São Paulo, domingo, 02 de maio de 2010

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Fernandinho Beira-Mar quer estudar gestão financeira

Traficante pediu para fazer curso superior a distância à Justiça Federal do MS

No ano passado, pedido semelhante foi negado sob a alegação de que acesso a internet poderia possibilitar a realização de crimes


MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um traficante condenado a 120 anos de prisão tem o direito de fazer faculdade? E se o curso for de gestão financeira? E se o traficante for o mais lendário da história recente do país?
A Justiça Federal do Mato Grosso do Sul terá de responder a essas duas perguntas. Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, quer fazer o curso de gestão financeira à distância da Universidade Católica Dom Bosco.
Beira-Mar está no presídio federal de segurança máxima de Campo Grande. Seu advogado, Luiz Gustavo Battaglin Maciel, pediu ao juiz responsável por essa penitenciária que ele possa ter acesso à internet por três horas por semana. O curso tem duração de dois anos.
O traficante concluiu no ano passado o ensino médio. Fez uma espécie de supletivo dentro da prisão. Foi um bom aluno, segundo o exame: com exceção de redação, suas notas estão sempre acima da média. É a segunda tentativa de Beira-Mar de fazer um curso superior. No ano passado, o juiz federal Odilon de Oliveira negou um pedido, sob alegação de que ele poderia praticar crimes se tivesse acesso à internet.
"Existem maneiras muito simples de limitar o acesso do computador ao site da universidade", diz o advogado. Maciel juntou ao pedido o laudo de um especialista em ciência da computação em que ele diz que esse procedimento de acesso a um único site é banal do ponto de vista tecnológico.
A última condenação de Beira-Mar, a 29 anos de prisão, foi por crimes que praticou dentro da prisão. Na investigação, a Polícia Federal descobriu que ele tinha postos de gasolina, lan house e uma distribuidora de gás em Duque de Caxias (RJ), usados para lavar dinheiro.
Da prisão, Beira-Mar montou um centro de distribuição de cocaína no Paraguai. Usava aviões que voavam em alturas que dificilmente podiam ser captadas pelos radares para trazer droga para o Brasil.
Nada disso é impeditivo para Beira-Mar estudar, segundo Geder Luiz Rocha Gomes, presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. O direito à educação e à formação profissional está previsto na lei de execuções penais, de 1984. "O Estado tem de garantir a educação ao preso, desde que ele não use uma ferramenta que dê acesso ao crime", afirma Rocha Gomes.
A educação, segundo ele, é a principal maneira de reduzir a volta ao crime. Dados do conselho apontam 70% dos presos voltam ao crime após a prisão.
"Em tese, não há razões para negar esse direito ao preso. Também falando em tese, a negativa é ilegal", diz o juiz federal Erivaldo Ribeiro dos Santos, do Conselho da Justiça Federal. Ele auxiliou o ministro Gilmar Mendes, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, a implantar uma política de recuperação de presos no Conselho Nacional de Justiça.
Se a Justiça conceder a Beira-Mar o direito de estudar, há um problema prático para que a decisão seja cumprida. Nenhum dos cinco presídios federais no país permite que os presos usem a internet -o acesso é restrito aos funcionários da administração. Cerca de 700 presos estão nessas instituições.
Ribeiro dos Santos diz que isso faz parte da política de segurança rígida implantada nos presídios de segurança máxima. Os presos não podem ver nem televisão.
A violação do direito à educação não é exclusiva dos presídios federais, segundo o presidente do conselho de política penitenciária. Entre os 476 mil presos do país, 89% não têm o ensino fundamental completo (da 1ª à 9ª série), como exige a lei, de acordo com ele.


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