos difíceis que passou com seus xodós. Quando fazia o curso de gastronomia, chegou a ser parada pelo menos duas vezes pela polícia.
"Como explicar que eu não era uma assassina ou um samurai andando com aquele monte de facas? Tinha de mostrar o ralador e o dólmã para convencer os policiais."
Daniela dá a dica do instrumento ideal: "A melhor faca é a afiada. Com ela se faz menos força e, consequentemente, corta-se menos", diz.

ERROS COMUNS
O nipo-pernambucano Taró Matsumoto, presidente da Associação Brasileira dos Restaurantes da Boa Lembrança, é o homem a quem todos os chefs do Recife recorrem quando o fio de suas lâminas perde a precisão. Seu aprendizado foi no Japão, onde o corte é tão ou mais importante que a cocção.
Segundo ele, o erro mais comum é usar a faca como batedor. "A faca adequada para bater nos alimentos e quebrar ossos é o cutelo. Nenhuma outra, por melhor que seja, suporta o choque", diz.

Colaborou BRUNO ALBERTIM, de Recife



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