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Fernandinho Beira-Mar quer estudar gestão financeira
Traficante pediu para fazer curso superior a distância à Justiça Federal do MS
No ano passado, pedido semelhante foi negado sob a alegação de que acesso a internet poderia possibilitar a realização de crimes
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um traficante condenado a
120 anos de prisão tem o direito
de fazer faculdade? E se o curso
for de gestão financeira? E se o
traficante for o mais lendário
da história recente do país?
A Justiça Federal do Mato
Grosso do Sul terá de responder a essas duas perguntas.
Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, quer fazer o curso de gestão financeira
à distância da Universidade Católica Dom Bosco.
Beira-Mar está no presídio
federal de segurança máxima
de Campo Grande. Seu advogado, Luiz Gustavo Battaglin Maciel, pediu ao juiz responsável
por essa penitenciária que ele
possa ter acesso à internet por
três horas por semana. O curso
tem duração de dois anos.
O traficante concluiu no ano
passado o ensino médio. Fez
uma espécie de supletivo dentro da prisão. Foi um bom aluno, segundo o exame: com exceção de redação, suas notas estão sempre acima da média. É a
segunda tentativa de Beira-Mar de fazer um curso superior. No ano passado, o juiz federal Odilon de Oliveira negou
um pedido, sob alegação de que
ele poderia praticar crimes se
tivesse acesso à internet.
"Existem maneiras muito
simples de limitar o acesso do
computador ao site da universidade", diz o advogado. Maciel
juntou ao pedido o laudo de um
especialista em ciência da computação em que ele diz que esse
procedimento de acesso a um
único site é banal do ponto de
vista tecnológico.
A última condenação de Beira-Mar, a 29 anos de prisão, foi
por crimes que praticou dentro
da prisão. Na investigação, a
Polícia Federal descobriu que
ele tinha postos de gasolina, lan
house e uma distribuidora de
gás em Duque de Caxias (RJ),
usados para lavar dinheiro.
Da prisão, Beira-Mar montou um centro de distribuição
de cocaína no Paraguai. Usava
aviões que voavam em alturas
que dificilmente podiam ser
captadas pelos radares para
trazer droga para o Brasil.
Nada disso é impeditivo para
Beira-Mar estudar, segundo
Geder Luiz Rocha Gomes, presidente do Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária. O direito à educação e à
formação profissional está previsto na lei de execuções penais, de 1984. "O Estado tem de
garantir a educação ao preso,
desde que ele não use uma ferramenta que dê acesso ao crime", afirma Rocha Gomes.
A educação, segundo ele, é a
principal maneira de reduzir a
volta ao crime. Dados do conselho apontam 70% dos presos
voltam ao crime após a prisão.
"Em tese, não há razões para
negar esse direito ao preso.
Também falando em tese, a negativa é ilegal", diz o juiz federal
Erivaldo Ribeiro dos Santos, do
Conselho da Justiça Federal.
Ele auxiliou o ministro Gilmar
Mendes, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, a implantar uma política de recuperação de presos no Conselho
Nacional de Justiça.
Se a Justiça conceder a Beira-Mar o direito de estudar, há um
problema prático para que a
decisão seja cumprida. Nenhum dos cinco presídios federais no país permite que os presos usem a internet -o acesso é
restrito aos funcionários da administração. Cerca de 700 presos estão nessas instituições.
Ribeiro dos Santos diz que isso faz parte da política de segurança rígida implantada nos
presídios de segurança máxima. Os presos não podem ver
nem televisão.
A violação do direito à educação não é exclusiva dos presídios federais, segundo o presidente do conselho de política
penitenciária. Entre os 476 mil
presos do país, 89% não têm o
ensino fundamental completo
(da 1ª à 9ª série), como exige a
lei, de acordo com ele.
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