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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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DNA

Criado em Escada (PE), onde 20% dos alunos não têm nome do pai nos registros, programa é financiado por meio de rifas e bazares

"Consórcio" garante exame de paternidade

FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM ESCADA (PE)

Um programa inspirado nos sistemas de consórcio foi implantado em uma cidade do interior de Pernambuco para custear exames de DNA destinados ao reconhecimento de paternidade em famílias de baixa renda.
Criado em 2001, em Escada, município de 57 mil habitantes localizado a 60 km de Recife, o projeto "DNA Já" já financiou 43 exames de paternidade.
Segundo a advogada, professora e idealizadora do programa, Maria Barbosa da Silva, esse número ainda é pequeno em relação à quantidade de crianças da cidade que não têm o nome do pai em suas certidões de nascimento.
Levantamento coordenado pela advogada nas escolas públicas do município revelou que 20% dos alunos matriculados só tinham o nome da mãe em seus registros.
"Foi uma surpresa", disse ela. "Resolvi fazer a pesquisa após observar que as crianças mais rebeldes não tinham o nome do pai nas fichas escolares", declarou.
O trabalho, afirmou, levou dois meses para ser concluído. Nele, Silva não buscou uma explicação para o problema. Entretanto, constatou que diferenças sociais e supostas relações extraconjugais não eram motivos predominantes para a ausência dos pais.
"Vi situações de todos os tipos, mas a causa principal seria as relações esporádicas e inconsequentes dos casais", afirmou. "Não pesquisei o assunto porque não me interessa a vida deles, só a cidadania dos seus filhos."
A pesquisa nas escolas levou a advogada a realizar um outro levantamento, no Fórum da cidade. Lá, ela encontrou processos de investigação de paternidade engavetados por até 18 anos.
Estudando os papéis, Silva constatou que as ações eram suspensas na fase de realização dos exames de comprovação. "Na maioria dos casos, os supostos pais alegavam falta de recursos para bancar o teste de DNA."
"Como as mães também não podiam pagar, os processos ficavam parados, sem solução", afirmou. "Foi então que surgiu a idéia de criarmos um sistema para custear os exames", declarou.
O sistema, autofinanciável, tem como base a solidariedade das mulheres que reivindicam a investigação de paternidade. Elas se organizam, arrecadam doações e promovem rifas, sorteios e bazares beneficentes na cidade.
O dinheiro obtido financia os testes, realizados no laboratório de genética molecular humana da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), em Recife, ao custo médio de R$ 600 cada um.
Se o resultado for positivo, o pai é obrigado a ressarcir quem custeou a perícia -no caso, a advogada e seu programa. O dinheiro devolvido financia um novo teste.
"Cobramos o que foi gasto, mas não colocamos a corda no pescoço de ninguém", disse ela. "Quem pode paga à vista. Quem não pode paga aos poucos."
Segundo Silva, a iniciativa tem produzido muitos acordos amigáveis. "Os supostos pais percebem que não há necessidade de gastos e desgaste e acabam aceitando reconhecer seus filhos sem a necessidade do exame."
Para o juiz de Escada, Cláudio Miranda Júnior, o programa implantado pela advogada teve "grande repercussão" nos processos de investigação de paternidade movidos na cidade.
"Não tenho estatísticas, mas é fato que a iniciativa aumentou a procura por ações do tipo", declarou. "Há uma credibilidade muito grande nos resultados dos exames", afirmou. A advogada diz que sua meta é "zerar" o número de crianças sem registro paterno na cidade.



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