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Número de pacientes de ambulatório quase dobra
DA REPORTAGEM LOCAL
Em 1998, quando surgiu, o Ambulatório do Jogo Patológico
(Amjo) tratou 44 pessoas. No ano
passado, o número de novos
usuários saltou para 80.
A curva ascendente coincide
com outro "boom": o das casas de
bingo. A Lei Zico as instituiu em
julho de 1993. Dez meses depois
(maio de 1994), inaugurou-se a
primeira.
Em 1998, havia 150 no país. Em
2000, 980. Atualmente, já chegam
a 1.100. Boa parte, 430, se localiza
em São Paulo.
Pode-se associar o que ocorreu
no ambulatório da USP com a explosão das casas de apostas? Um
estudo realizado pela psiquiatra
Silvia Sabóia Martins dá pistas de
que sim.
Ela traçou o perfil de 156 pacientes que o Amjo atendeu entre janeiro de 1998 e janeiro de 2002.
Eram, na maioria, brancos e católicos. Completaram o segundo
grau e pertenciam à classe média.
A psiquiatra concluiu que
78,2% tinham o bingo como jogo
de preferência. O videopôquer
atraía apenas 8,3% dos compulsivos. Os caça-níqueis, outros 8,3%.
O bicho seduzia 3,2%. As cartas,
1,3%. E as corridas de cavalo,
0,6%.
Dos 44 pacientes de 1998, 63,6%
manifestavam problemas com
"as bolinhas e cartelas". Dos 71
novos frequentadores de 2001,
90% padeciam do mesmo mal.
Quer dizer: à medida que a quantidade de casas aumentou, cresceu a proporção de viciados em
bingo no ambulatório.
Embora trabalhasse com uma
amostra pequena, Silvia a considera eloquente. "É, no mínimo,
um sinal de que tais casas não devem permanecer sem controle."
O estudo também aponta de
que modo o vício se distribui entre os sexos. Em 1998, 29 homens
e 15 mulheres passaram pelo Amjo. Em 2001, a relação se inverteu:
38 mulheres para 33 homens.
De novo, o bingo parece ter influência no fenômeno. "O público
feminino o prefere", argumenta a
psiquiatra. "As casas do ramo revelam-se menos hostis à mulher
do que o jóquei, os botecos, os
clubes de carteado e outros locais
de jogo."
O levantamento demonstra,
ainda, que 48% dos 156 pacientes
analisados praticaram atos ilegais
para financiar apostas (furtos, falsificações, fraudes contábeis etc).
Uma fatia expressiva (14%) tentou o suicídio.
Versão eletrônica
No Ambulatório de Jogo Patológico da Unifesp, o quadro é similar. Pesquisa com 135 compulsivos que se trataram ali entre
1994 e 2001 indica que cerca de
90% frequentavam casas de bingo. Os demais apreciavam cavalos, cartas ou bicho.
No Jogadores Anônimos (JA), a
situação se repete. "Seguramente
90% dos nossos afiliados acusam
dependência de bingo", informa
Marcos, relações-públicas do grupo (ele usa pseudônimo).
A irmandade, de origem norte-americana, possuía aproximadamente cem membros no Brasil
em 1998. Agora soma 500.
"A proliferação dos bingos contribuiu muito para que expandíssemos", avalia o relações-públicas. O JA encontra-se hoje em 15
municípios: Porto Alegre, Novo
Hamburgo, Florianópolis, Curitiba, São Paulo, São Caetano do Sul,
Santos, Jacareí, Rio, Niterói, Vitória, Belo Horizonte, Juiz de Fora,
Divinópolis e São João Del Rey.
Marcos ressalta que o grosso
dos dependentes inicia-se no bingo tradicional (o "cantado") e depois o troca pela versão eletrônica
(o videobingo). "É quando de fato
desenvolvem a compulsão."
O psiquiatra Hermano Tavares,
do Amjo, explica o motivo: "Um
jogo revela-se tão mais viciante
quanto menor o intervalo entre a
aposta e o resultado".
Cada rodada do bingo tradicional dura, em média, cinco minutos. A de videobingo, algo como
dez segundos. Calcula-se que 100
mil máquinas do gênero operem
no país.
(AA)
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