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Superbactéria reduz eficácia de antibióticos
Estudo inédito da Anvisa aponta que medicamentos estão perdendo o efeito devido ao uso excessivo nas UTIs do país
Remédio para tratar infecções urinárias não funcionou em 70% dos casos analisados; agência
realizará monitoramento
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Alguns dos antibióticos mais
usados nas UTIs brasileiras estão perdendo o efeito em razão
da resistência bacteriana. É o
que aponta um estudo inédito
da Anvisa (Agência Nacional de
Vigilância Sanitária) que avaliou o perfil de sensibilidade
desses medicamentos.
A gentamicina, um dos remédios mais usados para combater problemas gastrointestinais
não fez efeito em 59% dos casos
analisados. No tratamento da
pneumonia, a situação foi parecida: a oxacilina não funcionou
em 62% dos casos.
A resistência bacteriana também ficou clara em casos de infecção urinária: em 70% deles,
a ceftriaxona, um dos remédios
mais indicados, foi ineficaz.
Para os médicos, a resistência é resultado do uso excessivo
de antibióticos, que faz com
que as bactérias criem barreiras contra eles. Esses microorganismos têm a habilidade de
mudar a membrana celular para impedir a entrada do antibiótico ou alterar a sua própria
composição química para que o
antibiótico não as mate.
"Bactérias resistentes prolongam a internação em 50%
do tempo e aumentam os custos em 70%", diz Renato Grinbaum, chefe da Comissão de
Controle de Infecção Hospitalar do Hospital do Servidor Público Estadual. "Medicamentos
que há dez anos só tinham resistência em 1% dos casos hoje
não funcionam em 60%."
O estudo da Anvisa, feito entre julho de 2006 e fevereiro
deste ano em 64 hospitais -na
grande maioria públicos-, é o
primeiro trabalho de uma rede
em implantação e que pretende
monitorar, continuamente, a
resistência microbiana.
No futuro, segundo a Anvisa,
a idéia é que esses dados orientem os médicos sobre o uso
mais adequado dos antibióticos
nas mais diversas situações.
"Boa parte dos médicos trabalha empiricamente e sofre
influência muito grande da indústria farmacêutica. Eles têm
uma tendência para querer
prescrever o antibiótico mais
caro, o lançamento mais recente, que, nem sempre, é o mais
eficaz", afirma o diretor da Anvisa, Cláudio Maierovitch.
Por exemplo, no estudo, observou-se uma baixa freqüência do uso da ampicilina -só
47%- no tratamento do
Staphylococcus aureus, responsável pelas infecções hospitalares. Mas ela teve uma eficácia
de 94% nos casos analisados.
"É um dos antibióticos mais
antigos que a gente conhece,
extremamente útil e um dos
mais baratos. Os médicos, muitas vezes, partem do princípio
de que a bactéria que vão tratar
é resistente à ampicilina, então
eles nem a usam", afirma.
A agência também vai monitorar o consumo de cada antibiótico no Brasil. "Queremos
acompanhar, ao mesmo tempo, os perfis de resistência e de
consumo para ver se existe
coerência entre as duas coisas."
Para ele, essa coerência não
existe. Além da interferência
da indústria farmacêutica, ele
cita a dificuldade de apoio laboratorial confiável, que dê a
identificação correta da bactéria envolvida na infecção.
Uso empírico
Segundo o infectologista Alexandre Rodrigues Marra, dos
hospitais Albert Einstein e São
Paulo (ligado à Unifesp), é comum o médico administrar um
antibiótico de amplo espectro
(capaz de tratar a maioria das
bactérias), enquanto esperam o
resultado dos exames que vão
mostrar exatamente o tipo de
bactéria envolvida na infecção.
"Se não der antibiótico ao paciente com infecção, ele morre.
Se a gente acerta com o antibiótico [de amplo espectro], as
chances de óbito são menores."
"Às vezes, o médico, com medo, acaba deixando os dois", explica Marra. "O uso empírico
dos antibióticos nas UTIs, na
tentativa de diminuir a mortalidade, tem um preço. As bactérias ficaram resistentes."
Remédio inócuo
Após contrair escarlatina e
salmonela e com a imunidade
fragilizada por antibióticos que
não eram suficientes para curá-la, Beatriz, 2, filha de Renato e
Andréia de Camargo, pegou
pneumonia. A inflamação dos
pulmões se espalhou pelo resto
do corpo, e ela ficou 28 dias na
UTI. "Demorou para ela melhorar de verdade", diz a mãe.
Hoje, mesmo saudável, Beatriz
ainda é assistida por médicos.
Para o infectologista Alfio
Rossi Junior, do Instituto de
Pediatria do Hospital das Clínicas (SP), que atende Beatriz, a
resistência das bactérias é causada, em grande parte, por culpa dos "médicos que receitam
muitos antibióticos".
Colaborou DANIEL BERGAMASCO , da Reportagem Local
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