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DANUZA LEÃO
30 anos depois
Por alguns momentos ela teve a ilusão de que, se o visse, ia se sentir como na época em que se amaram
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OUTRO DIA uma amiga me telefonou; estava indo para a Itália, e com a firme intenção de
procurar um ex-namorado com
quem teve um rápido e intenso caso
amoroso, 30 anos atrás. E começamos logo a imaginar como seria esse
encontro. Ele se lembraria dela? Afinal, 30 anos depois tudo pode acontecer, inclusive ter esquecido dela. Mas digamos que ele se lembrasse, e
aí marcassem para tomar um café.
Como seria esse encontro?
É claro que ela tem suas expectativas, o que é mais do que natural. Mulheres, mesmo 30 anos depois, podem estar em boa forma física -e ela
estava. Como são vaidosas, pintam
os cabelos, dão uma puxadinha na
cara, fazem ginástica, ela não precisava ter nenhuma preocupação de
ser uma decepção, quando ele a visse. Mas e ele?
Com os homens, em 30 anos tudo
pode acontecer. Dependendo de como a vida o tratou, poderia estar
com os cabelos brancos, talvez tivesse deixado crescer uma barba, e até
com uma barriga, o que seria dramático. E sobre o que conversariam?
Sobre o que aconteceu nas suas vidas durante esse tempo, é claro;
quantas vezes cada um deles se casou, quantos filhos tiveram, talvez
mostrassem fotos dos netos. Mas do
passado comum, dificilmente. Como falar de sentimentos que existiram num tempo remoto e que não
existem mais, como lembrar do
quanto se amaram, dos planos que
chegaram a fazer, e nada aconteceu?
Difíceis, esses encontros. Alegres
não são; também não chegam a ser
tristes e trágicos; não dá para ficar
amigo, nem para a paixão voltar.
Continuamos falando, e até a pensar na roupa que ela usaria; de tanto
falar, ela acabou descobrindo que o
que esperava é que ele dissesse que
nunca a esqueceu, que foi a mulher
da vida dele: mulher adora um romance. Mas será que é isso mesmo
que ela quer? Não, no fundo não é.
Ponderamos que dificilmente isso
aconteceria; ia ser uma conversa
meio banal, meio torta, no final se
despediriam sem alegria nem tristeza, pois ele tinha que voltar para casa, onde a mulher o esperava. E ela acabou percebendo que queria mesmo era que o tempo voltasse, que ela
fosse a mulher que foi, ele o homem
que foi, e que pudessem sentir um
pelo outro o que haviam sentido 30
anos atrás. Por alguns momentos ela
teve a ilusão de que, se o visse, ia se
sentir como na época em que se
amaram; só que o tempo é cruel, e isso não aconteceria.
Quando nossa conversa terminou,
ela já havia decidido não procurá-lo;
o que passou passou, e muito melhor seria deixar o passado para trás,
quieto, porque com o passado não se
deve brincar. E pensar no futuro, ou
melhor ainda, nem pensar; apenas
deixar que ele aconteça.
Um pequeno comentário, ainda que
tardio, sobre o episódio entre o rei
Juan Carlos e Hugo Chávez.
Chávez é um homem rude, de
pouca educação. Já Juan Carlos é
um rei de verdade. No entanto, foi
do nobre espanhol a frase "Por qué
no te callas", que pode ser traduzida
por um "cala a boca". Se não gostou
do que ouviu, o rei deveria ter se retirado. "Cala a boca" é coisa que se ouve em botequins, dito por pessoas grosseiras discutindo futebol; quem
diz essa grosseria normalmente recebe como resposta um "e quem é
você para me mandar calar a boca", e
daí para partirem para a briga é um
passo. Aliás, me surpreende que
Chávez tenha ouvido o "por qué no
te callas" e ter se calado.
Talvez, por ter sido a Venezuela
colônia da Espanha, tenha ficado
um respeito do colonizado por seu
colonizador e Chávez, tão valente e
tão briguento, tenha baixado a crista
por se sentir inferior e achado que o
rei tinha todo o direito de mandá-lo
calar a boca. Só que não tinha, e o rei
se mostrou um homem muito mal
educado. Já imaginaram se fosse o
contrário?
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