São Paulo, quinta-feira, 02 de janeiro de 2003

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EDUCAÇÃO

Para estudiosos da USP, da PUC e da Unicamp, progressão continuada paulista transformou-se em sistema excludente

Universidade rejeita modelo do PSDB em SP

BRUNO LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL

Estudos desenvolvidos por professores da USP, da Unicamp e da PUC-SP reprovam o sistema de progressão continuada implantado há cinco anos nas escolas estaduais paulistas. O Estado concentra o maior número de escolas (3,3 milhões de alunos) organizadas nesse modelo -adotado nos governos dos tucanos Mário Covas e Geraldo Alckmin.
Para os pesquisadores, o princípio da progressão, concebido para promover a inclusão escolar, foi distorcido, implementado de forma autoritária e se tornou um mecanismo sofisticado de excluir.
Professores, coordenadores e diretores de escolas dizem que a idéia é boa, mas que a prática ainda está distante do que deveria.
A progressão (ou sistema de ciclos) tem como princípio substituir a avaliação de uma série para a outra pelo acompanhamento regular do aluno até que ele atinja os objetivos de aprendizagem -sem passar pela experiência da reprovação, tida como negativa.
No sistema, a reprovação por defasagem de aprendizado só ocorre na 4ª e na 8ª séries -anos finais dos ciclos de ensino fundamental. Mas faltas levam à repetência em qualquer ano.
A principal crítica ao sistema implantado é a impossibilidade de oferecer o acompanhamento necessário para que, mesmo sem repetir de ano, o aluno aprenda.
Estudo da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) sobre as políticas públicas da Secretaria de Estado da Educação para enfrentar o fracasso escolar, feito pela educadora Norinês Bahia, aponta distorções que estariam mascarando situações de exclusão.
A pesquisadora acompanhou por três anos 52 alunos de uma escola estadual em Diadema (Grande SP) que passaram por classes de aceleração -voltadas para os que não atingem o rendimento esperado em séries nas quais não podem ser reprovados- e retornaram ao ensino regular.
A conclusão foi a de que os alunos não recebiam a orientação adequada e que professores despreparados e inexperientes assumiam as aulas de reforço, dadas em quantidade insuficiente. Ou seja: os alunos com dificuldades acabavam ainda mais excluídos.
"Os professores mais experientes escolhem primeiro e, em geral, não querem as aulas de reforço", explica Norinês. As aulas de reforço são frequentemente distribuídas entre profissionais eventuais e estagiários, segundo a pesquisa.
"Já ficou provado que o sistema tradicional, com reprovação, não funciona. A proposta de corrigir as defasagens do aluno durante o ano é interessante, mas não é o que acontece", afirma ela.

Imposição
A tese do educador José Cleber de Freitas, que pesquisou pela PUC-SP a implementação do sistema, afirma que os ciclos foram uma "imposição" e que não houve preparação nem discussão, só autoritarismo. "Os educadores ficaram de lado, recebendo tudo pelo "Diário Oficial", a partir de decisões de gabinetes", diz.
Para implementar uma política de ciclos, conclui o estudo, somente discurso pedagógico não adianta. "A secretaria [de Estado da Educação] diz que foram criadas condições, mas quem vivencia o cotidiano das escolas sabe que o que existe é só um ajuntamento de séries, uma negação de todo o processo de ciclos."
Na USP (Universidade de São Paulo), estudo da psicóloga Lygia de Sousa Viegas avaliou a motivação dos professores de uma escola estadual e concluiu que a forma de implantação do sistema "produziu um sentimento de oposição à progressão continuada".
Segundo a pesquisa, os professores, apesar desse sentimento, não discordam da necessidade de acabar com a exclusão escolar e acreditam nos princípios da progressão. "Não foi um "isso não", mas um "assim não"."
Pesquisa feita pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) com 160 alunos de uma escola estadual de Campinas avaliou o impacto da progressão sobre a motivação dos alunos e concluiu que 88% deles estudam mesmo sem o risco de repetir.
Os resultados, no entanto, não correspondem ao nível de motivação declarado. "Isso sugere que o sistema não sabe aproveitar o prazer que os alunos têm em estudar, revertendo-o em aprendizado", sustenta Edna Neves, responsável pelo estudo.


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