São Paulo, terça-feira, 01 de agosto de 2006

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MARIA INÊS DOLCI

Avestruz caro

Dinheiro (honesto) não dá em árvore. Resulta de anos de estudo, de altos e baixos na vida profissional

VOCÊ TEM experiência agrícola, já plantou ao menos um pé de couve na vida? Então, como se julga apto, em meio à montanha de concreto dos prédios e do asfalto das avenidas, a investir sua suada poupança mensal na criação de avestruzes?
Esse é somente um repto para comentar que a Justiça de Goiás decretou, na semana passada, a falência da Avestruz Master, maior criatório do Brasil, que tinha mais de 50 mil investidores.
Antes dessa empresa, também vivemos, há mais de dois anos, situação similar com as Fazendas Reunidas Boi Gordo. A única diferença foi a troca do animal utilizado para atrair investidores: saiu o boi gordo, entrou o avestruz.
Sempre há explicações de sobra dos proprietários desses, digamos, empreendimentos para justificar o não-pagamento a seus credores. Mas, com explicações razoáveis ou não, essas pessoas que acreditaram em uma nova forma de ganhar dinheiro, agregada ao desempenho fabuloso do Brasil no agronegócio, perderam um dinheiro que é cada vez mais difícil de ganhar nesse país do "Copom cauteloso" e das taxas de juros extravagantemente altas.
O objetivo de abordar esse tema não é, obviamente, criticar quem investiu em bois e avestruzes. Isso é um direito de cada um. Alertamos, contudo, o cidadão de classe média -os de baixa renda não têm o que investir; os ricos têm quem invista para eles- de que retorno de investimento muito acima da média não é comum.
Quanto maior o risco, maiores as taxas oferecidas. Porém, em muitos desses casos de investimentos, não há sequer risco. A perda é inevitável. Digamos que houvesse, realmente, interesse de remunerar o investimento em um avestruz. Mercados agropecuários são sujeitos a variações de preços, a problemas climáticos, a doenças inesperadas, a variações cambiais.
Isso não significa que todos devam ser conservadores em seus investimentos. De modo algum. Há investidores arrojados, que arriscam muito, em busca de um ganho elevado. Nesse caso, contudo, é importante que não seja investido tudo o que a pessoa tem, porque as chances de perder são muito elevadas.
Há um outro aspecto dessa questão: por que as autoridades não exigem dessas empresas, quando estão se instalando, um valor depositado em conta especial, equivalente a uma parcela dos investimentos que receberão?
Ou poderia ser exigido dessas empresas um seguro especial para cobrir eventuais perdas de investidores. Seria uma forma de minimizar os danos de empreendimentos que faliram por incúria ou má-fé.
Enquanto as autoridades não têm uma resposta adequada a essa necessidade, vamos ser mais cuidadosos com o nosso dinheiro. Tratá-lo como uma extensão de nossa dedicação ao trabalho e como uma antecipação de nossos sonhos.
Dinheiro (honesto) não dá em árvore. Resulta de muitos anos de estudo, de uma trajetória cheia de altos e baixos na vida profissional. De economias e privações. Por isso, não deixe bois gordos e avestruzes comerem seu dinheiro.


http://mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br

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