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SAÚDE
Cresce número de portadores do HIV namorando pessoas sem vírus; médicos acham tendência saudável, mas preocupante
Aids não impede romance com sem-vírus
AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local
Na primeira
vez, foi difícil
convencê-lo a
usar camisinha.
Na segunda, foi
outra batalha.
Na terceira, ela
criou coragem e
contou que tinha Aids. "Ele pegou na minha mão e ficou me
olhando, como se me admirasse
ainda mais. E assim começou uma
paixão que durou dois anos."
O relato é da pedagoga Nair Soares Brito, 38. O caso terminou há
um mês porque ela passou a gostar de outro.
Como Nair e o namorado, vem
crescendo rapidamente o número
de pessoas com HIV ou Aids que
estão namorando ou vivendo com
pessoas que não têm o vírus.
A tendência é saudável, mas os
médicos se preocupam com os
descuidos de casais que se apaixonam. Uma pesquisa qualitativa da
Secretaria Estadual da Saúde mostrou que algumas duplas deixam a
camisinha de lado acreditando
que o "amor protege".
A preocupação é tanta que o
Programa Estadual de Aids acaba
de produzir um vídeo tratando
dessas questões e de outros cuidados no relacionamento entre casais onde um deles tem o HIV.
"Uma das grandes dificuldades
para quem tem Aids é contar isso
ao novo namorado", afirma Julio
César Pacca, diretor de prevenção
do programa estadual. Situações
como essa tendem a se tornar mais
frequentes com o coquetel. Só em
São Paulo, a combinação de remédios diminuiu a mortalidade em
33% de 96 para 97. As internações
caíram 40% no mesmo período.
Na linguagem médica, os casais
onde um tem o HIV são chamados
de "pares divergentes".
"A tendência é que o namorado
se transforme primeiro em médico e enfermeiro, só depois em
amante", diz José Araujo, 40, que
tem Aids e que recentemente terminou um casamento homossexual de quase quatro anos. Por
trás da crise conjugal, não estava a
doença, mas a militância de Araujo, que pertence a uma ONG e à
Comissão Nacional de Aids.
"Em todos os barzinhos aparecia alguém para falar de Aids. Ele
não aguentou." No cotidiano, o
companheiro chegava a exagerar
nos cuidados, conta Araujo. "Ele
cuidava dos meus remédios, não
me deixava andar descalço, vigiava todas as minhas atitudes."
Da parte de Araujo, era o medo
de infectar o outro. "Quantas vezes deixei de ter prazer por desconfiar que não tinha colocado a
camisinha direito."
Medos à parte, Araujo acha a relação entre "pares discordantes"
muito rica. "É bom ter alguém
que leve os remédios na cama. E se
você não estiver se sentindo bem é
só um olhar e ele te enche de cuidados."
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