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SP quer apuração em museu, diz secretário
João Batista de Andrade, da Cultura, afirma que recomendações da Promotoria, que investiga caixa dois, serão cumpridas
Cineasta defende as
Organizações Sociais, que,
segundo ele, deram mais
agilidade à ação do Estado e
estão dentro da legalidade
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Cineasta convertido em secretário de Cultura do governo
paulista, João Batista de Andrade não vê irregularidades no
MIS (Museu da Imagem e do
Som) nem no MCB (Museu da
Casa Brasileira), mas afirma
não temer investigações: "Ao
governo interessa que a verdade seja apurada".
As acusações de que o MIS e
o MCB operavam com caixa
dois foram feitas por uma funcionária pública ao promotor
Sílvio Marques.
Em entrevista à Folha, Andrade, 66, refuta a crítica de
que as sociedade de amigos e as
Organizações Sociais (OSs) sejam uma "privatização envergonhada". OS é a figura jurídica
criada para administrar entidades culturais no Estado de São
Paulo, que tem como principal
vantagem a agilidade de empresa privada, seja para fazer
compras ou contratar pessoal.
"Não é privatização porque
você usa a OS para realizar uma
política cultural formulada na
secretaria", diz. Na última
quinta-feira, antes de ir ao Rio
para ver uma versão restaurada
do filme "O Homem que Virou
Suco", Andrade falou à Folha
acompanhado do advogado
Carlos Dêgelo, um executivo da
secretaria. Eis os principais
trechos da entrevista:
FOLHA - O Ministério Público diz
que o MIS e o Museu da Casa Brasileira e as respectivas sociedades de
amigos operam à margem da lei e
usam caixa dois. É verdade?
JOÃO BATISTA DE ANDRADE - É preciso colocar o verbo na forma
correta: o Ministério Público
disse que as associações operavam de forma ilegal. Isso não
acontece mais.
FOLHA - A Promotoria diz que as
sociedades alugavam esses museus
e depositavam os recursos numa
conta privada. Isso não seria ilegal?
ANDRADE - Não, o dinheiro tem
de ser depositado num fundo
da secretaria para poder ser
utilizado. O que o Ministério
Público diz é que nem tudo era
repassado [para o fundo]. Se há
irregularidades, o Ministério
Público vai investigar e ao governo interessa que a verdade
seja apurada. A secretaria abriu
um inquérito em janeiro deste
ano quando soube das denúncias. Mas a investigação do Ministério Público é tremendamente mais poderosa. Queremos que haja apuração, que vá
até o fim, que todas as recomendações feitas pelo Ministério Público sejam cumpridas.
FOLHA - O inquérito não foi concluído em nove meses?
ANDRADE - A pessoa que fez as
acusações foi chamada duas vezes para formalizar as denúncias e não apareceu.
CARLOS DÊGELO - A secretaria
não tem poder de polícia. Ela
pode fazer uma apuração preliminar, que deve começar com o
relato do denunciante. Nós estamos juntando elementos e
depois vamos mandar a apuração para a Procuradoria do Estado. Se houver indícios de irregularidade, a apuração vai para
a Comissão Processante Permanente, que é sempre presidida por um procurador do Estado. Este, sim, poderá enviar a
documentação ao Ministério
Público e, se for o caso, para
uma apuração criminal.
FOLHA - Há uma crítica que diz que
o governo fez uma "privatização envergonhada" na área cultural por
meio das sociedade de amigos e depois com as Organizações Sociais. O
que o sr. acha dessa avaliação?
ANDRADE - A sociedade pode, e
deve, discutir a Organização
Social. O que acontece é que a
OS virou lei e houve uma discussão dentro dos limites da
democracia. Isso significa que a
Organização Social está dentro
da legalidade. Não é privatização porque você usa a OS para
realizar uma política cultural
formulada na secretaria. Também não há privatização do patrimônio. Se há uma doação para a Pinacoteca, a doação fica
para o Estado. Se a OS for descredenciada, o patrimônio fica
para a Pinacoteca.
FOLHA - As OSs são submetidas ao
Tribunal de Contas?
DÊGELO - Elas têm um controle
de metas aqui na secretaria. A
análise aritmética e moral da
prestação de contas fica disponível para o Tribunal de Contas
e para a Assembléia Legislativa.
FOLHA - Quais são os pontos positivos e negativos das OSs?
ANDRADE - A OS agilizou bastante a ação do Estado nessas
instituições. Teve um museu de
Piracicaba que quebrou o telhado e eu passei vergonha porque durante dois meses eu não
conseguia liberar dinheiro para
consertá-lo. Eu queria agilizar,
mas a burocracia impedia. A OS
conserta isso no dia seguinte.
Outra vantagem é que a OS funciona como empresa: contrata,
distrata, demite rapidamente.
FOLHA - Não há nada de negativo
nas OSs?
ANDRADE - Negativo não, o que
eu descobri é que muitas OSs tinham uma falsa impressão de
que tinham se desligado da secretaria. Cada uma queria ter a
sua política cultural, quando
existe uma política cultural do
Estado. Decidi que quem não
seguisse essa política poderia
perder o repasse de verbas e ser
descredenciado. Não tive mais
problemas. A OS é um desafio
para qualquer secretário.
