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SAÚDE
Regina Benevides, do ministério, afirma que usuário de drogas deve ser visto de maneira dissociada da violência do tráfico
Para técnica, foco deve ser o tratamento
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dizendo que é preciso "ousar e
não marcar posições antigas", Regina Benevides, da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, defende que o usuário de drogas seja
visto de maneira dissociada da
violência provocada pelo tráfico.
Para ela, "ninguém é ingênuo"
de não considerar a relação entre
tráfico e crime, mas o usuário deve ser visto sob a ótica da saúde.
Para Denise Doneda, da coordenação nacional de DST/Aids,
no debate sobre a descriminalização é preciso ouvir o usuário.
Folha - Como foi a participação
do Brasil na reunião da Comissão
de Narcóticos da ONU?
Regina Benevides - Ter participado do encontro neste momento, em que o governo brasileiro
volta a discutir o assunto, foi importante. Antes, era a Senad [Secretaria Nacional Antidrogas"
que participava. Inclusive, eles
tratam a política como antidrogas, termo que evitamos. A posição da Saúde é de prevenção, tratamento e reabilitação.
Folha - Que pontos a Saúde incluiu na discussão?
Benevides - Conseguimos introduzir na prevenção e tratamento a
estratégia da redução de danos.
Essa estratégia é importante porque não temos como objetivo no
trabalho com os usuários a abstinência. Ela pode ser um dos objetivos. A meta é garantir melhores
condições de vida e ampliar a capacidade de o usuário definir de
forma autônoma seu caminho.
Denise Doneda - Fomos convidados a apresentar na ONU a experiência brasileira no campo da
redução de danos. Discutimos o
tratamento da dependência química apregoando o acolhimento,
a não-criminalização do usuário.
Folha - E a receptividade?
Doneda - Foi excelente, principalmente de países da Europa que
trabalham com a redução de danos. Em parceria com esses países, fizemos frente a posições que
não conseguiram incorporar as
novas estratégias ou não valorizam a relação entre o uso de drogas injetáveis e HIV/Aids.
Folha - Podem citar exemplos?
Benevides - Nessa posição mais
conservadora estão EUA e Japão.
Participamos da defesa de uma
resolução que foi aprovada. A Bélgica e a Holanda queriam validar
o procedimento de troca de seringas, distribuição de equipamentos higienizados e preservativos
para usuários de drogas. Japão e
EUA foram contra.
Folha - O Brasil, por ter a posição
da Senad elogiada pelo governo
norte-americano, não costuma se
chocar nessa área com os EUA. Como foi?
Benevides - Houve uma discussão sobre tratamento em que os
EUA faziam a proposta, que tinha
a ver com substituição de uso de
drogas. Conseguimos incluir os
trabalhos de base comunitária,
que são realizados no Brasil.
Folha - Com o agravamento da
violência, a sociedade pede pena
maior e recrudescimento no combate à droga. Como explicar que o
usuário não tem relação com a criminalidade do tráfico?
Benevides - A primeira coisa
que deve ficar clara: a droga é um
problema de saúde pública. Não
estamos descartando relações
com o crime. Ninguém é tão ingênuo de achar que a droga está desvinculada de um certo modo como a sociedade internacional hoje
está organizada. Mas precisamos
separar o joio do trigo.
Folha - Como será feito o esclarecimento sobre o debate?
Doneda - O debate colocado se
contrapõe à visão de vincular o
usuário com o crime. Não é o
usuário, aquele que compra a
droga, o criminoso. É o traficante.
Folha - O general Paulo Uchôa
[Senad" diz ser precipitado descriminalizar o usuário e que a sociedade não está pronta.
Benevides - Isso ainda está em
discussão. Ninguém é ingênuo de
dizer: "A partir de agora, como
num clique, vamos descriminalizar". Dizer que é precipitado é
achar que a partir de hoje tomaremos essa decisão.
(LC e ID)
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