São Paulo, domingo, 01 de fevereiro de 2004

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SÃO PAULO FASHION WEEK

Com truques e ousadia, anônimos invadem área exclusiva

Celebridades e "wannabes" disputam holofotes da moda

FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

Não é só na novela das oito que ser ou estar perto de gente famosa é uma obsessão.
Para quem persegue os holofotes da São Paulo Fashion Week, o mais importante evento de moda do Brasil, que termina hoje, a vaidade é o motor de sacrifícios como forçar a simpatia de estranhos, mendigar convites e se espremer na multidão para assistir a um vaivém na passarela que não dura 15 minutos.
Não é a toa. A SPFW movimenta os endereços mais elegantes e caros da cidade e reúne, em desfiles, jantares e badalações, gente bonita, importante, rica e famosa. Atrai, ainda, jornalistas estrangeiros e clientes endinheirados de todo o país para a capital paulista.
A quem não cabe nenhuma das classificações acima, resta o fardo de ser um "wannabe". O apelido, criado no chamado mundinho da moda, vem do inglês "want to be", que significa "querer ser". Trata-se do pessoal que queria fazer parte do universo fashion, mas não está na lista de convidados.
Os "wannabes" precisam usar truques e mutretas para estar ao lado do seleto grupo dos fashionistas. Tudo com a ajuda de uma produção caprichada.

Tititi
Já na entrada principal da SPFW, uma aglomeração. É preciso convite para entrar na área onde ficam restaurantes, exposições e estandes e que dá acesso às salas de desfile -o que nem todos têm. E ali começa a confusão.
"Estamos aqui há duas horas sem nenhuma perspectiva de conseguir um convite", lamentava a estudante Vaneska Donato, 23, na porta da SPFW, sentada no chão ao lado do irmão Rafael e do amigo Jonas Fongosi, 19.
"Já ouvi de tudo de quem não tem convite e quer entrar de qualquer jeito. As pessoas querem estar onde acham que algo importante está acontecendo", diz Japa Girl, 30, uma das hostess.
Passado o primeiro funil, há uma peneira para cada desfile. No meio do empurra-empurra, uma porção de gente diz que é amigo de fulano, que perdeu o convite ou que é convidado de sicrano para furar a barreira de seguranças e de catracas de entrada para os desfiles. A maioria é desacreditada ou desmentida no ato.
"Ei, você tem convite sobrando?", pergunta à reportagem o estilista mineiro Maurício Isolani, 35, que veio a São Paulo para o evento. "Com jogo de cintura, cara-de-pau e sorte, consegui assistir a vários desfiles", comemora.

Imagem é tudo
Mas o que afinal leva essas pessoas a fazer de tudo para participar do grande circo da moda? "Primeiro, a idéia de glamour que quem não conhece o babado todo tem. Depois, eles têm ali a única oportunidade de entrar em contato com tudo aquilo que vêem nas revistas e na TV", especula a consultora de moda Costanza Pascolato. "Certa vez vi um garoto, que certamente não era do meio, imitando todo mundo. Arranjou um par de óculos escuros de camelô, com o qual ele não enxergava nada, conseguiu entrar nos desfiles e ainda pegar um lugar na primeira fileira. Era uma caricatura de todos nós", brinca ela, que tem lugar garantido na primeira fileira de todos os desfiles da temporada.
E o que garante um lugar na primeira fila, onde todos querem sentar? "É um lugar de status. Tem de ser uma celebridade, uma semi-celebridade ou uma pseudo-celebridade", ironiza Costanza. "Eu mesma tenho meus momentos Mickey Mouse, quando me param entre os desfiles para tirar fotos comigo", conta.

Carão
No espaço comum às áreas de desfile, no meio do frenesi de centenas de anônimos, se destaca quem faz mais pose ou quem veste o modelo mais excêntrico. E a disputa ali é acirrada.
Mas no quesito escândalo, na última sexta, ninguém batia o trio Vaneska, Rafael e Jonas, que conseguiu entrar na SPFW depois de três horas seguidas de tentativas. "Consegui entrar onde todo mundo quer estar. Entrar aqui parece que muda toda a vida da gente", exagera Jonas. "Quem fala que não liga para os famosos que estão aqui está mentindo. Você cruza com eles tantas vezes que eles viram seus conhecidos, tipo "olha o fulano ali". Só que eles nem sabem que a gente existe", diverte-se Vaneska.

Roteiro
A disputa por um lugar na SPFW se repete no roteiro de jantares e baladas que toma conta da cidade durante o evento.
Todas as noites, descolados se reuniam no restaurante Hotel Lycra. Curiosos circulavam pelo Hotel Unique, ávidos para topar com algumas das celebridades que ali estão hospedadas. Atores globais eram paparicados por estilistas na última quinta, no restaurante do Hotel Fasano. E socialites perdiam a finesse para atrair a atenção da modelo mais badalada da temporada: Elettra Rossellini, 20, filha de Isabella Rossellini e neta de Ingrid Bergman.
O pedigree da moça -que admite nunca ter visto todos os filmes da avó- a transformou na celebridade da vez, com a qual as demais celebridades querem estar, de alguma forma, associadas. "Quer dizer que as pessoas aqui sabem quem eu sou? Isso é tão estranho. Não me considero uma celebridade. E nunca recebi tanta atenção como aqui no Brasil", afirma Elettra, denunciando o provincianismo do mundo fashion. "Será que meus 15 minutos de fama estão acontecendo aqui e agora e eu nem me dei conta? Ai, meu Deus!"



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