FOLHA - A Secretaria de Cultura
tem hoje 314 servidores, quando
precisaria, numa estimativa conservadora, de 1.500. Essa diferença, de
cerca de 1.200 funcionários, é contratada por OSs. Por que o Estado
não quer ter servidores próprios na
área cultural?
ANDRADE - É um problema nacional. Os Estados deixaram de
fazer concursos públicos, a
União deixou de fazer. No Estado de São Paulo, foi criado primeiro o Baneser, que pagava as
pessoas e foi extinto pelo governo Mário Covas, e depois a
figura do credenciado. O credenciado é a pessoa contratada
por um tempo determinado,
sem garantia nenhuma.
FOLHA - O sr. é a favor desse tipo de
política neoliberal?
ANDRADE - Eu não sou neoliberal. A questão aqui não é ser
neoliberal ou não-neoliberal. A
discussão aqui é discutir qual é
a melhor forma de gestão. Tem
um velho líder da minha formação ideológica, o Marx, que diz
o seguinte: a humanidade não
se coloca problemas que ela
não possa resolver. O que está
colocado para todo secretário
de Cultura desde o final do Baneser é uma questão só: não
tem concurso público e ele tem
que encontrar uma maneira de
fazer a gestão. A questão das
OSs não foi feita para poder resolver esse problema. Vou fazer
uma constatação: ou o modelo
de gestão do Estado brasileiro
se renova ou ele é inviável para
administrar os bens culturais.
A Organização Social surgiu como modelo novo de gestão. Não
é privatização da cultura, não é
Estado mínimo.
FOLHA - A secretaria tem 271 funcionários que não passaram por
concurso e já teve mais de 3.000.
Não dá para acabar com esse tipo de
ilegalidade?
ANDRADE - Não é ilegal. Desde
que foi feito o Termo de Ajuste
e Conduta com o Ministério
Público do Estado e do Trabalho, que venceu em dezembro
do ano passado, ele foi sempre
legal. A Justiça reconsiderou o
prazo. Em abril eu assinei o novo Termo de Ajuste e Conduta.
O que consta desse termo? Que
a gente resolveria o problema
desses quase 3.000 funcionários. Uma das formas de resolver eram as OSs. O que não dava para resolver com a OS, como o Arquivo do Estado, pelo
seu interesse estratégico, e o
Condephaat, vamos resolver
por meio de concurso público.
Atualmente, há 180 funcionários sem concurso.
DÊGELO - O último concurso
público que houve na secretaria foi em 1985. O secretário
conseguiu outro no início do
ano para 87 cargos.
ANDRADE - Para os outros funcionários, eu também propus
um projeto de lei criando 180
cargos. O que eu preciso é que a
Assembléia aprove a criação de
cargos porque como não tem
concurso há muito tempo, a secretaria perdeu cargos.
FOLHA - Por que a Osesp tem um
orçamento que é seis vezes maior do
que todos os museus da cidade de
São Paulo?
ANDRADE - Os orçamentos dos
museus não são pequenos.
Quando surgiu a crise do Masp,
todas as matérias diziam que os
museus do Estado de São paulo
não têm crise. O que acontece
com todo museu é que você repassa dinheiro suficiente para
ele tocar basicamente, e os projetos elaborados são feitos via
incentivo fiscal. Isso acontece
no Brasil inteiro. Com isso, os
museus estão muito bem. O
Museu da Casa Brasileira estava muitíssimo bem, o Museu da
Imagem e do Som estava se recuperando, a Pinacoteca, todo
mundo reconhece, está uma
maravilha. O Memorial do Imigrante, que estava praticamente abandonado, está em processo de crescimento, com reconhecimento internacional. O
Museu da Língua Portuguesa é
um sucesso tremendo. O caso
da Osesp é que, se você quer ter
uma orquestra sinfônica de padrão internacional, tem de trazer gente de fora, e isso é caro. É
uma opção governamental.
FOLHA - O sr. é a favor dessa
opção?
ANDRADE - Sou a favor de ter
um orquestra. É muito importante o país ter um nível de excelência na área da música.
Agora, como tudo, está aberta a
polêmica, sem problema. Todas as avaliações públicas da
Osesp são positivas. Em política cultural, você tem que saber
que investir R$ 500 mil num
programa de hip hop tem um
significado e investir R$ 40 milhões na Osesp tem outro.
FOLHA - Ao investir R$ 40 milhões
numa orquestra sinfônica, o governo não fez uma opção preferencial
pelos mais ricos?
ANDRADE - Não. Há um esforço
grande de popularizar a Osesp.
Eu mesmo exigi que voltasse o
programa de domingo, que é
gratuito. Faz parte do contrato
de gestão com a Fundação
Osesp que a orquestra tem de
fazer um plano de popularização. Em cultura, você não pode
dizer que "Ulisses", do Joyce,
foi lido por meia dúzia de pessoas e por isso não tem importância. Não é assim que se julga.
Você gasta R$ 40 milhões na
Osesp, mas você gasta mais R$
40 milhões no Projeto Guri, para ensinar criança de periferia a
ler partitura e tocar instrumento. Investi dinheiro num projeto novo, que se chama Projeto
Bem-Te-Vi, que é para ensinar
criança de periferia a fazer filme, desenho animado.
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