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Pasquale Cipro Neto

'Pai de atleta são-paulino se indigna'

Como no infinitivo não existe o bendito "i", as pronúncias cultas são outras. E quais são afinal?

HÁ ALGUNS dias, um site publicou o seguinte título: "Agente acusa rival de assediar Lucas; pai de atleta são-paulino se indigna". Ao ler o título, veio-me à mente a questão da pronúncia da forma verbal "indigna". Como se lê essa palavra? E como se leem flexões verbais como "impregna", "designa", "estagna", "opta", "coopta", "intercepta" etc.?

Imagino que o caro leitor já tenha ouvido, mais de uma vez e de pessoas dos mais diversos níveis de escolaridade, algo como "desiguÍna", "impreguÍna" ou "opÍta". De início, é bom deixar claro que, embora compreensíveis, essas pronúncias são inadequadas ao padrão formal do idioma. E por que são compreensíveis? Porque, na prática, tendemos a pronunciar o infinitivo desses verbos como se de fato houvesse um "i" antes da sílaba final "nar" ou "tar", ou seja, pronunciamos o infinitivo como "indiguInar", "impreguInar" ou "opItar". Daí para as pronúncias "impreguÍna" etc. é um passo, absolutamente compreensível quando se leva em conta o natural processo de "regularização" da conjugação verbal pelo falante. Por acaso não é isso que explica o fato de as crianças dizerem "eu sabo", "eu fazo" ou "eu podo" (de "poder")?

Moral da história: se as formas infinitivas tivessem o inexistente "i", teríamos mesmo as pronúncias citadas no início do parágrafo anterior, mas, como o bendito "i" não existe, as pronúncias cultas são outras. E quais são afinal? Uma pista: esses verbos são regulares, ou seja... Bem, o caro leitor já captou?

O que significa o fato de um verbo ser regular? Significa que ele apresenta as características típicas da maioria dos verbos, ou seja, seu radical não sofre alteração, suas flexões têm as terminações da maioria dos verbos e a posição da sílaba tônica dessas flexões também é a mesma do padrão, da maioria.

Posto isso, pense comigo: qual é a sílaba tônica das formas verbais "fala", "bebe" e "permite", da terceira pessoa do singular do presente do indicativo? É a penúltima, ou seja, essa palavras são paroxítonas, certo? Se você observar bem, verá que isso ocorre com a maior parte das flexões verbais semelhantes.

Quer fazer um teste rápido? Vamos lá: anda, joga, deixa, sofre, vende, promete, decide, resiste, insiste... Todas essas flexões são da terceira pessoa do singular do presente do indicativo e são paroxítonas, não? Bem, se as formas "designa", "impregna" e "opta" são flexões de verbos regulares... Você já concluiu: essa palavras são paroxítonas, portanto a pronúncia culta é "desÍgna", "imprÉgna" e "Ópta", com o "g" e o "p" suavemente pronunciados.

No caso do título da matéria sobre Lucas, temos, pois, a pronúncia "indÍgna" e não "indiguÍna". Vamos ler? Lá vai, caro leitor: "Pai de atleta são-paulino se indigna".

Bem, a esta altura, cabe um comentário sobre uma incorrigível praga jornalística: a omissão dos artigos definidos. Faria sentido a omissão do artigo definido "o" em "Pai de atleta são-paulino se indigna" se não se informasse ou não se definisse qual é o atleta. Ocorre, porém, que o título começa com "Agente acusa rival de assediar Lucas", portanto já se sabe qual é o atleta são-paulino em questão. No lugar de "Pai de atleta são-paulino se indigna", deveríamos ter "Pai do atleta são-paulino se indigna". É isso.

inculta@uol.com.br

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