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Repressão policial não é suficiente contra narcotráfico, diz especialista
ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL
A certeza de que não é possível
zerar o consumo no mundo produziu nos últimos anos uma nova
teoria sobre o combate às drogas,
um consenso entre especialistas
ouvidos pela Folha, de que é preciso investir em repressão policial
-atacando a oferta- e na redução do consumo -resgatando
usuários e evitando que outros sejam recrutados pelo tráfico.
Ao se falar em usuário de drogas, é preciso separar a pessoa que
consome droga eventualmente
do dependente químico -usuário frequente-, diz a farmacologista Solange Nappo, 51, pesquisadora do Cebrid/Unifesp (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas da Universidade Federal de São Paulo).
Pesquisas americanas mostram
que os usuários eventuais são a
maioria, mas não há estudo que
aponte qual desses consumidores
mais financia o tráfico de drogas.
O que se sabe, porém, é que "os
problemas relacionados às drogas, como o crime e as doenças,
estão concentrados em uma parcela pequena dos usuários, que
são os usuários regulares", diz o
economista Peter Reuter no livro
"Drogas", escrito pelo jornalista
Rodrigo Vergara, que recupera o
histórico do tratamento dado à
questão no mundo. Professor do
Departamento de Criminologia
da Universidade de Maryland
(EUA), Reuter é considerado um
dos maiores especialistas na área.
Na Holanda, por exemplo, 5.000
dos 25 mil dependentes (20%) são
responsáveis por metade dos crimes leves ocorridos no país. Na
Inglaterra, os usuários de heroína
e cocaína estão envolvidos em
32% das atividades criminais.
Não há pesquisa semelhante no
Brasil, mas a situação do crack em
São Paulo, estudada pelo Cebrid
desde o início dos anos 90, pode
ajudar a entender o problema: o
dependente, em geral homem e
jovem, consome em média de dez
a 15 pedras de crack por dia (gasta
R$ 100 a R$ 150 diariamente). Em
um mês, gastaria R$ 3.000, rendimento superior ao da maioria dos
trabalhadores brasileiros.
O resultado é que esse dependente acaba migrando para o roubo ou à prostituição.
Enquanto o crack predomina
entre as drogas mais consumidas
em São Paulo, a cocaína é o principal problema no Rio. Lá, aparentemente, os traficantes não
permitiram a entrada do crack.
Sem alarme
Por enquanto, os dados de consumo de drogas não são considerados alarmantes. A última pesquisa do Cebrid, de 2001, realizada com moradores de 12 a 65 anos
de 107 cidades do país com mais
de 200 mil habitantes, mostrou
que 19,4% da população pesquisada -cerca de 9 milhões- tinha utilizado pelo menos uma vez
algum tipo de droga que não seja
álcool ou tabaco. Em uma pesquisa semelhante realizada nos EUA,
essa porcentagem chegou a
38,9%; no Chile, atingiu 17,1%.
O estudo do Cebrid permitiu estimar em 1% os dependentes de
maconha, atrás do álcool, do tabaco e de remédios controlados,
como os calmantes. Não foi possível aferir o número de dependentes de crack e cocaína por causa
dos números muito baixos.
Para Nappo, uma das autoras
do estudo, o Brasil ainda permanece como corredor de escoamento da droga. Relatório da PF
estima que só 20% da cocaína que
passa pelo país é consumida aqui.
A notícia negativa do levantamento do Cebrid é a quantidade
de pessoas que acham fácil ter
acesso a entorpecentes. Dos entrevistados, 60,9% (equivalente a
28,6 milhões) afirmaram ser muito fácil obter maconha, 45,8% disseram o mesmo sobre a cocaína e
36,1%, idem para o crack.
Para o ex-secretário nacional
Antidrogas (99-2000) Wálter Fanganiello Maierovitch, "o país precisa ter políticas de redução de
ofertas, de demanda, de tratamento e de reinserção social".
Maierovitch é um crítico da estratégia americana, que defende a
erradicação da produção de drogas, mas que até hoje não conseguiu acabar com o problema
-apesar dos milhões injetados
na guerra ao narcotráfico. Ele defende a política de redução de danos aplicada em países da Europa,
como Suíça e Holanda, onde se
aplica a substituição de determinadas drogas e a liberação controlada de algumas substâncias, além
da descriminalização do porte.
Em setembro de 2002, a Senad
(Secretaria Nacional Antidrogas)
apresentou a Teoria do Leque, em
uma conferência nos EUA, como
estratégia contra as drogas no
país. O plano prevê ações em duas
frentes: repressão contra o tráfico
e esforços contra o consumo,
sem, contudo, detalhar tais ações.
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