São Paulo, terça-feira, 01 de junho de 2004

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HABITAÇÃO

Arquiteto indiano diz que situação é séria, mas acredita que governo tem recursos suficientes para resolver a questão

Relator da ONU compara Brasil a Índia

FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil não está tão longe da pobreza e das condições precárias de vida da Índia quanto se imagina. É o que afirma o relator especial da ONU (Organização das Nações Unidas) para as questões de direito à moradia, o arquiteto indiano Miloon Kothari, que comparou os problemas habitacionais dos dois países em seu segundo dia em São Paulo.
"Há muitas similaridades entre Brasil e Índia em termos de moradia. O nível de pobreza dos dois países é bastante parecido", disse.
Kothari esteve ontem na favela do Gato, em três prédios ocupados (um pelo Movimento de Moradia do Centro, dois pela Unificação das Lutas de Cortiço, a ULC) e em um terreno abandonado onde havia um hospital, demolido pelo Estado, antes ocupado por integrantes da ULC. Todos na região central.
O relator conversou com moradores e com líderes de movimentos sociais ligados à questão da moradia. "Essa visita pode acordar nossos governantes para a urgência de moradias no Brasil", acredita o líder sem-teto Luiz Gonzaga da Silva, 54, o Gegê.
Sua visita de inspeção, que ainda deve passar por Brasília, Rio de Janeiro, Fortaleza, Salvador, Recife e Alcântara (MA), será acompanhada pelo relator nacional pelo direito humano à moradia adequada, o advogado Nelson Saule Jr. Em um relatório prévio, Saule apontou haver déficit de moradia para 11,7% da população brasileira ou 20,2 milhões de pessoas.
Leia, a seguir, trechos de entrevista com o relator da ONU.
 

Folha - Como o sr. avalia a situação da moradia em São Paulo?
Miloon Kothari -
A situação aqui é bem séria. Houve uma negligência histórica que gerou as favelas, os cortiços etc. É importante que o governo dê prioridade total àqueles que vivem nas situações precárias que presenciei.

Folha - Qual é o propósito da inspeção da ONU?
Kothari -
Checar se o país está cumprindo suas obrigações em relação à moradia. Minha impressão é que o governo federal, pelo menos, está interessado no tema. Mas quero ver se seus projetos serão mesmo implementados.

Folha - Que tipo de ajuda o Brasil pode obter nessa área?
Kothari -
Não se trata de uma questão de recursos externos. O Brasil tem recursos suficientes para resolver a questão da moradia por si só. A pergunta é quando esses recursos serão redirecionados para essa questão. Enquanto a moradia no Brasil não melhorar, será uma violação do direito à habitação -um compromisso assumido pelo governo brasileiro em pactos internacionais.

Folha - Como mudar a situação?
Kothari -
Uma recomendação preliminar é que o governo responda às reivindicações dos movimentos populares.

Folha - A situação da moradia no Brasil é comparável à da Índia?
Kothari -
Sim. Há muitas similaridades entre Brasil e Índia. O nível de pobreza é bastante parecido. As condições que vi em São Paulo são tão ruins quanto as da Índia. Mas, como lá temos uma população muito maior, há mais gente nessa situação. Só que os movimentos sociais daqui são mais consistentes.

Folha - Como o governo deveria lidar com os movimentos que promovem ocupações?
Kothari -
Deveria haver uma política que reconhecesse que, devido à situação de violação de direitos que essas pessoas vivem, não há alternativa.


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