Índice geral Cotidiano
Cotidiano
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Walter Ceneviva

De caminhoneiros e de rodovias

Porque este país, que tem possibilidade de uso de vias fluviais, as trocou pelo predomínio das rodovias?

O título pretende dizer o oposto do que parece: a verificação da culpa penal ou civil, em acidentes das estradas, transcende da figura exclusiva dos motoristas de caminhão.

Lembro dois exemplos recentes: 33 mortes, na BR-116, em choque de uma carreta para transporte de minérios contra um ônibus, na área de Salvador; engavetamento recorde na rodovia dos Imigrantes, em São Paulo, com baixo número proporcional de vítimas pessoais, mas enormes danos materiais.

Primeira pergunta, em três partes: porque este país, que tem possibilidade de uso de suas vias fluviais, as trocou pelo predomínio quase total das rodovias? Quem se beneficiou com isso? Há modos de corrigir o erro?

Se consultarmos a lei, seus princípios e fundamentos, verificaremos que a responsabilidade pelo controle rodoviário tem vários níveis. Na visão geral leia-se o Código de Trânsito Brasileiro (Lei n. 9.503/97), seus anexos e legislação complementar, no Sistema Nacional de Trânsito (art. 7º e seguintes) e nas funções do Contran. Sua aplicação deve ser ajustada às condições existentes, servindo de exemplo o piso com buracos da BR-116. A culpa administrativa irá da construção mal feita até a falta de sinalização e fiscalização. É cabível outra pergunta: porque não se desenvolveu o uso de vias aquáticas, comuníssimo nos Estados Unidos e na Europa? Quem se beneficiou disso?

Na BR-116, o piso molhado é escorregadio; seco ergue poeira espessa. Perturba a visão dos motoristas. Resta saber se os encarregados de eliminar os perigos da estrada cumpriram seu dever ou se não tinham condições para esse fim.

Voltando à lei, deveremos verificar se os administradores públicos tiveram meios compatíveis para a tarefa e mesmo assim cometeram erros que contribuíram para a perda de vidas e prejuízos materiais. Evento que, sob outra ótica, se refere ao retardamento ou abandono da derivação do rio São Francisco, não se sabendo se afastou esperanças do trafego fluvial na área ou se será retomado.

Lembremos que muitos motoristas de caminhões pesados excedem limites de segurança, confiados no tamanho de seus veículos. Cabe perguntar: estatisticamente quais os índices de multas, suspensões, apreensões ou cassação de cartas? As polícias envolvidas deram conta do cumprimento de suas funções?

Não se esqueça, ainda, que na fila dos responsáveis, além do caminhoneiro, há muita gente que, omitindo-se em um ou alguns de seus deveres, nem conservou a estrada, nem impôs níveis de circulação compatíveis com as condições encontradas, ou, na pior alternativa, deixou-se corromper.

O caminhoneiro tem, com frequência, o papel de ator principal do acidente com vítimas no qual figure, tenha ou não tenha culpa. Ele é quem enfrenta o juiz criminal, o promotor, o parente da vítima. Todavia, em sã consciência, não é, necessariamente, o exclusivo responsável pelo dano pessoal e material nos desastres. A dominante utilização do transporte rodoviário, nas grandes extensões do território nacional, esquecidas as muitas vias fluviais, causará ainda mais mortes, a longo prazo.

Cabe a última pergunta, dividida em duas partes: quem se beneficiará, afinal, com essa orientação? O que farão os defensores do uso dos rios e lagos brasileiros?

-

Danuza Leão

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.