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São Paulo, sexta-feira, 02 de maio de 2003

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SAÚDE

Regina Benevides, do ministério, afirma que usuário de drogas deve ser visto de maneira dissociada da violência do tráfico

Para técnica, foco deve ser o tratamento

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Dizendo que é preciso "ousar e não marcar posições antigas", Regina Benevides, da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, defende que o usuário de drogas seja visto de maneira dissociada da violência provocada pelo tráfico.
Para ela, "ninguém é ingênuo" de não considerar a relação entre tráfico e crime, mas o usuário deve ser visto sob a ótica da saúde.
Para Denise Doneda, da coordenação nacional de DST/Aids, no debate sobre a descriminalização é preciso ouvir o usuário.

Folha - Como foi a participação do Brasil na reunião da Comissão de Narcóticos da ONU?
Regina Benevides
- Ter participado do encontro neste momento, em que o governo brasileiro volta a discutir o assunto, foi importante. Antes, era a Senad [Secretaria Nacional Antidrogas" que participava. Inclusive, eles tratam a política como antidrogas, termo que evitamos. A posição da Saúde é de prevenção, tratamento e reabilitação.

Folha - Que pontos a Saúde incluiu na discussão?
Benevides
- Conseguimos introduzir na prevenção e tratamento a estratégia da redução de danos. Essa estratégia é importante porque não temos como objetivo no trabalho com os usuários a abstinência. Ela pode ser um dos objetivos. A meta é garantir melhores condições de vida e ampliar a capacidade de o usuário definir de forma autônoma seu caminho.

Denise Doneda - Fomos convidados a apresentar na ONU a experiência brasileira no campo da redução de danos. Discutimos o tratamento da dependência química apregoando o acolhimento, a não-criminalização do usuário.

Folha - E a receptividade?
Doneda
- Foi excelente, principalmente de países da Europa que trabalham com a redução de danos. Em parceria com esses países, fizemos frente a posições que não conseguiram incorporar as novas estratégias ou não valorizam a relação entre o uso de drogas injetáveis e HIV/Aids.

Folha - Podem citar exemplos?
Benevides
- Nessa posição mais conservadora estão EUA e Japão. Participamos da defesa de uma resolução que foi aprovada. A Bélgica e a Holanda queriam validar o procedimento de troca de seringas, distribuição de equipamentos higienizados e preservativos para usuários de drogas. Japão e EUA foram contra.

Folha - O Brasil, por ter a posição da Senad elogiada pelo governo norte-americano, não costuma se chocar nessa área com os EUA. Como foi?
Benevides
- Houve uma discussão sobre tratamento em que os EUA faziam a proposta, que tinha a ver com substituição de uso de drogas. Conseguimos incluir os trabalhos de base comunitária, que são realizados no Brasil.

Folha - Com o agravamento da violência, a sociedade pede pena maior e recrudescimento no combate à droga. Como explicar que o usuário não tem relação com a criminalidade do tráfico?
Benevides
- A primeira coisa que deve ficar clara: a droga é um problema de saúde pública. Não estamos descartando relações com o crime. Ninguém é tão ingênuo de achar que a droga está desvinculada de um certo modo como a sociedade internacional hoje está organizada. Mas precisamos separar o joio do trigo.

Folha - Como será feito o esclarecimento sobre o debate?
Doneda
- O debate colocado se contrapõe à visão de vincular o usuário com o crime. Não é o usuário, aquele que compra a droga, o criminoso. É o traficante.

Folha - O general Paulo Uchôa [Senad" diz ser precipitado descriminalizar o usuário e que a sociedade não está pronta.
Benevides
- Isso ainda está em discussão. Ninguém é ingênuo de dizer: "A partir de agora, como num clique, vamos descriminalizar". Dizer que é precipitado é achar que a partir de hoje tomaremos essa decisão. (LC e ID)


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