São Paulo, quinta-feira, 28 de julho de 2011

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FOGO ALTO A visão de quem cozinha

RODRIGO OLIVEIRA

Um pai cabra-macho


O caldinho de mocotó fez fama, a lojinha de produtos regionais virou um boteco, que virou um restaurante


Meu pai comemorará mais um aniversário no dia 12 de agosto, antes da minha próxima coluna ir ao papel. Assim, aproveito a deixa para hoje contar um pouco sobre ele e sobre o relacionamento que desenvolvemos trabalhando juntos no nosso restaurante, dia a dia, ano a ano.
Seu José Almeida é cabra-macho, sertanejo, um dos filhos mais velhos de uma família de 14 irmãos.
Desde cedo tomou conta dos demais e de parte do sustento de casa trabalhando na roça.
Ainda garoto teve nove cabeças de gado, crescidas a partir de um bacuri dado pelo tio.
A seca comeu tudo, foram-se os bichos para salvá-los da fome.
Quando não havia mais medida, aventurou-se na cidade grande. Chegou a São Paulo depois de oito dias de sacolejos num ônibus que, por pura sorte, completou a viagem.
Por aqui enfrentou de tudo, desde trabalhos severos em fundição e metalurgia, até modestos negócios próprios como uma padaria e uma pequena malharia. Até que ao lado de dois irmãos, Gercino e Gilvan, abriu a Casa do Norte Irmãos Almeida. A sorte começou a mudar.
O minúsculo empório nordestino se tornou um sucesso. Em um ano montaram a segunda casa e em um pouco mais, a terceira. Três sócios, três negócios, a decisão foi dividir para conquistar. Cada um deles assumiu o comando do seu futuro e todos prosperaram. Seu Zé, que ficou na Vila Medeiros, fez fama com seu caldinho de mocotó, a lojinha de produtos regionais virou um botequinho, que virou um restaurante.
Foi aí que eu cheguei ainda garoto. Primeiro, lavando louça. Depois, atendendo mesas, para enfim mexer em tudo. A casinha de dez mesas começava a ganhar as feições de hoje. A cada equipamento comprado ou reforma feita, lá vinha meu pai questionar o proveito daquilo.
Não importava o tamanho da bronca, sabia que, no fundo, ao final do dia, ele se orgulharia de mim.
Herdei do meu pai o gosto pelo trabalho e o sentimento de responsabilidade pelo bem- estar de todos.
Se hoje sou bom cozinheiro, bom pai, é porque tive o exemplo. Enfim, vim aqui para dizer "feliz aniversário" e obrigado por tudo, pai.

RODRIGO OLIVEIRA é chef do restaurante Mocotó



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