São Paulo, quinta-feira, 02 de novembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Operação-padrão foi articulada informalmente por militares

DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A redução da atividade dos controladores de tráfego aéreo em Brasília não foi articulada de maneira sindical. Não houve assembléia nem reunião, mas somente uma iniciativa informal de um pequenos grupos, que ganhou a adesão dos demais num movimento boca-a-boca, segundo um profissional que trabalha no Cindacta-1.
José Ulisses Fontenele Figueira, ex-presidente e fundador da associação brasileira dos controladores, diz que a situação foi agravada pelo pedido de licença médica, por estresse, de dez profissionais nos últimos dias -que se somaram aos oito que já afastados devido ao acidente com o vôo 1907 da Gol. Em Brasília, são 236 profissionais atuando no controle de tráfego, entre civis e militares.
Dois operadores de Brasília disseram à Folha que sempre houve supervisores que aceitavam e outros que não toleravam ultrapassar os limites definidos pelos manuais. Nos últimos dez dias, ao sentir que os resistentes ganhavam força, a adesão aumentou, causando um efeito cascata.
A Folha apurou que, numa reunião tensa em Brasília na semana passada, um brigadeiro ameaçou prender quem oferecesse resistência. Disse, na frente dos controladores, que a situação só seria resolvida quando fizesse a detenção de "meia dúzia" por motim.
Figueira foi um dos convocados para a reunião com outros oficiais da reserva, em Brasília, convidados a voltar a operar em razão da crise. Ele disse que a adesão foi pequena.

Motivo
Uma medida tomada na semana passada pela Aeronáutica, a reboque da queda do Boeing, levou os controladores de Brasília a retardar a chegada ou saída de vôos, com atrasos em todos os aeroportos do país: dobrar a área monitorada por alguns operadores do radar.
Com a ausência de 18 controladores, o Cindacta-1 cancelou alguns "setores" -áreas do espaço aéreo acompanhadas por pessoal em terra. Esses perímetros foram, então, incorporados a outros. Cada setor é fiscalizado por um controlador.
O problema é que a legislação estabelece um número máximo de vôos controlados por instante. Se os aviões na tela ultrapassarem 14, dá-se início ao controle de fluxo, que significa retardar outras aeronaves, em solo ou em deslocamento.
Com a fusão de setores, um controlador que acompanhava 14 vôos poderia vigiar 28 no instante seguinte. Para evitar este problema, que afeta a segurança, foi determinado o atraso nas decolagens.
Conforme Jorge Oliveira, presidente da associação de controladores do Rio, o setor vive um déficit que gira de 400 a 500 profissionais nos últimos 20 anos, período no qual não houve concursos para reposição de vagas. Dos controladores no país, 2.212 são militares e 571 civis, diz a Aeronáutica.

"Pois é"
O presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Proteção ao Vôo, Jorge Botelho, avaliou ontem que a subordinação dos controladores à Aeronáutica engessa a solução dos problemas. Disse ele que o comando foi informado repetidas vezes sobre os problemas estruturais da carreira e da necessidade de ampliação do número de funcionários.
Mas, a julgar pela resposta do ministro da Defesa, Waldir Pires, as queixas não foram repassadas para cima. Depois de dizer que não sabia dos problemas e indagado sobre quais outros os comandantes não o informam, Pires foi lacônico: "Pois é. Essa é a verdade."


Texto Anterior: Segurança de vôo recebeu só 54% da verba prevista
Próximo Texto: Na Suíça, caso parecido levou a restrições
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.